Capítulo Único

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Era uma noite fria de fim junho e Severo Snape se encontrava na Mansão Malfoy. Uma festa organizada entre os Comensais da Morte para comemorar o assassinato de Alvo Dumbledore. Assassinato este que ainda sangrava nas mãos de Snape, ainda doía em sua alma quebrada. Há cerca de um ano, quando Dumbledore pôs aquele maldito anel e sentenciou a si mesmo a um destino fúnebre, Snape não quis acreditar quando o diretor de Hogwarts pediu para que o matasse no tempo certo.

- Se você não se importa de morrer - ele disse furioso. -, por que não deixa que Draco o mate?

- A alma do garoto ainda não está totalmente comprometida, Severo. - o velho argumentou. - E eu jamais poderia permitir que uma criança se perdesse por minha causa.

- E quanto a minha alma, Alvo?

Dumbledore não fora a primeira pessoa que matou ou deixou morrer. Em seus anos como espião, havia matado muitos pelos dois lados. Matado pelo bem maior para limpar o mundo da imundice de fascistas; matado para enganar o Lorde das Trevas de sua lealdade. Snape não acreditava que ainda tivesse alma, embora tivesse argumentado com Dumbledore, de acordo com o que se lembrava. No dia do episódio na Torre de Astronomia, foi a primeira vez em muito tempo que o espião verdadeiramente sentiu medo. Ele só queria esquecer aquilo. Queria esquecer a voz fragilizada de Dumbledore pedindo "por favor", esquecer da Maldição Imperdoável proferida pelos seus próprios lábios, esquecer do corpo idoso do homem que o acolheu cair para o nada. Todavia, o Lorde das Trevas teve a excepcional ideia, Severo pensou com sarcasmo, em dar uma festa em comemoração à morte do grande Alvo Dumbledore. Uma festa em comemoração ao seu assassino: ele mesmo.

Sentado em uma poltrona afastada, tentando fugir - embora fosse quase em vão - das congratulações dos "amigos" comensais, Severo Snape bebericava com descompromisso uma taça de vinho branco. Os olhos afiados, donos de íris negras, analisando a extensão do salão. Bellatrix conversava com Avery, no entanto, não tirava os olhos obscenos de Voldemort que estava sentado em seu trono. Rodolfo e Rabastan jogavam xadrez, Goyle tentava investir em uma bruxa esbelta que ria do homem. Seus olhos repousaram nos Malfoy.

Draco se tornara um jovem apático e assustado. Snape não podia evitar sentir uma pequena identificação com o garoto. Seu pai, Lúcio, recém-saído de Azkaban, cochichava algo no ouvido do filho que ouvia sem expressão. O homem muito loiro prendeu os olhos cinzas nos negros de Snape e o encarou com ódio palpável. Lúcio Malfoy sentia inveja de Snape, o braço direito do Lorde das Trevas. O ex-professor de Poções não teria nenhum problema em entregar seu fardo a Lúcio, se era isso que ele desejava. Já vinha aguentando o peso do mundo há tempo demais.

Foi só quando Malfoy largou o olhar de Snape que ele percebeu Narcisa. A bela mulher estava sentada ao lado do marido, embora o tratamento entre os dois fosse da mais congelante frieza. O que um dia fora uma beleza estonteante, hoje era escondida atrás de um olhar muito triste e cansado.

Narcisa Malfoy fitou Snape. Ele quase pôde sentir a dor e desespero da mulher em estar ali. Para ele, Narcisa era a única pessoa digna naquele covil de criminosos. Ela não tinha muita escolha quando sua própria irmã era uma Comensal e também era concubina do Lorde das Trevas. Ela não tinha muita escolha quando seus pais arranjaram-lhe um casamento vantajoso com o filho do muito rico Abraxas Malfoy, que acabaria por vir a se tornar, também, um Comensal da Morte. Narcisa se via presa numa vivência horripilante, onde, sob a dominância do marido, não teve o direito de se opor à mudança de Lorde Voldemort para a Mansão Malfoy, nem à iniciação do próprio filho. Ainda se lembrava com clareza da visita de Narcisa, acompanhada de Bellatrix, à sua casa em busca de ajuda para o filho que estava sendo punido pelo Lorde das Trevas pelos erros do pai.

Na verdade, essa era uma das coisas que Snape mais admirava: o amor de uma mãe. Vivera isso nas diversas vezes em que Eileen, sua mãe, o protegeu com o próprio corpo dos golpes covardes deferidos por Tobias. Viu isso em Lilian Potter que salvou a vida do próprio filho dando a sua no lugar. Vira isso em Narcisa quando ela se ajoelhou perante de si pedindo que protegesse Draco.

Cetim Esmeralda | ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora