Esperanças;

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esperanças;
escrito por asteroyid.

O corpo grande em questão a altura tremeu quando se libertou daquilo que aparentemente fazia mal ao seu organismo, mesmo que houvesse expelido mais líquido por ter comido pouquíssimo desde o dia anterior. Ainda que de cabeça abaixada, o olhar desgostoso vindo de sua mãe, deixava-o mais desconfortável, por isso levantou do chão frio, pegou sua escova de dentes e o creme dental no qual todos compartilhavam. O gosto de ferro era terrível, fazia com que uma ânsia surgisse.

Era óbvio que havia causado um pequeno - ou esperava fielmente que fosse - atraso, portanto já esperava ouvir mais um falatório desnecessário. Sua cabeça latejava somente em pensar na voz grossa e rude de seu pai lhe repreendendo.

— Pare logo com isso e termine de se arrumar. Por causa da sua desobediência DakHo terá que fazer duas viagens estando atrasado. — Fora as últimas palavras de sua progenitora antes de dar as costas e sair do cubico que chamavam de banheiro.

Jeon tinha os olhos marejados, avermelhados e quiçá inchados pela noite anterior, que acabara por dormir de tanto chorar. Sabia que os mais velhos já não eram tão afetuosos, mas esperava um fiozinho mínimo de preocupação. Um "está tudo bem?". Quem sabe o mandassem para a cama de volta como via nos poucos filmes que eram permitidos. Tolo, como sempre.

Com a expressão abatida e um pouco pálida, caminhou até a cozinha em que o mesmo cheiro que outrora lhe fizera enjoar ainda predominava o local e pegou sua mochila que continuava no mesmo lugar: no chão, no meio do caminho. Ainda sem falar um "a", encontrou seu pai sentado na poltrona que dizia ser somente sua; seu trono. A pose tão imponente e rígida. Quem sabe realmente fosse um rei. Sequer o olhou, apenas se dirigiu em direção a garagem não tão espaçosa. Agradeceu a qualquer coisa divina existencial, sem se importar o nome. Fazia tanto tempo que não entrava no automóvel da família, mesmo que fosse sido trocado à tão pouco tempo.

Aproveitou o silêncio do ambiente para pensar em como uma relação digna de um comercial de margarina entre pais e filho chegou aquele ponto; tão abusivo e desesperador ao ponto de se olharem nos olhos raramente. Acreditem ou não, mas tinham até uma noite do cinema aos sábados, regada de muita pipoca, doce e refrigerante.

Tudo mudou quando aquele maldito resultado de exame mostrou que o filho único dos Jeon fazia parte da pequena porcentagem de homens que podiam engravidar naturalmente, na época, quando tinha apenas sete anos.

Ao passar dos anos, a espécie humana evoluiu o suficiente para que o processo de gravidez não se restringisse apenas às mulheres. Antes de tudo passar a ser encarado com normalidade pela sociedade, esses homens - alguns que sequer tiveram o resultado final do exame - foram mortos através linchamentos coletivos que eram organizados bem no nariz das autoridades, por desconhecidos ou até parentes. Não só os homens que geravam, como o bebê, caso tivesse a sorte não tão incrível assim de conhecer o mundo, e o outro pai da criança.

A família descobriu quando Jungkook passou a se queixar com frequência de dores na região da barriga, um sintoma comum para quem apresenta essa condição, no mesmo tempo em que toda a vizinhança escutava do patriarca que o primogênito seria um médico de sucesso estrondoso, casado com uma mulher tão boa quanto e lhe daria mais de dois netos.

Um balde de água congelante fora jogada a sua cabeça quando foi de filho perfeito a vergonha. Sendo condenado como culpado por um casamento ir só ladeira abaixo por sua mãe e ouvindo palavras mais afiadas que uma faca vindo de seu pai antes tão amoroso.

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⏰ Última atualização: Aug 13, 2020 ⏰

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