Capítulo 1: Olhos Rubros

203 5 0
                                    

CAPÍTULO 1: Olhos Rubros

Para a Sra. Dobbs, uma das responsáveis do orfanato Doce Coração de número 75 da Rua Carneiro Florido no bairro Vila Isabel localizado na Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro, nada era mais irritante do que ouvir uma criança abrir a boca e lhe dirigir a palavra.

Pra ela não havia desprazer maior que olhar no rosto de um pirralho – como ela mesma os chamava – e forçar um sorriso uma vez por mês quando o governo enviava alguém para inspecionar o orfanato. Por isso quando o relógio marcou seis horas da manhã, ela já estava de pé e pronta para enfrentar o dia.

Sra. Dobbs era uma mulher de trinta e três anos, mas que aparentava ter dez anos a mais. Seu cabelo era crespo e penteado em um coque, seus olhos eram grandes e castanhos escuros por trás daqueles óculos leves, seu nariz era grande e fino, era alta e magricela, suas roupas eram conservadoras. Longe dos ouvidos de Sra. Dobbs, as crianças a comparavam com as bruxas dos desenhos animados.

Era uma manhã de sábado e o inspetor iria chegar por volta das oito horas, e como ela não estava nem um pouco a fim de se fazer de boazinha, ela desceu a escada e foi ate à cômoda próxima a porta, abriu a gaveta e pegou uma folha de papel e uma caneta e escreveu um bilhete informando que iria pegar a Kombi e fazer as compras do dia. E assim a Sra. Dobbs pegou as chaves da Kombi e partiu do orfanato rumo à feira.

Ao dar ré na Kombi e sair da garagem do orfanato algo lhe chamou a atenção, por um momento ela achou ter visto um tipo de maquina parecida com uma moto cortar o céu como um jato. Ela chacoalhou a cabeça e olhou novamente para o céu, não havia nada de anormal lá, exceto o fato de segundos atrás não haver uma única nuvem naquele céu azul e agora tinha nuvens se formando indicando que uma tempestade se aproximava. Isso não podia ter nada haver com eles, poderia?

Sra. Dobbs decidiu ignorar essa sensação de ansiedade e familiaridade, pisou fundo e se foi para a feira.

Já era por volta do meio dia quando a Sra. Dobbs decidiu fazer uma pausa para o almoço. Ela estacionou a Kombi em um estacionamento de supermercado próximo a praia, pegou sua bolsa e saiu. Conforme caminhava, ela logo estava em uma rua de frente para a praia. Ela achou um restaurante logo em frente. Depois de fazer o pedido, ela acabou se sentando de cara para o mar. Ao abrir a bolsa, ela pegou o aparelho telefônico e olhou o visor, tinha várias chamadas perdidas do orfanato, decidiu ignorar.

- O que os olhos não veem o coração não sente... – ela murmurou pra si mesma.

Ao olhar para o mar, notou logo de cara que algo não estava bem. Parecia que uma forte e violenta tempestade se aproximava pelo oceano Atlântico.

Definitivamente estava acontecendo algo.

- Será que...? – comentou pra si mesma. – Isso só pode ter algo haver com a ilha... Que seja, isso não tem mais nada haver comigo... – ela disse e por fim almoçou.

Como estava enganada.

Não muito distante do local em que a Sra. Dobbs se encontrava, no estacionamento do supermercado onde a Kombi estava, entre um carro popular e a Kombi, um homem se materializou.

Esse homem usava uma capa de chuva preta que chegava abaixo de seus joelhos. Em seus pés, botas pretas de mercenário os calçavam. Em suas mãos, luvas pretas as cobriam. Não precisava ter uma boa visão para ver que o homem estava na pior, parecia ter acabado de fugir de uma guerra. Seu rosto estava cheio de hematomas e um corte profundo feito por algum tipo de faca ou ate mesmo espada, marcava sua bochecha direita, ao que tudo indicava, ela tinha acabado de ser feita e iria deixar uma cicatriz para o resto da vida. Seu rosto estava sujo de carvão e sangue fresco e seco. Seus olhos eram de um castanho claro, quase dourado.

Ele abriu o zíper de sua capa e de dentro tirou e segurou em seus braços, protegido e envolta de uma manta azul, um bebê que não passava de um ano. O bebê tinha o cabelo meio acobreado, quase ruivo e aparentemente rebelde.

O homem olhou em volta e viu a Kombi e na lateral da Kombi azul estava escrito “Orfanato Doce Coração” em verde sobre algumas pinturas de flores.

- Achei... – disse o homem em estado deplorável. Sua respiração estava arfante. Ele parecia estar lutando com todas as suas forças para se mantiver de pé. Ele ouviu um estalo no ar.

Ele correu a porta lateral e colocou o bebê no banco atrás do banco do passageiro. Ele retirou um envelope branco simples lacrado com cera vermelho-sangue destinado a Sra. Dobbs em uma cor preta, e o colocou um pouco abaixo das pequenas mãozinhas do bebê que dormia. Retirou um relógio-de-bolso de bronze do bolso interno de sua capa. O abriu, já eram duas horas e vinte e três minutos exatos da tarde. O fechou e em seguida o colocou em volta do pescoço do bebê.

- Se cuide amigão... – ele disse. Seus olhos derramavam lagrimas. – Eu prometo que um dia eu volto para te buscar, mas ate lá, seja forte, pois vão dizer muitas coisas ruins sobre você e sobre seus pais, mas não se abale. Lute e persevere. Ate outro dia, William Blake... – ao mesmo tempo em que ele terminou de se pronunciar, ele ficou em alerta.

- Achou mesmo que poderia fugir? – disse uma voz ao redor do homem misterioso.

- Randolf! – exclamou o homem ao mesmo tempo em que com um movimento rápido fechou a porta da Kombi e deu um pulo forçado para trás desviando da faca atirada nele, tudo isso ao mesmo tempo em que seus olhos ficavam rubros – um vermelho carmim.

Randolf era um homem que não aparentava ter mais de trinta anos. Seus cabelos eram intensamente negros e lisos e ultrapassavam os seus ombros. Ele usava também uma capa de chuva, mas ela era prateada e tinha as bordas azuis. Suas botas eram da cor chumbo, sua calça era cinza, sua camisa era da cor chumbo, suas luvas eram cinzas – e o homem notou uma praticamente elevação na luva direita sob o dedo médio indicando que Randolf estava usando um anel com alguma pedra. Em suas costas, desenhado na capa, quase cobrindo suas costas inteira, havia um escudo dourado quase triangular com a ponta pra baixo, no centro desse escudo estava desenhada uma espada prata com a ponta pra cima. Seus olhos também estavam rubros.

Apesar de não estar tão mal quanto o homem que trouxe o bebê, Randolf também demostrava visualmente que tinha acabado de sair de uma batalha. Toda a sua roupa estava meio suja de sangue, carvão e terra. Seu rosto estava impecável, e aparentemente ele presava muito por ele, já que ele tinha o seu charme.

- Vejo que você ainda consegue se manter de pé, Thomas... – constatou Randolf.

Mas ao invés de ficar de conversa fiada, Thomas Baker movimentou as mãos fazendo vários punhais surgirem e no mesmo movimento, ele foi pegando um por um e lançado mortalmente em Randolf que com movimentos de maestria, deu piruetas e saltos como se a gravidade não existisse pra ele, mas Thomas conseguiu o que queria, aos poucos os dois foram se afastando da Kombi e de William.

Já com várias ruas de distância do estacionamento do supermercado, Thomas e Randolf se encararam. Ambos estavam no telhado de um prédio de sete andares.

- Como me achou? – perguntou Thomas.

Randolf deu um sorriso de escarnio.

- Simples, antes de você usar o Jet ski e fugir, eu consegui lançar um rastreador em você. – disse Randolf.

Thomas verificou com a mão as suas costas e achou o rastreador atrás de seu ombro. Ele o pegou. Era uma bolinha parecida com uma mamona, mas preta e duas vezes menor, que gruda facilmente em tecidos. Thomas esmagou o rastreador entre o dedo indicador e o polegar como se fosse uma bolinha fofinha de areia.

- Então, como vai ser? – perguntou Randolf. – Por que eu posso apostar que você não deve ter mais que umas dez armas em seu Manto. Já eu, por outro lado, reabasteci o meu antes de vir atrás de você.

Thomas respirou fundo e fez seus olhos voltarem a ser castanhos.

- Não posso dizer que estou feliz, pois esperava que você resistisse, assim eu poderia te matar... – disse Randolf e suspirou. – Fazer o que... Thomas Baker, você esta preso por traição contra Nizar. A pena por traição é a prisão perpetua em Arphatraz.

William Blake dormia sem preocupação alguma, sem saber que quando a Sra. Dobbs chegassem ao orfanato e abrisse a porta traseira da Kombi, iria gritar ao vê-lo e que iria passar as próximas horas tendo seu nome praguejado pela Sra. Dobbs enquanto ela tenta o fazer dormir.

Armas do Milênio: Escola de AssassinosOnde histórias criam vida. Descubra agora