Lorena Camilo Lima 2A, João Victor de Souza Pereira 2B e Bruna Marola 2B
FANFIC - QUARTO DE DESPEJO
17 de Maio de 1967
Não sei dizer o porquê de estar escrevendo, isto ainda é um choque pra mim... Achar o diário de minha querida mãe depois de tanto tempo sem vê-lo. É louco pensar que quando eu era mais novo, há uns 7 ou 8 anos atrás este diário era tudo pra minha mãe, ela só não estava escrevendo nele quando estava catando papel para não nos deixar passando fome. Ah, nem me apresentei, eu sou João José, filho de Carolina, tenho quase 18 anos e resolvi continuar escrevendo o diário da minha mãe, coisa que ela não fez.
Tanta coisa mudou desde 1 de Janeiro de 1960, não posso dizer que lembro exatamente sobre tudo que aconteceu naquela época pois era uma criança, mas obviamente, graças a minha mãe, nossas vidas mudaram completamente para melhor.
18 de Maio de 1967
Não consegui escrever mais ontem, fiquei o resto do dia ajudando minha mãe.
Resolvi que vou tentar escrever aqui tudo que mudou desde aquela época, quem sabe algum dia este diário será publicado como era o planejado há anos atrás... Tudo começou a mudar em Junho de 59, quando foi publicada, no Cruzeiro, uma reportagem sobre a minha mãe por conta deste diário que está em minhas mãos agora, eu lembro dela me falar um dia que tudo poderia mudar a partir daquele momento.
"Retrato da Favela no Diário da Carolina", este era o nome da reportagem, pois seu diário se trata do triste e esgotador cotidiano de nós, que morávamos na favela do Canindé, ou melhor, no quarto de despejo do Brasil, segundo minha mãe.
20 de Maio de 1967
Logo após a publicação da reportagem tudo ficou um pouco melhor, me lembro que minha mãe conseguia ficar mais tempo em casa. Óbvio que ainda tinha que catar papel e ir no frigorífico para ganhar cruzeiros e pegar comida, mas ela passou a ficar menos tempo na rua e mais conosco.
Agora que eu cresci eu entendo que ela começou a receber mais cruzeiros de pessoas como retribuição à reportagem, pois aparentemente muitos gostaram do fato dela ter escrito mais sobre a favela, pois era a única maneira de pessoas que não moravam lá ter uma idéia de como a realidade é difícil para aqueles que não tem nada.
Ela começou a receber mais, o que pra gente, que até passávamos dias sem comer, era a melhor coisa do mundo. Porém, as brigas aqui na favela, como minha mãe disse aqui no diário, eram muito comuns, e neste caso não foi diferente.
21 de Maio de 1967
Como eu estava dizendo, as pessoas aqui da favela, que já sentiam inveja de minha mãe por ela saber se virar sem ter um homem, ficaram revoltados depois que perceberam que ela estava recebendo cruzeiros pois iria publicar um diário que citava nomes de muitos que moravam lá, e a maioria das coisas que ela falava dessas pessoas eram coisas ruins.
Não entendo direito, eu achei, antes de minha mãe me contar, que as pessoas da favela iriam ver a publicação do diário da minha mãe como uma forma de os representar, e até teriam esperança de que as pessoas que lessem poderiam sentir pena e tentar ajudá-los, mas ao invés disso, ameaçaram ela até de morte, e falaram que tirariam os filhos dela se o diário fosse publicado, e como ela sempre ligou muito para nós, ela não arriscou e este diário, em que estou escrevendo agora, nunca foi publicado.
Mas, graças a reportagem, minha mãe resolveu ir guardando parte dos cruzeiros que recebia pois queria nos dar uma vida melhor, ela fazia de tudo para sairmos da favela, e depois de 3 anos ainda trabalhando duro, catando papel todos os dias para conseguir nos alimentar, guardando os cruzeiros que ganhava para que pudéssemos sair de lá um dia e os escondendo, para que ninguém da favela tentasse roubá-la, conseguimos finalmente sair da favela e alugar uma casinha bem bem pequena em um bairro que também era bem precário, porém bem melhor do que onde morávamos antes.
22 de Maio de 1967
Queria deixar claro que as coisas não foram nada fáceis, o fato de minha mãe não publicar o livro dela foi muito ruim, ela perdeu motivação de fazer tudo, por isso parou de escrever. A publicação dele era sua única esperança para conseguir sair daquele lugar horrível, onde só havia sofrimento. Ela até chegou no ponto de nos dizer que queria se suicidar, pois todo mundo a odiava, mas, como ela sempre dizia, ela não precisava de ninguém, e aos poucos foi voltando a ficar mais positiva.
Grande parte do que fez ela ficar melhor foi o Manoel, que se tornou muito presente depois da reportagem. Agora que eu li o diário dela, percebo que ela gostava muito dele, porém sempre tomava cuidado porque achava que ele só estava lá com ela pois sabia que ela estava recebendo uma quantidade boa de cruzeiros, ela achava que ele estava planejando roubá-la, mas aos poucos foi percebendo que não era isso e que ele realmente estava lá porque a amava.
25 de Maio de 1967
Minha mãe viu que eu achei o diário dela e não ficou nada feliz, me disse que não gostava de relembrar daquela época horrível, então serei mais breve, sei que ela vai escondê-lo de novo, então pretendo terminar de explicar tudo hoje.
Manoel começou a fazer parte de nossa família, mas ele e minha mãe nunca chegaram a se casar. Morava junto com a gente e ajudava a minha mãe a conseguir cruzeiros e comida, e quando conseguimos sair da favela, ele veio morar com a gente.
Ele conseguiu um emprego, o que foi ótimo pois ajudava a pagar o aluguel. 2 anos depois, após ser rejeitada diversas vezes, minha mãe conseguiu um emprego como costureira. Eles trabalhavam pesado, mas conseguiam o suficiente para nos sustentar.
Para minha mãe, conseguir um emprego e conseguir nos sustentar juntamente com um homem que ela ama foi a melhor coisa que aconteceu, eu, José Carlos e Vera Eunice percebemos que ela estava muito feliz.
Até que um dia Manoel saiu para trabalhar e nunca mais voltou. Descobrimos, depois de 5 dias angustiantes achando que ele tinha nos abandonado, que ele foi atropelado e morreu naquele mesmo dia. Ficamos devastados, minha mãe passou uma semana inteira trancada no quarto chorando.
Eu fiquei encarregado de buscar comida para ela e para meus irmãos durante esse tempo, mas sabia que se ela ficasse mais tempo sem ir para o trabalho ela seria despedida, e não teríamos condição de continuar morando lá.
Por isso, fui até o lugar onde ela trabalhava e expliquei a situação. A mulher que estava lá me disse que se no dia seguinte ela não fosse trabalhar ela viraria uma desempregada. Contei isso para minha mãe, que entendeu a gravidade da situação, e mesmo destruída após a morte de seu companheiro, foi ao trabalho.
Percebi que ela estava, ao poucos, ficando melhor. O trabalho era a única distração que ela tinha, e sua única motivação era nos sustentar e não voltarmos a morar em Canindé.
Um ano depois, ela conseguiu um outro trabalho com um salário mais alto, o que a deixou muito feliz. Depois disso, tudo foi ficando melhor. A morte de Manoel fez com que ela se tornasse uma pessoa ainda mais forte.
Hoje em dia, ela continua neste mesmo trabalho e gosta muito disso. Acabamos nos mudamos para um lugar um pouco melhor e estamos muito felizes. Estou conseguindo ajudá-la a pagar as contas e nossa vida está mais do que boa. Eu sempre serei extremamente grato e orgulhoso por tudo que minha mãe já fez por nós.