Fazia calor naquela noite, a mulher segurava em seus braços a criança que estava entretida com o brilho das estrelas, entretida demais para saber o que acontecia ao seu redor. Com um sorriso carinhoso, a mulher lhe afagou os cabelos e sussurrou para que apenas a filha ouvisse: "meu pequeno escorpião"
Margaux despertou com um impulso. Suas vestimentas grudavam em seu corpo suado deixando-a desesperada por um banho. Quase todas as noites o mesmo sonho assombrava a sua mente, a criança, a dança e a mulher. Sacudiu a cabeça para se livrar de pensamentos incomodos e levantou-se sem fazer barulho, afinal não queria acordar nenhuma de suas colegas adormecidas.
Margaux Paul trabalhava para a família Lyons há quase uma década, tinha passado tantos anos seguindo os passos de Christine Lyons, que as vezes esquecia-se de como era o soar de sua voz.
Até mesmo em seus aposentos, a mulher era cuidadosa e silenciosa, algumas das outras serventes até se perguntavam se Peggy, como costumavam-na chamar, tinha a capacidade de falar. Mas, Margaux não tinha interesse em amizades, não tinha interesse em outros homens, sequer olhava com desejo para os luxuosos vestidos que Christine adorava exibir pelo pátio da mansão, muito pelo contrário, se pudesse usaria vestimentas próprias para atividades equestres, como calças e botas. O que tomava o interior de Peggy, era uma intuição, uma sensação misteriosa acompanhada de calafrios todas as vezes em que admirava o mar pela janela de Christine, como se as ondas que se quebravam contra as rochas chamassem seu nome, gritando para abraçar o desconhecido com todas as suas forças.
Balançou a cabeça, livrando-se de pensamentos inadequados e saiu do quarto às pressas, a família logo voltaria de viagem e era seu trabalho esperar por seus senhores no pátio.
Ano após ano Margaux observava a família viajar para um lugar diferente, todos acomodados em um enorme navio que partia para os confins do oceano levando-os para uma nova cultura. A única vez em que Peggy estivera no infame Jóia da Sereia, foi para aprontar os aposentos de Lady Lavinia, já que sua fiel servente havia falecido recentemente e Peggy tivera que tomar conta de seus afazeres por duas longas semanas. O navio era tão bonito que por consequência Margaux quase derramou lágrimas de emoção, daria qualquer coisa para trocar de lugar com Christine que sempre reclamava de enjoo e se trancava em seus aposentos até chegarem em terra firme.
Suas memórias foram dissipadas quando o barulho das carruagens alcançou os portões dourados da mansão. Esperava encontrar Christine irritada ou até mesmo sonolenta, entretanto, ela estava estranhamente quieta, seu semblante sempre expressivo, agora estava ameno, os lábios carnudos retos em uma linha, até sua pele cor de caramelo parecia brilhar menos.
Mal esperou os pais entrarem porta á frente para correr para seu quarto, direcionando um único olhar para que Margaux a seguisse. Quando se encontraram na privacidade do quarto da herdeira, a mesma desabou na cama:
— Vou me casar - disse em um tom brando - Eu nem o conheço, mal sei seu nome.
A empregada estava estática, o que deveria falar em um momento tão delicado? Parabéns? Sinto muito?
A única saída que encontrou foi ficar silenciosa e esperar que Christine desse mais detalhes do que estava acontecendo. Christine gostava de passar o tempo tocando piano e lendo poesias, também gostava de comprar vestidos novos e hospedar bailes luxuosos, mas ao contrário da maioria das herdeiras de Cardiff, Christie era uma boa menina, sempre gentil com todos e principalmente com Margaux, nunca levantando a voz para empregados e sempre sorrindo para todos. A maçã realmente tinha caído bem longe da macieira.
— Como podem ter feito isso comigo? - perguntou com raiva - Será que sou apenas uma moeda de troca?
"Sim" pensou a loira, olhando em direção da moça deitada na cama. Algumas vezes apiedava-se de Christine, embora rica e com oportunidades de ouro, teve sua vida traçada pelo pai, sem escolha própria.
Antes que pudesse falar algo, ambas ouviram batidas rítmicas na porta do quarto. Margaux sabia exatamente quem eram, as damas de companhia de Christine.
— Eu não posso fazer isso agora - disse com lágrimas nos olhos - Por favor, mande-as embora.
Peggy assentiu e abriu a porta apenas o suficiente para que seu corpo pequeno passasse pela fresta.
Charlotte e Amellie estavam esperando do lado de fora. Charlotte usava um vestido azul como o céu em um dia de verão, seu cabelo vermelho como fogo estava preso em um elegante penteado e em seu rosto estava sempre presente a expressão de descontentamento. Por outro lado Amellie tinha seus cabelos negros como a noite e lisos como cetim penteados cuidadosamente para traz, vestia trajes da cor do marfim e portava em suas mãos uma caixa de chocolates.
— Senhorita Christine não está se sentindo muito bem após tantos dias no mar - disse quase mecanicamente - Ela pede para que retornem pela manhã, quando estiver se sentindo melhor.
Charlotte mal esperou Peggy terminar de falar para revirar os olhos e sair andando pelo corredor, entretanto Amellie não a seguiu como o de costume, esperou para que pudesse entregar a caixa de chocolates para a servente.
— Eu... Fiquei sabendo da grande notícia - disse com pesar - Diga á ela... Diga que sinto muito - pediu balançando a cabeça, como se dissesse adeus para o quarto.
Peggy esperou para até que Amellie estivesse fora de vista para entrar novamente no quarto luxuoso onde encontrou Christine na mesma posição de quando a deixou. A servente lhe entregou os chocolates e repassou o recado da amiga. Depois de longos minutos de silêncio, a menina decidiu finalmente pedir o que queria:
— Por favor prepare um banho quente para mim e apronte minhas vestimentas noturnas, depois está dispensada pelo dia.
Christine levantou-se e caminhou cabisbaixa em direção ao lavatorio.
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Rubrum
VampireVocê já disse "não" para uma tentação? Já tentou resistir com todas as forças a algo que seu lado sombrio desejava? Margaux Paul está acostumada a dizer não, a se controlar e não dar voz aos seus pensamentos que pedem para que enlouqueça e se entr...