Todos os pertences de Peggy couberam em uma simples mala. A mulher não tinha muitas coisas além de dois pares de uniforme, três ou quatro vestidos casuais, um álbum de fotografias antigo e um único vestido de festa, que nunca tinha usado. Enquanto andava pela cozinha, pode distinguir claramente Doutor Lyons discutindo com sua filha.
— Por que tens que fazer isso?! – exclamou Christine – Você não pode simplesmente tirá-la de mim!
Peggy queria encontrar algum tipo de conforto nas palavras de Christine, no entanto tinha plena consciência de que quando Theodore decidia algo, sua palavra era sempre a final. Christine poderia chorar e gritar o quanto quisesse, nada mudaria o fato de que Margaux viveria na residência Welch.
Ela não se despediu de ninguém, não chorou, sequer esboçou algum tipo de tristeza. Sabia que aquela seria uma situação temporária, afinal logo Lorde e Christine se uniriam em matrimônio e tanto ela quanto Minerva voltariam a residência Lyons, prontas para servir a família por uma eternidade.
"Eternidade", pensou enquanto um arrepio percorria sua espinha dorsal. Havia uma razão especifica para Margaux evitar com tanta veemência pensar sobre seu futuro, ela não tinha perspectiva. Desde que entrou na casa Lyons, com apenas onze anos, sabia que aquele seria seu presente e seu futuro. Quiçá era esse o motivo de não criar laços com ninguém naquela casa, de que adiantaria?
O caminho até a residência de Lorde Welch foi preenchido com recorrentes lágrimas de Minerva, a pobre menina não aceitava estar sendo levada para longe de todos os amigos, para longe de onde crescera. A viagem durou quase uma hora e meia, de acordo com a contagem de Margaux, quando avistaram os portões da casa, Peggy pode sentir na pele a diferença dos lugares. Enquanto a residência Lyons encontrava-se perto do oceano, seu novo local de trabalho ficava no meio de um bosque, cercado apenas por árvores e rochas. A mansão de sua antiga família era como uma brisa de verão, sempre clara e fresca, a casa era larga e com dezenas de janelas brancas que sempre deixavam os corredores iluminados, até mesmo durante a noite quando apenas a lua e as estrelas brilhavam.
A casa de Lorde era o oposto, era tão alta que Margaux tinha certeza que deveria ter ao menos quatro andares, havia uma torre com o que parecia ser um observatório adjacente ao resto da construção. A mansão estava localizada no centro de um excêntrico labirinto de arbustos, tudo ali era tão sombrio, que até mesmo uma névoa macabra infestava e abraçava o lugar, como se colocado ali propositalmente. As paredes frias eram cobertas com trepadeiras e a maioria das janelas estavam fechadas com imensos pedaços de madeira.
Margaux ainda não sabia como analisar seus sentimentos em relação a situação na qual se encontrava. Não sabia o porquê se sentia tão estranha na presença de Lorde, provavelmente porque não o conhecia direito. Tantas mudanças em tão pouco tempo, se sentia vertiginosa. Só queria que toda aquela maldita confusão acabasse e que sua mente fizesse sentido mais uma vez.
O cocheiro abriu a porta da carruagem abruptamente, assustando tanto Minerva quanto Margaux. Era um sujeito mal encarado, parecia nunca ter sorrido na vida e tinha uma cicatriz que cortava por seu olho esquerdo.
— Chegamos - disse com uma carranca.
Ambas mulheres seguiram sozinhas em direção a entrada da casa, a medida que se aproximavam a excitação e ansiedade tomavam conta do corpo de Margaux, ela já não sabia mais o que esperar daquele dia.
Lorde Welch estava esperando-as no hall de entrada. Estava vestindo trajes parecidos com os da noite anterior, calças e camisa negras como a noite e uma blusa branca pouco maior que sua silhueta. Apesar da neblina envolvendo a casa, o homem não parecia sentir frio.
No instante em que ambas mulheres fizeram de sua presença evidente, o homem fechou o manuscrito e cumprimentou-as.
— Theodore disse que estariam aqui por volta das dez. Não pensei que seriam tão pontuais. – sorriu.
O relógio atrás do homem marcava 9:58 da manhã. Não estava surpresa, nunca esteve atrasada. Lorde acompanhou as serventes até a cozinha, era um cômodo espaçoso, mas não muito iluminado, os armários eram de pinho e havia uma pequena mesa redonda onde Margaux assumiu que seria para as serventes realizar suas refeições diárias. Ainda parado no batente da cozinha, Lorde designou o serviço culinário e mercantil à Minerva, também apontou para uma porta de madeira no fundo da cozinha e informou-a que aquele seria seu quarto.
Minerva logo agradeceu e levou suas bagagens as pressas em direção aos seus novos aposentos, deixando Lorde e Margaux em um silencio desconfortável. Lorde Welch fitou Margaux de cima a baixo, como se debatendo onde Peggy seria melhor utilizada.
— O que você pode fazer? – perguntou repentinamente.
— Perdão? – perguntou confusa.
— O que você fazia na casa de Christine? Sei que Minerva ajudava na cozinha...
Margaux deixou a cabeça pender para o lado. Como ele sabia? Aliás, por que se interessava naquele tipo de atividade trivial?
— Eu sou... Eu era a serviçal pessoal de senhorita Christine. Escolhia seus vestidos, acompanhava suas caminhadas matinais, preparava seus banhos...
Lorde balançou a cabeça e indicou para que Peggy fosse para a sala.
— Eu não preciso que faça isso aqui. – anunciou enquanto dava as contas à servente – Será responsável pela organização e limpeza da casa.
Margaux assentiu e seguiu Lorde até a outra extremidade da casa, muito perto da sala de máquinas. Ao abrir a porta do aposento, encontrou-se em um quarto relativamente maior ao seu anterior, as paredes tinham um papel de parede floral e envelhecido, a cama era grande o suficiente para duas pessoas e parecia muito confortável, havia também um armário e um espelho. O quarto era frio e impessoal, como qualquer outro cômodo na casa, entretanto Margaux já tinha isso em mente, afinal aquela casa estava inabitada por muitos anos, não?
— A casa possuí apenas um quarto para empregadas, espero que esteja confortável.
E por quase uma semana essas foram as únicas palavras que ouviu de Lorde.
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Rubrum
VampireVocê já disse "não" para uma tentação? Já tentou resistir com todas as forças a algo que seu lado sombrio desejava? Margaux Paul está acostumada a dizer não, a se controlar e não dar voz aos seus pensamentos que pedem para que enlouqueça e se entr...