Lembro que nos conhecemos em um fim de tarde de uma terça-feira, estava calor e estávamos sentadas em uma roda de conversa no meio de um parque, cheio de árvores, ela se sentou ao meu lado e puxou papo "Então, o que tu estuda?" eu respondi meio tímida "História, e você?". Depois disso trocamos o número de telefone e não paramos mais de conversar, descobri que ela fazia Teatro, que era vegana e que sonhava em conhecer o mundo.
Meses se passaram até percebermos que o que sentíamos não era só amizade, que o querer estar perto que sentíamos, não era o que amigas sentiam, nós tínhamos a necessidade de nos tocar, e beijar e fazer planos para o futuro, juntas. Talvez ter um cachorro e três filhos, montar um café livraria onde só venderíamos produtos veganos, viajar pelo mundo dentro de uma combi.
Mas aí ela descobriu o câncer, e nos realmente pensamos que iria dar tudo certo e que passaríamos ilesas de tudo isso, mas como diria o sábio Chorão "Cuidado com o destino, ele brinca com as pessoas" e ele brincou, logo com nós que nos amávamos tanto, logo com você que era tão jovem e tinha tantos planos pela frente.
Ele foi cruel com você, em poucos meses ele te destruiu, mesmo depois da quimio. Eu não te via mais sorrir, você parou de cantar e de dançar junto com o vento. Mas continuamos juntas, esperando por notícias boas, mas elas nunca chegaram. Então você piorou mais, e foi internada, e eu fazia o máximo possível pra te alegrar, lia livros pra você, falava como as flores estavam lindas e como na próxima primavera nós iríamos fazer muitos piqueniques no parque, e por alguns segundos você até sorria, você amava piqueniques, e amava ainda mais a primavera.
Lembro que estava terminando de separar as coisas pra levar pro hospital pra passarmos o nosso aniversário de namoro juntas, comendo suas comidas favoritas e assistindo um filme meloso qualquer quando eu recebi a ligação, você tinha partido, o universo achou que já tinha chego a sua hora e que você já tinha cumprido a sua missão aqui. Aquele foi o momento mais doloroso da minha vida, eu só consegui cair no chão e chorar, passei horas desse mesmo jeito até alguém chegar pra me ajudar.
Quando você se foi, foi como se alguém estivesse arrancado o meu coração do meu peito e o destroçado em milhares de pedaços, como eu iria viver sem você? Sem o seu riso fácil, sem suas histórias mirabolantes, sem o teu cheiro?
Mas hoje é sábado de manhã e nos encontramos deitadas em nossa cama, com nossos pijamas combinando. Estou deitada sobre seu corpo enquanto traço linhas imaginárias entre as pintas de seu colo e você suavemente enlaça seus dedos finos entre os cachos do meu cabelo. Estamos em silêncio apreciando a companhia uma da outra enquanto pequenos raios de Sol invadem o quarto.