ÚNICO: "como se fosse a primeira vez".

2.1K 239 490
                                    

Foi em uma noite fria, durante o inverno de 94, que a tragédia aconteceu.

Os flocos de neve caíam suavemente sobre a grama do jardim da bela casa dos Ruperts, com a mesma velocidade das finas gotas de água que cortavam o ar, noticiando o fim de mais um longo outono. Enquanto lá fora era gelado, dentro da casa dos senhores mais queridos da vizinhança, o verão aparentava nunca ter acabado.

O cheiro da deliciosa torta da sra. May já se exalava por toda cozinha. Mais um dia onde os Ruperts, Will e Thomas, desfrutavam do conforto de sua casa, enquanto Maybelle, a cozinheira, servia sua refeição mais apreciada pelos seus empregadores: a torta de maçã, que só se comia nessa época do ano naquele local.

Era noite de Natal.

William Owen Rupert, um empresário aposentado, de 79 anos e cabelos demais para a idade, ainda encontrava disposição para desfrutar os momentos com seu companheiro, mesmo após quase quarenta anos juntos.

Thomas Madden fora um pintor de sucesso considerável em sua época de juventude. Suas artes foram expostas de Londres à Alemanha, embora o nepotismo tenha sido de grande influência. Sua tia, Amelia Einheart, conhecida pelo mundo inteiro por suas pinturas à óleo, fez questão de exibi-lo consigo como um cantor em ascensão abrindo um show de um cantor nível mundial. Thomas tinha muito a agradecer a Amélia.

Juntos, ambos eram moradores de um bairro famoso de Londres, que abrigava alguns dos mais notáveis membros da Scotland Yard. Há quarenta anos, William e seu companheiro moveram-se para essa casa, considerada rústica para muitos, e até mesmo feia para olhares de outros, mas eles não estavam tentando chamar a atenção.

A década de 70 foi um dos piores anos da vida do casal. A homofobia presente na sociedade já era insuportável de lidar por si só, mas quando boatos sobre a união de um jovem pintor e de um empresário famoso nos confins de Londres começaram a rodar pela cidade como se os ventos sussurrassem, Thomas e William se encontraram à beira de um Adeus.

Jornais de todos os lugares resolveram noticiar esse boato, mesmo que nenhuma confirmação viesse de Will. William não se arrepende de nada, talvez apenas de não ter mandando um dedo do meio às leis e se casado oficialmente com o amor de sua vida, mas eventualmente ele superou. Hoje, o simples senhor de cabelos grisalhos, vive a vida que sempre sonhou ao lado do pequeno Thomas e seu olhar inquisitivo que ele nunca perdera.

O maior sonho de Thomas era que o século 21 chegasse com paz para todas as pessoas, com um opinião melhor sobre amor entre pessoas do mesmo sexo, o que era visto como pecado desde que nasceu. Entretanto, enquanto a opinião do resto do mundo não mudava, Thomas e Will viviam uma vida escondida de câmeras e qualquer coisa que envolvesse isso, o que nem de longe era ruim. O amor do dois ultrapassava qualquer barreira.

Amor de verdade nunca termina, mas a vida, infelizmente, sim.

— Querido, não faça tanto esforço com essas caixas — Thomas disse, em um fio de voz, enquanto observava Will carregar caixas pesadas sozinho, até o outro lado da sala.

— Não se preocupe, eu consigo levar.

Há dois anos, Will sofre de falta de ar frequentemente, o que já o levou a passar noites no hospital, mesmo que a medicina do século 20 não seja tão avançada, o mais velho respirava apenas por aparelhos. E era isso que lhe impedia de fazer muito esforço, já que sua falta de ar ataca violentamente quando assim o faz.

Seguido pelos olhos do marido, Will levou duas caixas até um canto da sala, massageando levemente suas costas assim que as soltou. Sua tosse, definitivamente, havia piorado desde o último fim de semana.

— Você acha que consegue carregar as outras caixas? — O senhor Rupert sentado em frente a lareira perguntou.

— Claro que consigo, querido. — Mas sua frase foi completamente abafada pela tosse que insistia em lhe incomodar.

[🎨] porque até em outras vidas eu me apaixonaria por vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora