Onde tudo começou.

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Já tinha passado três meses desde o atentado e os exercícios de fisioterapia ficavam cada vez mais intensos, sentia o ar faltar em cada movimento que fazia com a perna, a única dor mais forte que aquela era a lembrança de todos os amigos e familiares que perdeu naquela batalha. Sabia que tudo isso seria pior se não tivesse Mike por perto, mas ainda era estranho o sentimento de que tinha algo errado na relação deles, por mais que suas lembranças sempre mostrassem os momentos felizes que tiveram antes de todo aquele pesadelo, não deixava de questionar a razão pra ele não se lembrar de coisas tão marcantes que eles viveram no passado.
Graças a reflexão que fazia nessas visitas semanais ao fisioterapeuta o tempo passava voando, e nesse dia não foi diferente, acordou de seus pensamentos com o alerta programado pelo médico, avisando que o tempo para o último exercício tinha se esgotado.

-Qual é a notícia ruim do dia, doutor? - a garota questionou já se preparando para ouvir sobre as próximas consultas chatas que teria que frequentar até sua resistência melhorar.

- A notícia ruim é que você está perto de perder a esperança, não deveria deixar isso acontecer. - Abriu a boca para responder mas sentiu as palavras fugirem de sua cabeça, não tinha como negar que esperança era a coisa que mais lhe faltava nos últimos meses. - A notícia boa é que você está liberada, ao menos por hora, vai continuar os exercícios da sua casa e vamos marcar o retorno para o próximo mês.

- Você tá realmente falando sério? Não que eu não adore passar minhas horas preciosas aqui, mas eu quero uma garantia de que isso não é apenas uma brincadeira de péssimo gosto. -

- Não, Malena, dessa vez você realmente vai pra casa, precisa voltar para o seu treinamento e quem sabe isso ajude você a melhorar essas questões internas que parecem te atormentar mais do que minhas consultas. -

Preferiu não responder, novamente ele havia acertado e ela não daria o gosto de admitir isso na última consulta com ele, já não era tão ruim estar ali, talvez em circunstâncias normais ela até gostasse do lugar, mas naquele momento queria voltar para seu quarto e arrumar todas as malas para voltar à rotina normal. Também queria ver a cara do namorado na hora de dar a notícia, ele já tinha recebido a alta, mas negava o fato apenas para dar apoio a ela, era um pouco sufocante saber que estava prendendo ele ali mas admirava o carinho que ele teve por ela em todos aqueles dias difíceis.

- Okay, acho bom você ir atrás do seu médico agora mesmo e dizer que vai aceitar a alta pra podermos sair logo desse lugar péssimo! - Falou em um tom alto enquanto entrava no quarto que dividia com Mike, notou o garoto dar um pequeno pulo pelo susto enquanto olhava pra ela claramente confuso, como alguém que liderava uma das equipes mais importante de segurança conseguia ser tão desatento quando estavam sozinhos?

- Amor, você tá realmente me dizendo que recebeu alta com a perna nesse estado? Sua tia nunca vai deixar você voltar se souber que ainda tá sentindo alguma dor, é melhor você ir até seu médico e pedir pra fazer mais algumas consultas. -

- Você tá doido né? Eu consigo acabar com você em uma luta agora mesmo, a perna não vai mudar o fato de que sou uma das pessoas mais preparadas pra defesa de todos. - Por ela isso já era suficiente, não tinha dúvidas de que estava pronta para voltar ao seu cargo, mas a cara de preocupação do garoto era angustiante. - Mas... é claro que vou continuar os exercícios de fisio em casa, em mais alguns dias tenho certeza que nem vou sentir mais dor.
-

Terminou de falar com um sorriso nos lábios, vendo o namorado se aproximar e rodear sua cintura com o braço e depositar um beijo delicado sobre seus lábios. Até que já estava ficando mais calma com a sensação de seus beijos, mas ainda era estranho sentir que alguma coisa não se encaixava. Ficou no quarto por mais algum tempo enquanto o garoto procurava pelo médico, seus pensamentos voaram para longe e pararam em três sorrisos que queria deixar no passado, será que sua mãe sofria tanto quanto ela ao pensar em seu pai e seus irmãos? Era injusto que três vidas tenham sido interrompidas daquela forma horrível, era injusto ter que lidar com tudo isso e tirar forças para continuar defendendo aquela nação para que ninguém mais tenha que sentir a dor que sentia todos os dias depois do atentado, mas a única escolha era essa e logo teria que aceitar.

Em algum lugar há uma memóriaOnde histórias criam vida. Descubra agora