te amo.

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— Venha aqui. — A mãe chamava pela filha ao estar de pé, segurando uma escova para ajeitar os fios da criança.

A garota caminhava animadamente até a mãe, fitando os fios recém-cortados alheio. O sorriso inocente desta brotava, o cuidado da mãe consigo era sempre tão acolhedor, eram confidentes, tinham àquela união singular inseparável de mãe e filha.

[...]

A mãe verificava a temperatura da filha, ambas tiveram de ficar em casa para tratar da febre da mais nova, lhe foi dito para descansar. O salário da mulher seria descontado a cada vez que tivesse de faltar. Todavia, a preocupação de cuidar da menina era maior.

 Além de não se importar em faltar um dia.

Observava atentamente o rosto levemente corado da filha, a face serena era tomada pelo mal-estar, mas estava adormecida por efeito da medicação, depositou um selar casto na testa da criança e se afastou para não incomodar no descanso.

[...]

A mulher entregava a mochila e lancheira para a menina que agora já estava um tanto crescida, conforme crescia se tornaria independente. O coração da mais velha se apertava, assim sabia que a filha sempre seria o anjinho puro que sempre foi.

Nunca iria mudar.

A silhueta da outra se afastava cada vez mais, a claridade do exterior lhe mostrava que poderia ir embora a qualquer momento, ir para longe de si.

Respiração era ofegante, o sentimento de angústia a visitava com frequência. Não poderia se afastar da filha, esta era o único motivo para estar de pé naquele mundo tão maléfico.

[...]

Várias pessoas batiam palmas, o aniversário de 15 anos finalmente chegara, a filha tinha próprias ideologias e pensamentos, algo natural da adolescência. Já não tinha mais nenhum traço infantil que sua mãe gostaria que tivesse para sempre a proteger, o evento era presenciado por amigas, talvez futuros paqueras, pessoas que ela nunca voltaria a falar ou pessoas que levaria para a vida inteira.

Os traços cansados escondidos em um sorriso pelo evento feliz conseguiam ser disfarçados, a mulher gostaria de chorar internamente por saber que a filha estava crescendo e a deixaria logo, voltaria a ficar sozinha porque sabia que a outra teria responsabilidades na vida, tinha uma extraordinária jornada pela frente.

[...]

Como já foi dito, sua carreira seria extraordinária, os estudos seriam promissores, a filha saberia a nota do vestibular logo e, apesar de nervosa; soube que tinha passado na faculdade de seus sonhos, que logo foi comemorado ao contar para a mãe. Era o ápice da transição da adolescência para a vida adulta, seria independente e responsável consigo mesma. A mãe comemorava com a filha, chorava.

A filha tão dedicada abraçou a mãe de forma apertada, acreditando que a outra estava tão emocionada quanto si.

Não era um choro de felicidade.

O coração se quebrara.

Sua jovem inocente finalmente se fora.

[...]

Chegou o dia para ir embora, as malas estavam prontas, as passagens tinham sido compradas e a mudança estava completa, estava extasiada com o momento importante de sua vida.

— Você tem certeza disso? Quer sair de casa? — A pergunta no tom de incerteza fora lançada, estava se preparando para pedir a filha para ficar, uma vez que sabia que se a amasse mesmo, ficaria. — Sempre terá um lugar para você aqui, até mesmo o trabalho e estudo que deseja.

Arqueou a sobrancelha ao perceber a feição de tristeza da filha, sabia que estava hesitando para sair. Queria mantê-la por baixo de sua asa eternamente.

— Mãe, eu preciso ir...

Os passos alheios até a porta foram interrompidos, o olho no meio do colo da mãe agora era visível, assustando a mais nova por não ter tido aquela visão de sua mãe.

O olho estava revirado, só conseguia enxergar as veias no globo ocular e ao redor das pálpebras, o que tornava ainda mais perturbador, se afastando cada vez mais que a mãe chegava perto de si, logo desviou o olhar para o rosto da mãe, mirando as orbes vazias e tão brancas quanto aquele terceiro olho.

Tentou abrir a porta, porém não entendia o motivo de estar trancada, sendo que tinha certeza de que estava destrancada. Encolheu-se ao ter a mãe tão perto, as lágrimas tocavam o rosto macio da filha, as expressões de pânico foram a última coisa que viu antes de devorar a filha.

Agora estariam unidas para sempre.

Nada iria separar as duas.

Esse era o seu final feliz.


Fim.  

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