AM'DOR

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          Era apenas mais uma das manhãs torvas de outubro e como sempre, ela se sentou à sombra da mesma árvore, a mais ou menos uns trinta metros da mesa em que Jack costumava se sentar

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          Era apenas mais uma das manhãs torvas de outubro e como sempre, ela se sentou à sombra da mesma árvore, a mais ou menos uns trinta metros da mesa em que Jack costumava se sentar. Cinco minutos e estariam juntos, porém, afastados, pelos próximos quinze minutos antes da aula de anatomia. Ele não sabia que ela existia, mas ela o teria sob seus olhos, o comtemplaria silenciosamente e perceberia mais um dos seus inusitados detalhes.

          Uma maçã era o que Elizabeth tinha até o almoço, e uma faca era o seu mais recente instrumento, dado ao entalhe de um coração sobre uma das altas raízes do salgueiro. Entre algumas palavras aleatórias, se pegou escrevendo o nome de Jack e pensando se ele não era demais para o seu coração.

          Ela gostava de pensar em Jack, gostava de sonhar que um dia ele conheceria o seu amor e que ela conheceria o seu corpo nu. Gostava de imaginar seu futuro com ele, imaginar seus filhos com os mesmos cabelos negros e olhos cinza dele. Elizabeth gostava de sonhar e sorria sonhando, escrevia sonhando, e foi assim que esculpiu um poema que falava de línguas, olhos ardentes, de amor e dor, um poema que falava sobre a vida e sobre o seu coração pertencer a Jack.

          Um novo dia chegou, mais uma manhã torva de outubro, e Elizabeth continuava presa no laboratório dissecando o terceiro coração daquele semestre, enquanto Jack se sentava à sombra da árvore em que a garota de longos cabelos vermelhos que o fazia lembrar de sangue, costumava ficar.

          Jack gostava de sangue e gostou mais ainda do que leu entalhado na raiz. Ele descobriu que possuía outro coração além do seu e, foi pegando o seu canivete, conforme escurecia atrás do seu sorriso, que respondeu: "o dono do seu coração esteve aqui". Ainda sorrindo, se levantou e foi embora, agora com corações e sangue em seus pensamentos.

          Dias se passaram até que Elizabeth e Jack se sentaram à sombra daquele salgueiro. Os dois de cabeça baixa olharam para o entalhe cicatrizado, e então se entreolharam uma, duas, três vezes, até se encontrarem profundamente espelhados, esculpidos, no brilho reluzente dos olhos um do outro.

          Os grossos lábios dela se abriram, os olhos dele se escureceram, não foi preciso palavras, tudo o que tinha para ser dito já havia sido dito e estava gravado para sempre naquela árvore. Ambos se levantaram, os dedos frios e compridos de Jack buscaram a mão quente e delicada de Elizabeth, então juntos seguiram para a pequena, mas não menos confortável casa de Jack, mais conhecida como A Caixa de Vidro.

          Lá se amaram lentamente, sem palavras, com palavras, mas também fizeram sexo com pressa, como animais selvagens fazem, sexo no quarto, sexo na sala, em cima, embaixo, de fora para dentro e dentro para fora, sexo com risos, sexo com dor, sexo com lágrimas, sexo, sexo, sexo sem amor.

          Jack queria mais, precisava de mais, muito mais, ele queria tudo, absolutamente tudo. Jack queria uma provação, queria o seu suplício, ele queria sentir o que era dele nas mãos. E foi ali, ao lado da cama, que Elizabeth viu a lâmina reluzente sorrindo para ela, mas só quando Jack a pegou, que ela soube sobre qual poema ele falava que desejava esculpir.

          Elizabeth amava Jack, mas Jack não amava nada. 

          Nada além do sabor, do cheiro, do contraste vermelho e liquefeito que jorrava do pequeno órgão pulsante em suas mãos.



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