Estar na garagem do Harry era quase como estar em casa. Tenho certeza que passei quase metade da minha vida aqui, principalmente durante a faculdade.
Não fiquei nem um pouco surpresa ao perceber que Harry ainda não tinha chegado, e deixei escapar uma risada quando levantei o portão sem precisar da chave. Remus briga com ele por causa disso desde sempre, mas Sirius só vai aprender a trancar a garagem quando sua querida e preciosa moto, carinhosamente apelidada pelo marido de lata-velha, for roubada.
Dei uma rápida olhada em volta e comecei a abrir espaço pra montar a bateria, já que nem isso o incompetente do Harry conseguiu fazer. Meia hora depois de juntar toda aquela bagunça, terminei de empurrar o sofá e imediatamente me joguei nele, toda suada, arregaçando as mangas da minha blusa.
Felizmente, meu lugar favorito do sofá de couro vermelho desbotado ainda tinha a marca da minha bunda, então não precisei me esforçar muito para achar uma posição torta e confortável. Sentada aqui, com as roupas de sempre no sofá do Harry, me sentia quase como se tivesse voltado no tempo. Me fez lembrar da nossa primeira garrafa de bebida, virada em meia hora por dois adolescentes inconsequentes. Lembro que o Ron e a Hermione passaram um mês xingando a gente por todo o vômito; se eu me esforçasse, ainda conseguia sentir o cheiro horrível. Fred e George se matavam de rir toda vez que lembravam.
Mas Harry, apesar de me trazer diversas memórias boas, não estava aqui, o que me tirou do sério em menos de três segundos.
Esse crápula teve a ousadia de marcar o primeiro ensaio da banda—sem nome e sem vocalista principal—um dia depois de eu aceitar o convite pra simplesmente não aparecer? Canalha.
Assim que o pensamento passou pela minha mente, o portão se abriu como num passe de mágica.
—Eu sei!—disse Harry com as mãos no alto—Te tirei da cama no seu dia de folga e 'to muito atrasado pro' ensaio que eu mesmo marquei na minha casa, mas eu juro que valeu a pena!
Apenas arqueei a sobrancelha, sem precisar dizer nada. Ele me conhece o bastante para saber de todo o vocabulário que estou usando para xingá-lo mentalmente. Então, depois de um suspiro tenso, Harry puxou uma mulher loira para entrar.
—Ginny, essa é a Luna, a mulher que eu convidei pra' ser nossa vocalista.—disse, gesticulando enquanto Luna acenava e sorria levemente.—Luna, essa é a Ginny.
Luna me pareceu, à primeira vista, exótica. Seu cabelo loiro claro levemente enrolado ia até bem abaixo de sua cintura, o que me fez imaginar momentaneamente se ela não sentava nele sem querer às vezes. Seus brincos artesanais em formato de uvas se destacavam contra a cor de seus cabelos e balançavam conforme ela movia o corpo bem devagar de um lado para o outro. Tinha um corpo esguio e a pele leitosa, quase transparente. As roupas eram uma mistura de muitas cores que, apesar das combinações estranhas, ficavam bem nela. O casaco lilás longo junto à jardineira jeans e galochas amarelas a deixam com um ar juvenil e alegre, isso sem mencionar a meia-calça azul escura com bolinhas vermelhas.
Verdade seja dita, ela praticamente brilhava com energia gay. Ainda bem, porque ela estava entrando em uma banda com dois bissexuais que provavelmente gostariam tocar músicas relacionadas.
—Oi—eu disse sorrindo, gostando dela automaticamente. Então, olhei sugestivamente para o meu melhor amigo, incentivando-o a contar de onde surgiu essa loira bonita.
—Lembra daquele acampamento de verão que eu participei no ensino médio?—começou, abrindo um sorriso e gesticulando—Então, a Luna também participou e ela foi praticamente minha única amiga lá, mas a gente acabou perdendo o contato. Até que, por pura sorte e coincidência, eu literalmente trombei nela no supermercado enquanto comprava seus salgadinhos favoritos 'pra você me odiar um pouquinho menos quando eu aparecesse aqui sem um vocalista.—disse enquanto sorria falsamente e me estendia um pacote extra grande de Cheetos laranja—Aí eu lembrei que Luna tem uma voz do caralho, e uma coisa levou à outra.
Assenti levemente, abrindo o pacote de salgadinhos e sentindo a irritação ir embora quase imediatamente. A fome geralmente me deixava mal-humorada, e Harry conhecia bem meu péssimo hábito de não tomar café da manhã. Mesmo sabendo do perigo, ele não esperou um minuto pra enfiar a mão no pacote e tirar 500 Cheetos, o que me fez lhe dar um tapa com a mão suja.
Luna me encarava fixamente com a cabeça inclinada, formando uma cortina dourada com os cabelos. Seus olhos penetrantes fizeram eu me sentir meio estranha. Me esforcei para não corar. Acabei encarando de volta até que ela dissesse alguma coisa, dividida entre olhar para os seus brincos de uvas ou para seu nariz arrebitado.
—Gosto da cor do seu cabelo—disse, com uma voz tão doce e suave quanto mel, me fazendo sorrir e relaxar, e se virou para montar o microfone.
—Obrigada—respondi, dando um breve olhar de aprovação à Harry, que abriu um sorriso enorme e balançou freneticamente os dois polegares para cima—Eu gosto da cor dos seus olhos.
Luna voltou os olhos para mim, sorrindo, como se para me deixar ver aquele azul morno mais uma vez.
Então, lavei as mãos e nos sentamos para começar a decidir as coisas.
Depois de discutirmos um pouco, descobrimos que nossos gostos musicais eram parecidos, o que facilitou bastante na hora de montar uma setlist provisória. As diferenças de preferência a deixaram bem diversa, com ritmos e estilos variados. Infelizmente, a diversidade ia nos deixar sem baixista em algumas músicas, já que Luna tocaria o baixo e o teclado ocasionalmente. Mas ainda assim, seria o suficiente por enquanto.
Fred e George deixaram a próxima quinta-feira reservada para o nosso "show", e se tudo corresse bem, conseguiríamos pegar no tranco. Se ficássemos populares seria mais fácil achar um baixista fixo, afinal, a probabilidade de Harry trombar com um no supermercado de novo era quase zero.
—A gente podia testar a harmonia das vozes antes de pegar os instrumentos, pra decidir mais ou menos quem vai ter mais destaque em cada música—disse Harry me lançando um olhar afiado que dizia que eu não ia escapar dessa parte.
—Uma música aleatória?—perguntei.
—Sim, só 'pra aquecer e sintonizar mesmo. Igual na faculdade.
Não tinha necessidade alguma de ficar nervosa. Harry já conhece a minha voz, Luna é praticamente uma cantora autodidata. Eles não julgariam muito. Mas ainda assim, meus músculos se enrijeceram.
Luna logo começou, batendo os pés no chão e estalando os para cantar "Falling For U", e cacete. Eu e Harry auxiliamos no ritmo, cantando junto com ela às vezes, mas a voz dela simplesmente parecia não precisar de complemento algum além de um ocasional vocal no fundo. Luna cantava tão naturalmente quanto um pássaro, sem fazer esforço algum. Como se tivesse nascido para cantar.
Harry logo acelerou a batida, quebrando o meu encanto e fazendo com que eu e Luna o acompanhássemos em "Remember When", que foi uma das escolhidas da setlist. A harmonia entre as nossas vozes no refrão se encaixou perfeitamente. Sem deixar de bater os pés e estalar os dedos, escrevi rapidamente no script que Luna e eu acompanharíamos o Harry nessa música.
Ao longo da melodia, meu corpo foi relaxando. Nossas vozes em conjunto, ecoando nas paredes da garagem cada vez mais altas me deram o empurrão de confiança que eu precisava para realmente soltar a voz.
Ainda assim, só troquei a música quando o Harry, percebendo que eu não tomaria a iniciativa, mudou o ritmo para aquela batida popular típica que se encaixa em qualquer música.
Antes que eu percebesse, comecei a cantar "Heart Of Glass". De olhos fechados, deixando a minha voz variar entre o grave e o agudo, quase conseguia fingir que estava sozinha, profundamente envolvida pela música. Luna e Harry apenas mantiveram a batida, sem se juntarem a mim.
Ao final da música, antes que eu abrisse os olhos, Luna se aproximou e pegou o script e a caneta da minha mão, deixando seus dedos se arrastarem nos meus. Ela tinha cheiro de ameixa e os mesmos calos que todo musicista tem, mas a sensação da sua pele na minha era diferente.
Abri os olhos num susto, logo sentindo o meu rosto esquentar. Garotas me deixavam desconfortável às vezes. Tentei pensar em qualquer coisa nojenta para fazer a vermelhidão sumir depressa.
—Você devia cantar essa—ela disse, anotando a música e meu nome, antes mesmo de eu concordar.
Suspirei, massageando as têmporas e tentando me acalmar.
—Ei ei, sem pânico—falou Harry, se levantando e afagando meu ombro, indo em direção à bateria—É só uma música, é um bom começo. Luna ainda é a vocalista principal e a gente pode colocar a música no início da lista, aí você canta enquanto o bar ainda 'tá vazio.
—'Tá—concordei relutante, me levantando e pegando a guitarra. Seu peso no meu ombro era familiar e reconfortante, e tentei focar nisso ao invés de no fato de que iam me colocar pra cantar sozinha no palco. Eu estudei música por vários anos afinal, não era como se eu nunca tivesse feito aquilo antes.
Mas também não era como se eu ficasse confortável.
—'Bora começar com um rock mais de boa então? Acho que minha voz já aguenta um Green Day—disse Harry com um sorriso presunçoso.
Soltei uma risada nasalada e concordei.
—Você não mudou nada 'né—disse Luna me acompanhando na risada.
—Holiday?—perguntei.
—Holiday.
Depois de poucos instantes, a guitarra já tomava conta de mim.Vou deixar todas as músicas dos capítulos no final se alguém quiser escutar, ok? Por favor comentem, gosto de ouvir as opiniões.
Falling For U—Peachy!, mxmtoon
Remember When—Wallows
Heart Of Glass—Blondie
Holiday—Green Day
Ps: Eu particularmente gosto de imaginar a Luna com a voz da Clairo, a Ginny com a voz da Hayley Williams e o Harry com a voz do Billie Joe Armstrong, mas fiquem à vontade.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Os DiLua
Fanfiction"Tocar na frente de toda essa gente, junto às pessoas que eu amo. E dividir o microfone com a Luna. Eu não trocaria isso por nada." Os personagens não me pertencem Universo alternativo de Harry Potter Plágio é crime, se encontrar essa história em q...