Prólogo | Preto

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Eu criei a teoria de que Hélio era, na verdade, um alienígena morador de algum planeta distante que se perdeu da sua nave espacial e se pôs a vagar aleatoriamente pela Terra, talvez na companhia de algum bicho intergaláctico com antenas que eu nun...

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Eu criei a teoria de que Hélio era, na verdade, um alienígena morador de algum planeta distante que se perdeu da sua nave espacial e se pôs a vagar aleatoriamente pela Terra, talvez na companhia de algum bicho intergaláctico com antenas que eu nunca cheguei a ver.

Quando o conheci, eu era um adolescente de dezesseis anos com tendência incurável a gostar de músicas clássicas que costumavam me fazer chorar, vivia com meias de pares diferentes nos pés - por pura preguiça de procurar as combinações certas - e andava por aí feito uma lesma, com camisas tão grandes que caberiam facilmente em um panda muito gordo.

Os dias costumavam ser tremendamente parecidos desde quando me mudara para a cidade nova com minha mãe, há poucos meses, entre acordar às seis e pouca querendo jogar o despertador na privada e dar descarga, assisti-la fumar dois cigarros seguidos na varanda enquanto me distraía comendo algum cereal tão ruim que, paradoxalmente, era bom, e correr para me vestir tropeçando nos livros espalhados pelo chão do quarto, atrasado.

Depois das aulas infinitas, distraía-me com alguma coisa a tarde inteira para, em seguida, tentar dormir e o ciclo recomeçar.

Até que, subitamente, as coisas mudaram.

Foi em um daqueles dias que o mundo parece estar girando errado, quando o café que se costuma tomar pela manhã tem gosto de nuvem e os pássaros parecem cantar ao contrário.

Eu estava perto da faixada do colégio no início da manhã, escorregando os tênis manchados de tinta de forma quase bêbada pela calçada, absorto na brincadeira mental de não pisar nos riscos espalhados na superfície.

De repente, meus olhos voltados ao chão capturaram um par de tênis laranja, que imitava minha esquizofrenia.

Estacionei, ligeiramente confuso, pressionando os dedos contra a superfície áspera das alças da mochila, antes de inclinar o rosto para o lado e mirar as feições banhadas em diversão do garoto, modeladas pelo seu emaranhado de cachos escuros que terminavam no meio do seu pescoço e pareciam muito com uma floresta de caracóis.

- O que tá fazendo? - a pergunta me escapou.

Ele sacudiu os ombros.

- Construindo um avião com os pés.

Estreitei as sobrancelhas, tentando entender se estava sendo sarcástico ou falando a verdade.

Dava para traçar muitos desenhos com a ponta dos pés roçando o chão, afinal de contas. Eu vivia fazendo isso.

- Onde é a asa?

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