Depois que fomos ao jogo, passei a falar com meu padrinho todos os dias e em todos momentos que estávamos juntos. Falamos muito sobre futebol, do Cruzeiro, do Atlético Mineiro e em como ele ainda acreditava que o galo se classificaria para a Libertadores, sobre a copa daquele ano, 2008, no Japão e como concordávamos em discordar, eu acreditava no destaque do Luís Fabiano e ele no do Elano. Era para eu ter apostado com ele.
Mas o assunto que ele mais gostava de falar, era da Ana Luiza. Certa vez, ao me buscar no colégio, ele tinha deixado uma caixa de bombom no banco do carro. Entrei, peguei a caixa e sentei colocando-a no meu colo. Ao longo do trajeto, percebi ele me olhando de canto de olho, mas ignorei. Decidi pegar um pra mim e quando fui abrir a caixa, ele tirou a mão da marcha e deu um tapa na minha mão, em seguida disse:
- É para você abrir só quando estiver com a Ana.
Respondi com um sorriso desajeitado mas pude ver que ele também sorria e estava com brilho em seu olhar. Ele sempre perguntava o que eu sentia por ela. Toda vez eu entrava em devaneio:
- Eu amo seus cachos ao vento.
- Mas também amo eles presos em um rabo de cavalo.
- Gosto quando a gente sai e está sol.
- Mas quando está chovendo, queria estar com ela.
- Gosto dos raios solares batendo em seu rosto no pôr do sol.
- Mas quando está frio ela parece ainda mais bonita.
- Gosto da sua risada.
- Mas ela séria fica irresistível.
Nunca consegui falar sobre esses sentimentos para meu padrinho e, na verdade, nem para a Nalu naquela época.
Por mais que momentâneo, estar desta forma com meu padrinho era a forma de ter um apoio que jamais teria com meu pai. Nunca apoiou minhas amizades, minhas vontades e nunca nem perguntou se eu gostava de alguém. Esse não era o plano que ele tinha para mim. O seu maior pesadelo era me ver agarrado ao interior e não desbravar todas as coisas que ele gostaria de ter feito, era como se até para viagens ele tinha roteiro para mim. Meu padrinho não, ele estava me apoiando
Tudo o que é bom dura pouco, né?
Chegando perto de fazer quatro semanas, percebi um semblante sério no olhar do meu padrinho. Ele ficou dois ou três dias falando pouco, não ria e nem perguntava nada, até que chegou na quinta feira daquela semana. Assim que saí da escola, o carro dele estava parado de ré no portão de entrada. Ele estava ao lado do carro com pose de mordomo, abrindo a porta traseira para eu entrar. Naquele momento não estava apenas assustado, mas com medo do que iria vir. Entrei no carro e vi que tinha alguém na frente. Era meu pai.
- Como foi na escola hoje, filho? - perguntou em um tom difícil de entender naquela época.
- Foi tudo bem... Voltou de viagem hoje? Já acabaram a obra na fazenda? - respondi confuso
- Voltei hoje sim... Quanto a obra, estão finalizando, faltam apenas detalhes na fachada, mas já podemos retornar.
Olhei para o meu padrinho e ele permanecia daquela forma assustadora. Parecia que meu pai era sua kryptonita. Seus olhos estavam fincados na estrada, sua mão firme ao volante e parecia que nem estava ouvindo o que acontecia. Estava rígido.
- Seu padrinho me contou que vocês fizeram aquela antiga tradição do futebol, foi legal? - indagou me olhando de canto de olho.
Ao me ver concordando com a cabeça, sorriu e voltou à posição que estava antes. Era difícil entender meu pai naquela época. Ele me assustava e às vezes parecia que era de propósito e, vendo a reação esquisita do meu dindo, algo me dizia que não era só comigo.
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A Marca
Lãng mạnEssa é uma história que prova como excesso de controle e segredos podem determinar um destino sombrio para alguém, mesmo que não pudesse ter consentimento no momento do acordo. Jonas cresceu no interior de Minas Gerais sem a presença de sua mãe, que...