Um desabafo necessário sobre concursos literários e a banalização da crítica
Nos últimos concursos literários que participei, percebi um padrão perturbador nos feedbacks que venho recebendo. Palavras genéricas, observações mecânicas, uma repetição vazia de termos como "boa ambientação", "personagens com potencial", "precisa de mais ritmo", como se minhas obras fossem analisadas por um filtro automático, não por alguém com olhos e alma atentos ao texto. E comecei a desconfiar — com base no vocabulário, na estrutura e até nos erros recorrentes — que muitos desses “jurados” estão, na verdade, terceirizando suas análises para inteligências artificiais.
Isso é mais do que frustrante. É um desrespeito.
Não contra mim apenas, mas contra todos os escritores que se dedicam, que reescrevem capítulos até a exaustão. A crítica literária, quando bem feita, é uma ponte entre leitor e autor. Quando é substituída por uma IA genérica, essa ponte desmorona. Deixa de ser diálogo e vira relatório.
Se um jurado não está disposto a ler, interpretar, sentir e refletir, então talvez não devesse ocupar esse papel. Crítica não é sobre gerar um parágrafo automático com elogios tímidos e correções superficiais. Crítica é arte, é escuta ativa, é empatia intelectual. E é, acima de tudo, responsabilidade. Porque um bom feedback pode mudar uma carreira. Um raso, feito às pressas (ou por uma máquina), pode apenas desestimular quem está tentando crescer.
Não sou contra a IA. Eu mesmo uso para estudo, converso com ela. Mas existe uma diferença clara entre usar como ferramenta de apoio e usá-la como substituto da própria leitura. E se concursos literários começam a caminhar para esse segundo modelo, então estamos regredindo — não evoluindo.