Igor Escala

"No fim das contas, não existem países, nem sociedades, nem arranha-céus sem a mistura heterogênea de individualidades imutáveis e necessárias à própria comunidade".
          
          — Sete Bilhões de Coisas

“Aquela era uma pessoa, mas, acima de tudo, um indivíduo, tal qual seu observador secreto. E se este tinha suas próprias aspirações, ideias, sonhos, esquisitices e toda sorte de singularidades; se este era muito mais complexo do que uma generalização coletivista jamais poderia explicar; se este era um Universo inteiro à parte, comprimido sob a atmosfera de um grão microscópico, quando comparado à imensidão do que existe lá fora; aquele certamente era tudo isso e um pouco mais”.
          
          — Sete Bilhões de Coisas

“Quanto maior o número, melhor ele se sentia. Não exatamente pelo dinheiro. Não exatamente por coisa alguma, na verdade — ele não tinha muita certeza do que havia de tão especial naquela cifra, mas, de alguma forma, se permitia ser seduzido por ela”.
          
          — Sete Bilhões de Coisas

“O ônibus chegou. Era, provavelmente, o mais acabado em que ela já havia entrado. Imundo, com balaústres frouxos e bancos rasgados. O barulho que ele fazia ao andar era ensurdecedor; as janelas tremiam e batiam na carroceria. A cada quebra-molas, a roleta vermelha parecia quicar, também fazendo muito barulho. E no banco em frente, a inscrição em corretivo líquido “X9 VAI MORRE CV”, logo ao lado de “janiferzinha - chama 997543189” a distraiu, por um momento, do que estava escrevendo. Mas nada disso impediu a jovem escritora de terminar o que tinha começado no refeitório”.
          
          — Paz na Terra

“No âmago de Laframboise, a humilhação à qual acabara de ser submetida não mais encontrou explicações esdrúxulas para existir. Era o fim das justificativas. Se até poucos minutos atrás ainda tinha dentro de si algum resquício da crença de que merecia passar por aquilo, agora não tinha mais. Porque, agora, era uma questão de sobrevivência”.
          
          — Bela Arte

“Quanto tempo mais vai demorar até que, enfim, aprendamos a perceber amabilidade naquilo que chama menos a atenção, e, por vezes, prefere aparecer só de vez em quando? E quando, depois de percebermos o valor intrínseco das estrelas cadentes mais pequeninas e quase nada duradouras, teremos a chance de vê-las dispostas a nos oferecer uma nova oportunidade de admirar a sua beleza tão singela?”.
          
          — Paz na Terra

“Aquele sorrisinho bobo de criança provocava em Julien um sentimento que provava cada vez mais sua fixação pela inocência. Uma característica tão infame, mas que, para ela, significava uma raridade desejada. [...] Ver o sorriso daquela menina fazia com que Laframboise torcesse ainda mais para que o futuro dela não fosse em nada parecido com o que se transformou o seu presente”.
          
          — Bela Arte

“Foi a primeira vez em que eu tive contato direto com a morte — e com a mais dura forma daquela verdade universal que volta e meia aparece, seja naqueles pensamentos inúteis, os quais surgem quando se está sozinho tentando dormir, seja numa crise existencial: um dia a minha vida vai acabar. [...] Agora, aquele ser de capuz negro segurando uma foice parece estar te cutucando, dizendo: ‘é, amigo, agora você não pode fingir que eu não existo’. Foi isso que eu senti quando Malik disse que Liam estava morto. Lembrei-me mais uma vez de que não podia garantir que estaria vivo no dia seguinte”.
          
          — Bela Arte

“No entanto, ao olhar atentamente para o céu escuro, sem a interferência excessiva das luzes urbanas, dava pra ver que, em meio a tantas estrelas, alguns corpos ainda conseguiam o devido destaque. O esforço era notório. O brilho era curto, tímido. Mas suficiente”.
          
          — Paz na Terra