Cabelo azul

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Naquela exata data, a dois anos atrás, Andy saiu de casa. Ainda era fresca na memória a cara de decepção da mãe lhe entregando a mala, e o pai de pé na porta com um cinto na mão, a esperando impaciente desinfetar sua preciosa casa.

A dois anos. Em uma noite de domingo, Andy levou a namorada para conhecer os pais. Sim, não era um belo rapaz de boa família como os pais esperavam, mas era uma bela moça, e de boa família. O pai se levantou do sofá estarrecido, jogando para fora de sua casa aos gritos a moça que insistia em não soltar a mão da sua filha dissimulada. A mãe se perguntava aos prantos o que fez a Deus para merecer tal castigo, e então, cogitou que teria levado a filha pouquíssimas vezes a missa.

O fato era que Andy não era mais a filha querida do casal. Era apenas uma aberração, uma afronta a Deus e aos bons costumes. Onde já se viu namorar uma mulher, com tantos rapazes bonitos por aí ?

Na madrugada, Andy deixou seu lar, e foi até a casa da noiva. A garota estava trancada em seu quarto, mas pode ouvir sua promessa.

-Eu vou na frente, e arrumo um lugar pra gente ficar, aí venho te tirar daqui - os olhos marejados escondidos pela franja e os longos cabelos castanhos.

-Vai amor ... E cuidado ! - a moça cochichava da janela.

Os ônibus só iriam circular a partir das cinco da manhã, e ainda eram duas. Andy dormiu encolhida em um ponto de ônibus, e pela manhã, sumiu da pequena cidade.

Em Ilhanópolis conseguiu um aluguel barato no cortiço da quarta travessa. Logo fez amizade com Madá e Myla, e conseguiu um trabalho que desse para pagar seu fastfood de toda noite.

Decidida, retornou a cidade em busca de sua amada, mas logo desejou nem ter ido. O preconceito foi maior, e a moça de voz doce agora já não lhe falaria juras de amor ao pé do ouvido. A homofobia a matou, e ainda por cima impediu Andy de presenciar o velório da doce garota. Foi mandada embora ao som insistente de váias, e nunca mais voltou...

-Você enganou os quatro - disse de sorriso aberto para Loris que agora sugava a fumaça do cigarro que antes era seu.

-Ah, valeu - Marrí encarava Loris com um olhar divertido, mas permanecia empoleirada nos ombros de Andy.

-Quer ir pra casa com a gente ? - Andy tinha um brilho travesso nos olhos, e Marrí se esticou animada.

-Vem Loris ! Só vai ter da boa ! - Marrí passara muito tempo ao lado de Andy, tapando um buraco impossível de ser fechado.

-Ta, mas se der confusão ... - Loris riu se levantando.

As quatro saíram juntas do sofá rumo a escadaria. Loris estava tendo cuidado para não ser encontrada por outro quarteto nada gentil. No meio da muitão, as pessoas se empurrando em danças frenéticas,Loris foi jogada para Andy, que segurou sua mão e seguiu guiando ela dali para fora de maneira graciosa. Uma mão na cintura e a outra levantando o braço a fazendo girar em sua frente algumas vezes, e pronto, estavam do lado de fora.

-Pronto. .. Marrí vai pegar as coisas -Tatha dizia enquanto Andy se encostava na parede com o capuz do casaco sobre seu rosto.

-Não encara - A morena sussurrou nos ouvidos da outra que chegou a se assustar.

-Ela ? - Loris parecia realmente confusa.

-Ela fica assim antes do pó, acho que ela se lembra de alguma coisa ruim.

Coisas ruins eram o de menos. Andy só conseguia pensar em como acabaria pondo a perder a vida daquela menina do interior. Em como não deixou de ser uma pessoa ruim depois que sua amada morreu. E não estaria disposta a deixar seu pó, e não conseguir dormir a noite, pra ser bonitinha aos olhos dos outros de novo. Era peso demais pra se aguentar sem nenhuma ilusão.

-A gente não ia pra casa ? - Loris a tirou de seus devaneios.

-Hum ? - seus olhos pararam de procurar o chão, para encontrar os da garota a sua frente.

-A gente, você me chamou pra ir pra casa - ela cruza os braços com um leve tom de indignação.

-A gente vai ! Depois que eu fizer uma coisa - os lábios de Tathá se contraíram.

--Vai se drogar ...

-Esquenta a cabeça com isso não, já fui tão doida pra casa e acertei o caminho.

Marrí voltou com um papel dobrado, e Andy o abriu fazendo uma carreira com um pouco de pó no pulso de Tathá.

-A próxima é você ! - seu dedo aponta para Loris que cruza os braços e observa.

Com um dedo no lado esquerdo do nariz, o direito sugou tudo uma vez, fazendo Andy cair para trás nos braços de Marrí.

-Tua vez ! - Tathá ria descontrolada, e Loris chegou a ir até ela, mas sei pulso foi pego.

Ela foi pega por uma mão masculina e forte, que se concentrava em mantê-la no mesmo lugar, longe de perigos.

-Miguel ... Sai do pé -Loris puxa braço, mas ele acaba segurando sua cintura, a tirando do chão.

-Marcos, pega a doida, e vocês duas vem logo, tá na hora da polícia fazer a batida.

O corpo inerte de Andy foi jogado nós ombros de Marcos, e Loris ressentida com Miguel preferiu manter três garotas de distância.

Eles saíram da boate ouvindo a gritaria e som das sirenes ao fundo. Madá entrou em uma esquina que revelou um beco escuro, e uma pequena porta ao fundo. Era um galpão secreto. E por horas, os manteve escondidos da polícia lá fora. Todo mundo ali dentro já estava complicado demais pra cair nas mãos da "Justiça"

-Vamo jogar alguma coisa ? - Miguel estava animado andando de um lado a outro.

-Que tal o cala boca ? Tu ia gostar de jogar - Loris pareceu impaciente, e quando Miguel fechou a mão para ir em sua direção, Myla pulou no meio.

-A maconheira acordou !

Todos de reuniram ao redor de Andy que piscou várias vezes ao abrir os olhos.

-Eu morri ? - ela perguntou ao se sentar.

-O que a polícia tá procurando? Eles nunca vão na boate - Marcos ficou de joelhos ao lado dela.

-E vão bater o bairro todo, até acharem quem sabe como a droga entra na região. Querem saber quem é o fornecedor e onde ele compra -Andy voltou a se aninhar no chão.

-Então as três tem o dedo podre no meio ! - Madá coloca as mãos na cintura.

-É só a gente se esconder no favelão, e já era - Marrí cruzou os braços.

-Então é isso, sete garotas e dois retardados fugindo da polícia - Myla amarrava os cabelos impaciente.

-Então bora logo porra ! Se uma for pro buraco, as seis também vão

Loris parecia destemida, e assim como Andy não tinha medo de nada

𝑷𝒓𝒐𝒊𝒃𝒊𝒅𝒂𝒔Onde histórias criam vida. Descubra agora