Será que todo mundo passa por situações loucas na vida? Ou pelo menos uma vez sequer? Eu passei por algumas bem doidas, mas nenhuma tão absurda quanto a que vou te contar agora. Nunca contei isso pra ninguém, nunca tive coragem. Agora não me importo mais.
Não lembro quando aconteceu exatamente, mas sei que tinha acabado a escola e estava prestando vestibular pra entrar numa Universidade e eu não tinha me assumido ainda. Tinha talvez 18, 20, 21 anos. E como naquela época as coisas eram mais difíceis, eu fazia de tudo pra esconder minha sexualidade, até namorava garota e comia elas também. Mas não tinha tido relação nenhuma com homem, apesar do desejo louco que sentia.
Então, você sabe que o governo, às vezes, faz censo, né? Quer saber quantas pessoas tem no país, quantas moram em cada casa, no que trabalham, quanto ganham, se tem tv, geladeira e até banheiro.
Eu consegui uma indicação e fui participar disso. Era um trabalho fácil, pois tinha só que ir nas casas das pessoas e perguntar a elas. O ruim era ter que andar muito, pois tínhamos uma meta por dia ou levaríamos uma bronca.
Eu não era um dos melhores, mas me esforçava pra cumprir sempre a minha meta, nem sempre dava. O pior de tudo era convencer as pessoas a abrirem suas portas pra mim, inventavam mil desculpas e eu tentava convencer. Nem sempre dava certo e assim um outro recenseador ficava responsável por aquela residência.
Não lembro também se isso aconteceu no meio ou perto do fim, mas sei que era um sábado. Fui mandado pra um prédio enorme, centenas de apartamentos no centro da cidade. Prédio era mais difícil, as pessoas eram mais desconfiadas ainda, achavam que eu podia ser um ladrão, mesmo que todo mundo do prédio tivesse sido avisado com antecedência pelo síndico e que todos os jornais falassem disso o tempo todo. Sem falar que, por muitas vezes, todo mundo no apartamento trabalhava o dia inteiro e não ficava ninguém em casa. E o pior é que tínhamos que passar do nosso horário pra cobrir esses casos.
Enfim...um dia eu bati numa porta e uma voz lá de dentro perguntou quem era. Achei que era uma voz de alguém que estava com muita raiva e, por isso, tive muita vontade de ir embora e voltar depois ou, até, deixar pra um colega, mas, por algum motivo, decidi continuar:
- Sou do Censo, senhor. Estou aqui para fazer umas perguntas. O senhor deve ter visto nos jornais.
Ouvi o barulho da fechadura abrindo e vi alguém abrindo só um pouco a porta e colocando apenas a cabeça para fora. Era um homem branco, careca, com um grosso bigode e uma cara de poucos amigos.
- Você tem algum documento provando que é mesmo do governo?
- Sim, senhor! _ respondi com educação e jovialidade, como fomos orientados a fazer sempre, independente da situação, e mostrei minha documentação.
- Bom, é que eu tava dormindo, trabalho durante a noite e durmo essa hora. A casa tá uma bagunça e nem tô vestido pra receber visitas. Será que você não pode voltar outra hora?
Desculpas, desculpas, desculpas! Eu tava cansado de ouvir essas desculpas, mas, como fui orientado, sempre tinha que insistir, tentar fazer a pesquisa; não importasse se a casa da pessoa tivesse uma bagunça, se a pessoa tivesse toda fedida ou o que quer que fosse. Tinha que conseguir! Bom, só não podia se estivesse bêbada ou drogada.
- Senhor, não se preocupe. Vai ser rápido, uns 20 minutos, no máximo. Não precisa se arrumar, pode ficar como o senhor está, afinal somos homens, né? E se não tiver uma cadeira, não tem problema, eu sento no chão mesmo ou fico de pé! O importante é fazermos a pesquisa:
- Mas é só você mesmo? Não tem mais ninguém aí?
- Não, senhor, só eu mesmo.
Ele abriu a porta do jeito que estava e me deixou passar. Ele ficou atrás da porta, provavelmente para que ninguém que passasse lá fora visse como ele estava vestido. Eu entrei de cabeça baixa, tentando não olhar pra nada. Ouviu ele mandar eu me sentar no sofá e fiz isso. Já sentado, me concentrei em fazer tudo o mais rápido possível pra não irritar ele: abri minha mochila, peguei minha pasta, separei as folhas necessárias, peguei uma caneta e, tudo pronto, olhei para ele pra começar as perguntas.
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Caroços
Short StoryEsses são contos gays com conteúdo adulto, mas o que se destaca é a eterna inconstância entre o desejo e o medo. Quando saber se o desejo está sendo correspondido? Quando saber se é seguro flertar? Quando saber? E se não for, o que poderá acontecer?