A dona do cabelo laranja

Prólogo

Como saber quando se está morta? Existe uma fórmula matemática que defina a nossa existência na Terra? Existe um marco zero ao qual voltamos após cumprir nossa jornada nesse plano? Como se estivéssemos predestinados a um ciclo que, após ser completado, simplesmente se finda. E mesmo que seja interrompido no meio de seu curso, ele somente retorna ao ponto inicial, gerando um resultado incompleto, imperfeito.

Alguns de nós devem vir a Terra predestinados a realizar grandes feitos. Salvar idosos de acidentes, escrever livros que inspiram as pessoas a serem melhores ou adotar uma criança abandonada. E outros, como eu, devem simplesmente passar pela vida sem qualquer tipo de contribuição.

Essencialmente vegetando.

Esperando pelo momento perfeito que mudará o rumo das coisas e dará, enfim, sentido para suas vidas. Aguardando encontrar um sinal que mostrará que é a partir dali que tudo vai mudar, que as coisas farão sentido. Que precisam ter a tal pessoa certa para então começar a amar, que aguardam pelo emprego bom para então se dedicar, que esperam ter tudo para começar a dar um pouco.

O problema é que estas mesmas pessoas esperam tanto por este momento que não percebem muitos outros que as mudariam completamente e dariam muito mais sentido a sua existência. Coisas cotidianas, que passam por nossas vidas sem que nem ao menos percebêssemos. Momentos, pessoas, situações, que não recebem nem “olá” e já seguem sem ouvir “adeus”.

Poderia jurar que pensei tudo isso em cerca de três segundos.

E, então, o desfibrilador fez efeito e nesse exato momento, não sei bem como, eu sabia que estava viva. Que iria sobreviver por mais algum tempo... anos, meses, dias, horas... Não importava. Meu espírito sabia que viveria, no mínimo por mais alguns segundos, e que talvez tivesse, enfim, uma segunda chance para dar sentido a minha vida.