Memories • hyunin

Um brinde

Amadurecer te leva a fazer coisas malucas.

Houve um tempo em que Hyunjin não se via subordinado a essa vida de adulto. Contas, casa, faculdade, emprego, remédios, pessoas e é claro o famigerado álcool. O que é o adulto senão um poço de responsabilidades? E o fracasso em cumprir todas elas. Pra ser sincero com vocês, Hyunjin não se lembrava de sua vida antes disso.

Adentrou o estabelecimento como se estivesse perambulando por sua própria casa, familiarizado com o local. A falta de pessoas no lugar denunciava que o jovem Hwang havia chegado cedo, o que para ele não era nada ruim, visto que era típico de Hyunjin estar sempre só.

Mas o que diabos fazia uma pessoa sozinha em uma boate?

Hyunjin conhecia a Devassa como a palma de sua mão. Quando era adolescente falsificava identidades só para ter acesso a locais que exigiam maior idade. Quando completou 18 anos seu primeiro emprego foi como Bar Man nessa mesma boate.

Seu estilo não mudara muito, era o mesmo Hwang que vestia camisetas pretas com estampa lisa, calças jeans debotadas e apertadas nas coxas e um Polo preto casual nos pés. Seu grande diferencial era que agora, seus cabelos estavam compridos dando mais destaque ao seu novo rosto de homem. Suas orelhas agora pesavam devido ao par de brinco as enfeitavam.

Andou em passos lentos observando o local que para a sua frustração continuava o mesmo de semana passada e o mesmo de quando tinha 18 anos. Parou em frente ao bar distraído com as luzes roxas que percorriam o led de uma ponta a outra do balcão e desciam em forma de cachoeira no visor atrás do barista.

— Jinnie! Eu estava pensando em você agora mesmo. – revelou o barista todo entusiasmado quando viu Hyunjin se aproximar.

— E aí, jisung. – Hyunjin cumprimentou sem o menor interesse no que o garoto loiro que usava um avental listrado tinha para falar.

Jisung era ágil, sem que Hyunjin pedisse já havia enchido um copinho de uísque e o arrastado pela mesa até que estivesse ao alcance do Hwang, que o olhou de uma forma duvidosa, mas logo cedeu a sua vontade. Num único gole, o álcool desceu queimando garganta abaixo, parecia que seu cérebro ia explodir e o seu estômago necrosar. Hyunjin sempre fora fraco para bebidas e as detestava, mas nessa noite ele precisava dos efeitos do álcool correndo em suas veias, porque só então conseguiria o que veio buscar.

— Noite difícil? – Jisung especulava enquanto enchia mais um copo para o Hwang.

Hyunjin se sentia quente. Havia um bigode de sudorese bem abaixo de seu nariz, suas mãos estavam frias.

A boate já estava cheia de gente, mas Hyunjin não era capaz de distinguir nenhum rosto daquele lugar, nem mesmo o de Jisung. Quando olhou ao seu redor percebeu que aquelas pessoas se misturavam entre as luzes incandescentes. Eram todos borrões coloridos. Exceto ele.

Ah, Hyunjin reconheceria aquele garoto até se estivesse dopado. Os cabelos ruivos levemente franzidos, o sobretudo preto que o vestia tão bem, o balanço de seu corpo em harmonia com a música que tocava. Jeongin estava deslumbrante nesta noite.

A essa altura a boate era um misto de fragrâncias; o cheiro forte dos perfumes que as pessoas usavam, doce, amadeirado, azedo, ácido; o aroma das bebidas que Jisung preparava; o suor das pessoas que dançavam por ali.

Em meio a tantos cheiros Hyunjin fechou os olhos quando conseguiu distinguir a essência de Jeongin. Tuberose, flor de lótus e sândalo. Esse era o aroma Floratta do jovem Yang.

Quanto mais sentia, mais intenso ficava. Era como se estivesse embarcando para outra realidade.

Ah, o álcool...

— Você pode apertar a minha cintura se quiser, jinnie.

Quando Hwang finalmente abriu os olhos, estava a poucos centímetros de Jeongin. Seus corpos estavam em movimento, sua frequência cardíaca estava acelerada, e seus olhos perdidos encarando o rosto tão jovem a sua frente.

Estavam dançando. Havia outras pessoas na boate. Mas naquele momento, naquele cubículo que ocupavam só existia duas pessoas; Hyunjin e Jeongin.

Hyunjin não podia acreditar. Seus olhos brilharam de 39 formas diferentes ao contemplar a face do Yang tão de perto. Era tão real, Jeongin continuava o mesmo ninfeto de sempre. Até o seu jeito de dançar era o mesmo. Havia se passado tanto tempo e seu rosto não ganhara nenhuma linha de expressão.

Algo estava errado.

Estarem ali, juntos, dançando era real demais. E a cada movimento, cada vez que a coxa de Jeongin esbarrava na de Hyunjin, a cada vez que sua mão deslizava pelo corpo do mais novo, a cada suspiro que Jeongin dava quando perdia o fôlego tentando sussurrar a letra da música no ouvido do Hwang. Cada momento fazia Hyunjin se sentir mais imerso.

— Eu não tenho coragem, innie. – Hyunjin fixou seu olhar perdido no sorriso acolhedor que o Yang o ofereceu. — Mas eu sei que um dia eu vou conseguir.

Jeongin o olhou com ternura. Lágrimas começaram a encharcar seu rosto descendo como cachoeiras por suas bochechas. O jovem Yang ainda tinha em seu rosto o semblante do sorriso que dera segundos atrás. Seu sorriso evidenciava um pedido de desculpas não verbalizado.

Hyunjin sentiu o cheiro das flores se intensificar novamente.

Dessa vez era forte demais. Tão forte que não pode conter a sensação de que seu estômago estava embrulhando e as pessoas girando ao seu redor. Hyunjin sentiu seus joelhos se chocarem contra o chão levando as mãos até a cabeça numa tentativa de se proteger. E mesmo após fechar seus olhos ainda enxergava as luzes piscando junto ao sorriso triste de Jeongin.

Estava perdido. Sempre acabava assim, eles se encontravam e Hyunjin se perdia.

Quando Hyunjin tornou a abrir olhos, deu de cara com outro copinho de uísque o esperando e viu Jisung preparar duas canecas de chopp ao mesmo tempo. Suspirou olhando para a multidão, apesar de ainda não conseguir distinguir os rostos, ele sabia que Jeongin não estava mais ali.

Porque as bebidas traziam de volta todas as lembranças, e as lembranças traziam de volta Yang Jeongin.

—  Um brinde ao desejo que você estivesse aqui. Mas não está. – Hyunjin ergueu seu copinho de uísque a altura da cabeça engolindo o líquido fígado a dentro.

Fim.