dor.

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·17/02/2021·

18:55

Eu estava lá, mas não estava. As orbes vazias correndo junto dos carros. Acho que por um momento eu desejei ter coragem pra me jogar na frente deles e acabar com tudo isso. Mas... Isso o quê? Dor? Ódio? Amor? Angústia?
Tristeza?
Sinceramente, nem eu sei.
Meu corpo estava presente, mas meus pensamentos vagavam, e eu não podia controlá-los. As poucas lágrimas que mais cedo haviam escapado dos olhos verdes e cansados não haviam sido suficientes para que todos os sentimentos extravazassem e eu pudesse ser leve de novo. Eu não almocei, nem comi nada de tarde, porque eu não tinha vontade de fazer nada; meu desejo era poder deitar na minha cama e dormir. Dormir e acordar um dia antes. Queria que as últimas 24 horas fossem simplesmente apagadas da história. Da minha história.

- Oi! Tudo bem? - Perguntou meu pai, já tomando uma mala da minha mão, para me ajudar com a bagagem.
- tô bem - menti, e me esforcei para perguntar: - e tu?
- Tô bem, estamos todos bem - disse, dando um sorrisão forçado como ele sempre faz. Com "todos" se referia a ele e minha minha madrasta, que naquele exato momento esperava ele ir me buscar na rodoviária.

Quando esperávamos o sinal fechar para poder atravessar a rua, senti que eu realmente não estava ali. Eu desejava não estar. Eu queria que nada daquilo estivesse acontecendo. Minhas pernas se movimentam, sem que eu ordene que elas façam isso. Desde a madrugada de hoje, eu não vivo, eu existo.
Porque eu vivia por ela.
Eu nem quero morrer. Mas não quero viver.
Acho que meu cérebro inconscientemente me privou de sentir emoções negativas intensas. Eu não consigo chorar muito, e me sinto mal por isso, queria ser uma pessoa mais emotiva e compassiva.
Eu estou me sentindo muito mal. Uma dor inexplicável, mas não física, uma dor que nenhum remédio pode aliviar. "É dor no coração".
Acho estranha a metáfora "dor no coração", porque, na verdade, é dor psicólogica, não tem nada a ver com o músculo cardíaco.
Merda.
As coisas tinham saído do meu controle. E nada seria a mesma coisa, mas eu não queria acreditar. Só conseguia pensar em como as coisas tinham virado de cabeça pra baixo, assim, num estalar de dedos.
Queria nunca ter dito "podemos conversar, sim".

20:15

Depois de quase doze horas sem me alimentar de nada, estou me obrigando a comer um iogurte, que meu pai comprou pra mim.
Ele chegou do mercado com minha madrasta, e disse que tinha comprado o iogurte que eu pedi (que, sendo honesta, eu só falei que queria pra poder responder algo quando ele perguntou: "quer alguma coisa do mercado?"). Fui pegar o iogurte e ele disse: "por que tu não dá um sorriso?"
Oras.
Eu não estou sorrindo porque não estou feliz. Eu não estou nem 1% feliz. Na verdade, nem quando eu estou feliz eu não fico sorrindo por aí.
Bem, ela me arrancava muitos sorrisos.
Depois dele ter dito essas palavras, precisei me desligar dos meus pensamentos por um milésimo de segundo e sorrir. Deus, acho que foi um dos sorrisos mais forçados que eu já expressei na vida.

Débora, lembra da música do Shawn Mendes que eu falei que me deixava triste, e quando tu perguntou o porquê, eu ignorei a pergunta?

Mesmo tendo a certeza mais absoluta que vc lembra, vou deixar aqui um trecho da música:

I thought that I've been hurt before
But no one's ever left me quite this sore
Your words cut deeper than a knife
Now I need someone to breathe me back to life
Got a feeling that I'm going under
But I know that I'll make it out alive
If I quit calling you my lover
Move on
You watch me bleed until I can't breathe
I'm shaking, falling onto my knees
And now that I'm without your kisses
I'll be needing stitches
[...]

Bom, agora vc vai saber o porquê dela me deixar triste, por mais que eu imagine que tu já tenha uma ideia. Me deixa triste porque eu sabia que seria exatamente assim que eu me sentiria quando tudo isso acabasse.
E eu estava certa, porque agora eu estou afundando, tremendo e caindo sobre meus joelhos, agora eu preciso de pontos.
Se eu respondesse quando tu perguntou, aquilo se tornaria real. A gente realmente teria as chances de acabar. Ai, como eu fui boba. Tu estava confusa e nós duas pagamos por isso.
Tu ainda é importante. É muito. E se você me mandasse mensagem agora mesmo dizendo que se arrependeu de ter dito tudo aquilo, eu voltaria. Voltaria correndo.
De verdade.
Porque eu ainda te amo.
Como eu sempre digo, eu não me importo se você não me ama o bastante, se você me quer longe, se diz que eu "sou boa demais" pra você, que tu "não merece". Eu só sei que hoje, dia 17/02/2021, eu te amo.
Com cada batida do meu coração.
Também sinto sua falta.

·18/02/202

8:30

Eu não escrevi isso pra que tu ficasse se sentindo culpada, nem nada disso. Eu só escrevi isso porque eu acho que vc não vai responder as minhas mensagens, e eu não queria ficar mandando pra ser ignorada.
Débora, que merda, tu me tem, sabe disso, né?
Também escrevi porque eu preciso colocar pra fora o que estou sentindo.
Eu preciso falar contigo, cara.
Eu preciso.
Se vc não quer, faça isso por mim.
Pode parecer que eu sou egoísta, mas eu não sou. Eu apenas estou muito confusa, tipo, demais! Não entendi.

Nem sei se vc vai ler isso.
Mas espero que leia.

Cartas Para DéboraOnde histórias criam vida. Descubra agora