Morte e Vida Severina (1954-1955)

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O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI

— O meu nome é Severino, não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria;

como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria

do finado Zacarias.

Mas isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria.

Como então dizer quem fala ora a Vossas Senhorias?

Vejamos: é o Severino da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela, limites da Paraíba.

Mas isso ainda diz pouco:

se ao menos mais cinco havia com nome de Severino

filhos de tantas Marias mulheres de outros tantos, já finados, Zacarias, vivendo na mesma serra

magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida:

na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido

sobre as mesmas pernas finas,

e iguais também porque o sangue que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina:

que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta,


de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença

é que a morte severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida). Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina:

a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima, a de tentar despertar

terra sempre mais extinta, a de querer arrancar algum roçado da cinza.

Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias

e melhor possam seguir a história de minha vida, passo a ser o Severino

que em vossa presença emigra.

Morte e Vida SeverinaOnde histórias criam vida. Descubra agora