A vista da parte mais alta e afastada da escola não era tão surpreendente para quem quer que estivesse por perto, mas para mim, era como estar preso num transe inigualável, os respingos encharcavam meu moletom escuro e a temperatura caindo não era incômodo algum, pelo contrário, me mantinha longe de todo e qualquer pensamento invasivo. A água caía tão desgovernada quantas minhas emoções, ela sempre pareceu lavar meus problemas e junto desta, a infelicidade presa em minhas orbes tão opacas. Sinceramente, existiu um momento em que elas tinham vida?
A pior parte da vulnerabilidade é quando não se sabe ao certo de onde ela vem, se eu tivesse pelo menos uma dica, poderia encontrar outra válvula de escape que não me destruísse por inteiro. Não passaria tanto tempo escondido por trás da máscara de alguém que não ligava para nada e ao perceber a imensidão da neutralidade, magicamente desaba por se encontrar desamparado. Já mencionei que tudo isso é confuso pra caralho? Deveria ser simples de se entender, somente é algo que gira ao seu redor e leva toda e qualquer fonte de inspiração, que se esvai com a fumaça de cada tragada dolorosa e viçosa. Sua vida é um loop e nem consegue ter forças para segurar o tempo. Qual seria o nome disso? Com certeza era mais profundo que melancolia.
Agora que paro para pensar, enquanto aos poucos sinto meu corpo amolecer naquela bancada, percebo que a chuva não tem ajudado tanto, na verdade eu consegui me sentir mais sozinho e vazio do que em qualquer outro momento da minha vida. Mesmo com o misturar das gotículas preenchendo meu rosto cansado e o cigarro em meus lábios, liberando nicotina no meu sangue e fazendo o trabalho de relaxar qualquer nervo meu, aquela horrível sensação não passava.
Entretanto, antes que eu pudesse finalmente desistir de tudo e só gritar aos quatro ventos ── são quatro? ── que odiava aquela merda toda, uma sombra foi posta acima de si e a água dolorosa parou de tentar me apagar. Surgiu com esta, o tão conhecido rapaz com cabelos de duas cores ── pintados recentemente por escolha minha ──, amarrados em um rabo de cavalo baixo, provavelmente feito na pressa, além dos óculos de armação dourada que escorregava por seu rosto sempre que ele deixava a cabeça pesar para qualquer lado, carregava consigo uma sombrinha que impedia a chuva de alcançar qualquer um dos dois. Na outra mão, seu típico copo de café.
“Vai ficar doente desse jeito. Achei que estaria em aula agora.”
“Você não parece ser do tipo que falta as aulas também. Não deveria ter me conhecido.”
“Acha que sou tão influenciável assim?” apenas dei de ombros em resposta. “Não é muito delicado.”
“Me conhece há duas semanas e descobriu isso hoje?” a resposta foi a mesma que a minha. “Ainda não acredito que fez mesmo isso.” uma expressão de dúvida se instalou no rosto dele que ainda segurava o guarda-chuva.. “Seu cabelo. Pintou mesmo de duas cores, como eu falei.”
“Não foi uma ideia ruim pra falar a verdade.” ele sorriu pequeno e se sentou ao lado, aproximando-se o suficiente para que nenhum de nós se molhasse. “O que estava fazendo?”
“Só acho que quando canso de tudo, a chuva que me mantém um pouco mais tranquilo. Ainda não descobri os segredos que me atormentam tanto e apesar da nuvem cercando cada parte minha. A tempestade me deixa.. São.”
“É bem profundo. Acho que tenho algo parecido. As estrelas contam? Uma noite em que não há nuvem alguma no céu e nem minha própria neblina apaga isso que elas me trazem. O momento em que eu fecho os olhos e a brisa me faz viajar pra cada canto, posso estar em todo lugar que quiser. Desde o canto mais congelante, até o mais quente e nada me incomoda, porque sou só eu, apagando meus próprios medos pra conseguir viver. Ou ao menos existir.”
“Alguém já viajou com você? Pras estrelas? É legal estar lá sozinho? Nunca sentiu vontade de ter alguém que segurasse sua mão e dissesse que nem tudo estava perdido?”
“Alguém já esteve são na tempestade com você?”
“Seria legal se você fosse o primeiro.”
“Enquanto isso, cigarros e café?”
“E uma boa chuva.” complementou.
Era reconfortante. Tê-lo por perto. Nem tudo parecia estar despedaçado. Nem tudo estava em preto e branco. Uma pontada de vermelho surgia entre o brilho das estrelas e a tempestade aconchegante.
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❛ʾ─ i'm already yours ໑
Fanfiction"Eu nunca fui um amante por arte, entende? Talvez tudo seja somente uma grande baboseira e eu nunca conheça algo que me ajude a entender." "Acho que arte é algo bem mais complexo." O olhar dele era guiado ao meu. "Acredito que seja maior do que qual...