careless addict.

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"E sobre o seu quadro?"

Estávamos sentados em uma rede na varanda da minha casa ── não sei em que momento me senti confortável o suficiente para permitir a visita de Shoto. Mas bem, era Shoto. Por isso, não teria mais problema, era o que minha mente gritava. De qualquer forma, não há muito sobre o que dizer quanto ao que deveria ser meu "lar". Não era nada espaçosa, também não chegava a ser sufocante, muito menos era o local em que eu gostava de morar.

"Ficou tão interessado assim?" apontei para o quadro atrás dele, enfurnado em algumas caixas que por pura preguiça não havia as retirado do caminho.

"Claro que sim. É arte. Você também deveria estar interessado. Afinal, você é o artista por trás dela."

Preferi não protestar, apesar de não concordar nem um pouco. Ao invés disso, estendi minha mão até o maço de cigarros ao lado, não demorando a acender, tragar e liberar a fumaça até o horizonte, por puro costume, longe do alcance de outra pessoa. Pela primeira vez, não quis ir evaporar e passear até um local distante.

Percebi de soslaio o olhar que o outro dedicava à mim, conseguia ler facilmente.

"'Tá com aquela cara de novo."

"É a única que tenho..."

"Jura? É aquela cara de quem quer dizer algo, mas tem medo de soar rude. Sabe que não me ofendo fácil, não com você."

"É só que... Você tem muitos vícios né?"

"Não é nada comparado ao que aconteceu comigo recentemente." Shoto tombou a cabeça, como um gato. ""Eu encontrei um que parece acabar comigo, mais do que os outros."

"Fico com medo de perguntar." ele se encolheu na rede, consequemente, ao meu lado.

"Sorrir com você."

"Não costumo fazer os outros sorrirem."

"Estamos quites então. Não costumo ser como os outros."

Ele desviou o olhar e se levantou com cuidado, uma ponta de preocupação surgiu no meu sorriso que se desmanchou, não sabia ponderar as palavras e talvez tenha sido incoveniente. Antes que eu pudesse alimentar mais resquícios daquela sensação, que estava transbordando em um calafrio, ele estendeu sua mão pra mim.

Dediquei à ele uma feição meio confusa.

"É... A minha música favorita." ele apontou para a caixinha de música, estava tão concentrado que nem me lembrava de termos uma trilha sonora.

"Oh. É a sua cara." comentei, apagando meu cigarro no cinzeiro ao lado e levantei, o encarando com cuidado. Ri baixinho e segurei sua mão. "O que eu faço?"

"Não sabe dançar?"

"Não gosto dessas breguices."

"Obrigado." não havia tom de magoa na voz dele, pelo contrário, este segurava um riso baixo.

Não esperou que eu protestasse ou algo do tipo, apenas segurou minhas mãos com toda calma e cuidado do mundo, passando os polegares pelas costas dela, me fazendo rir pelo gesto que nem ele percebeu e as guiou na mesma direção. As duas pousaram na cintura alheia, enquanto as dele foram até meu pescoço, o entrelaçando.

"Bem sugestivo." comentei com uma das sobrancelhas arqueadas e o Todoroki beliscou meu ombro. "Era só brincadeira! Quem não deve, não teme, certo? "

"Você é inacreditável."

"E extraordinário."

"É. Extraordinário."

Um momento de silêncio perdurou por longos, mas nada tortuosos segundos, que me permitiram analisar cada detalhe do meio ruivo com mais atenção, também dedilhando a cintura dele com receio, recebendo o carinho no rosto ── que ele começou em algum momento de distração minha ── de bom grado. A música pareceu mais alta e a luz tinha menos intensidade, mesmo assim, eu conseguia ler cada expressão de Shoto, eu conseguia viajar em seus olhos intensamente, apreciando o bicolor nas íris que mostrava uma tela perfeita, apesar da cor perdida em uma dessas, eu conseguia ver a perfeição se formando por completo. Não havia nada naquele cara que não fosse de tirar o fôlego. Não havia nada nele que não me fizesse sorrir e me sentir orgulhoso.

Nossos corpos começaram a se mover lentamente, mesmo que nossas mentes estivessem ocupadas demais em anotar cada detalhe melodioso um do outro, deixando nos afogar em êxtase.

Soltei a cintura dele, também retirando os braços dele ao meu redor e desliguei a luz atrás de mim, só o que iluminava o recinto agora eram as estrelas do lado de fora, a música estava em repetindo pela segunda ou terceira vez e não era incômodo algum, principalmente quando meu coração batia desgovernado. Assim, me agachei e fui até o canto, onde estavam os lanches e tirei de lá uma coroa que a lanchonete havia entregado.

"Hanta."

"Sim?"

"O que 'tá aprontando?"

"Fecha os olhos." ele fez o que pedi ainda receoso e eu coloquei a coroa em sua cabeça, ela ainda estava meio torta, mas era a intenção. "Ficou boa em você. Você já tem essa aura de príncipe."

"Foi sua forma de me elogiar sem ser tão direto por medo?"

"Desde quando nos analisamos tanto assim?"

"Não faço ideia." ele estendeu a mão na minha direção e eu entrelacei meus dedos aos dele, levantando. "Mas obrigado. De verdade."

"Por te coroar?"

"Por dançar comigo."

"Significa que posso te puxar pra outra dança? Gostei desse lance aí."

"Você é tão brega. E extraordinário."

O abracei pelas costas e movi meu corpo ao dele, apoiando o rosto em seu ombro, deixando a brisa nos abraçar e a luz da lua acalentar a nossa melancolia.

"Hanta?"

"Eu mesmo."

"Achei meu maior vício."

"Dançar? É uma boa."

"Você."

Eu sorri. E encontrei no abraço dele algo além de conforto. Eu encontrei ele. E toda a minha paz foi restaurada ao som de um sussurro cuidadoso.

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⏰ Última atualização: Feb 28, 2021 ⏰

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