Imprensa

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Um novo dia acabara de começar e com ele vinham os primeiros raios de sol que escorriam até as faces rosadas de Pandora . Esta ainda murmurava pequenos sons sonolentos , cansados do sonho , daqueles que não querem conversa . A sua cama tinha lençóis azuis e o cobertor que lhe havia protegido do frio durante a noite era dum azul mais escuro , profundo .

Os espaço era completamente diferente daquele que sonhou anteriormente , as paredes na sua dimensão eram brancas , completamente vazias . Para muitos podiam ser consideradas puras ? Não sei .

Com lentidão , sem pressas , Pandora começou a pensar numa maneira para sair da sua cama mas esta estava tão quente e confortável que não apetecia-lhe sair . Deu uma espreitadela pelo canto do olho e viu a porta do seu quarto aberta dando caminho para a sala . Daquela distância podia ver a caixa deixada aberta com diversas escritas à sua volta  , um vestígio da sua curiosidade insatisfeita . Pôs uma das suas pernas para fora da cama e deslizou para sair preguiçosamente . Teria que fazer uma investigação e provar que tudo que Isaac havia-lhe dito era mentira . Uma das cartas lá mantidas despertou ainda mais  interesse , parecia ter muitos anos ... 

~sei que estás a observar os papéis ... a voz voltou a lhe falar .

" afinal acabas por voltar ... como  sempre " disse ela impacientemente " mas está bem . Ignoro "

~Julgo que esse sonho virá pelos canos abaixo se for se ver ao espelho . Vai lá estar uma surpresa ... Eu já passei para o vosso mundo material , porque não ver ?

" Só deves estar a brincar comigo " virou-se irritada " o problema é que ainda não tenho um espelho , não tenho tempo para isso ... "

~Ah ... veremos

A voz de Isaac deixou de ecoar por dias , naquele tempo Pandora já arrumara todas as mobílias e tinha a casa preparada para o trabalho . Fazia pesquisas de  inúmeros livros e depois ponha-os dispostos num catálogo duma biblioteca vizinha .

Já era o terceiro dia que não ouvia aquela voz ... algo devia estar errado , mas por medo decidiu tapar um longo espelho retangular com um pano . 

Passaram nove dias e ainda sem sinal . Por um momento sentiu-se preocupada , culpada pelo silêncio . Mas afinal , não era essa a voz de que ela queria se ver livre ?

Seis semanas passaram lentamente e isso deixava Pandora muito entediada , sentia-se sozinha e nem sabia o que fazer . Não tinha amigos por perto após mudar de cidade então não havia muito a fazer ... podia fazer maratonas de séries televisivas apagadas aos assuntos que a interessavam . Porém , o sentimento de solidão não passava e parecia não ter fim . Por tempos passava a observar o longo espelho tapado por alguns minutos , só para contemplar o silêncio ...

Certo dia lembrou-se de uma anotação daqueles papéis que a deixara um pouco espantada ... falava sobre as ideias divergentes sobre a igreja , a igreja que naquele tempo fora alvo de duras críticas por muitos dos seus membros cometerem heresias . O povo perdera um pouco da sua fé após a peste que se propagava como uma chama numa madeira , rápido . A gente começara a se questionar se tudo aquilo que até agora acreditavam era real ou não. Se Deus realmente existisse eles não seriam alvos de tal crueldade , eles pensavam  . A última gota fora o estabelecimento de indulgências por parte da igreja . Sim , podia-se apagar pecados recorrendo a uma fortuna e ter-se-ia uma vaga no céu .

Mas nem todos acharam isso correto , era uma exploração por vezes e tudo isso para que a Basílica de São Pedro fosse erguida ... Enfim fora no mesmo tempo em que os vampiros passaram a ser perseguidos , mas perseguidos às escondidas para os fieis não perderem a sua fé . A fé que sustentava os elos com a igreja e as moedas em troca . Graças a estas mudanças na religião , os vampiros passaram a ter que lidar com mais dificuldades . 

Foi tudo que percebera nas cartas que descreviam o clima de terror durante as perseguições ... 

Talvez seja a letra de Isaac , pensou ela enquanto passava os seus dedos delicados pela caligrafia .

A noite estava no seu auge e o sentimento da solidão aumentava cada vez mais . As suas mãos tremiam um pouco com receio mas não pude evitar retirar o pano do espelho . Já era meia note e nada lhe dizia a sua reflexão , ficou estática . Chegara a uma conclusão :

" Tudo que até agora experienciei é uma mentira , era tudo obra da minha cabeça e canseira . "

Se assim o fosse  , ela estaria todo o tempo cansada ...

Talvez Isaac fora só fruto da sua canseira e ele não existia , nunca existiu .

Cinquenta dias passaram e como sempre nada acontecia , continuava a catalogar livros dependendo dos seus assuntos , gêneros e autores .

Pandora tinha um amor profundo para com  livros , livros foram sempre um mundo aparte que a protegiam e faziam-na sentir preenchida mesmo que maior parte do seu tempo estivesse sozinha nos seus pensamentos vazios , azuis . 

Por um tempo pensou que fosse melhor não divulgar os antigos manuscritos , só por precaução . E assim o fez , deixou-se estar . Johannes Gutenberg já fez o que havia de fazer e agora tudo andava à tona com mais facilidade , informação que se come ... é normal . 

A escuridão alcançará o seu tempo , hora de dormir , hora de sonhar ou ter pesadelos . Só o futuro dita e o passado diz mostra-o . Afinal não colhemos o que semeamos e neste conto plantei isso . 



Mãos Geladas , Coração GeladoOnde histórias criam vida. Descubra agora