Amor Inevitável ❤️

I - Recordações

Ainda posso sentir o cheiro de orvalho sobre a terra das noites de chuva em Green Gables. Ainda posso ouvir o som dos passarinhos a cantar alegremente ao amanhecer. E se me esforçar um pouco mais posso até tocar os rostos queridos daqueles que me adotaram como filha a um bom tempo atrás. Quando abro os olhos a linda lembrança se desfaz da mente, mas continua fixa no coração. Ao olhar pela janela vejo as ruas cinzentas de Kingsport, e seus belos prédios comerciais. O Colégio de Moças de Kingsport se localizava bem no meio da rica cidade. No começo fora difícil me adaptar a dar aulas de inglês e literatura, ainda mais sentindo grande saudade de tudo o que deixei em Avonlea. Depois da morte de Matthew seguida pela morte de Marila, resolvi aceitar a proposta da srta. Stacy em me candidatar ao cargo de professora nesta cidade. Um ato sem pensar talvez, pois só depois de me mudar foi que percebi que deixei muito para traz. Diana minha amiga do peito ficara em Avonlea depois da faculdade, resolveu seguir a carreira de pianista e já teve oportunidade de tocar fora das redondezas. Muitos colegas de escola se mudaram para Charlottedown, permanecendo perto da família. Em umas das cartas de Diana soube que Josie Pye e Billy Andrews haviam se casado em um pomposa cerimônia, e logo seria o casamento de Ruby Gillis e Moody Spurgeon. Todos seguiram com suas vidas. Apesar de possuir um diploma de licenciatura e ser uma professora muito bem recomendada por causa do meu bom desempenho, não me sinto realizada. Sempre disse que me casaria com minhas aventuras, mas parece que até estas me abandonaram. Meus únicos consolos são ter a srta. Stacy comigo e Emmeline Harris. Essa adorável garotinha de apenas onze anos tem sido o meu diamante a lapidar. Ela é uma garota que se destaca entre as demais, seja por conta de seu coração como pelos seus desajustados óculos. Emme, como gosto de chamá-la, me anima quando estou dentro de sala de aula, já que algumas garotas ainda tem me dado muita dor de cabeça. As alunas Pringle são filhas de uma das famílias mais ricas da cidade, além de extremamente travessas. Josie Pye e Billy Andrews não chegam nem perto do que essas meninas são capazes de fazer. Meus finais de semana costumo passar com Emme e sua vó a sra. Harris em sua luxuosa mansão. Aquela idosa também não é nada fácil de se lidar, mas não posso reclamar, já que o capitão Morgan Harris, pai de Emme, consegue me tirar ainda mais do sério. Ele é um homem alto e forte por conta da posição que ocupa. O moreno de olhos azuis em seus plenos vinte nove anos é um homem atraente que adora criticar meus métodos de ensino. Ele me faz lembrar de outra pessoa que costumava me provocar, Gilbert Blythe.

O vento gelado da manhã entra pela janela do meu quarto em que ainda me encontro, fazendo meu corpo todo arrepiar, mas pronunciar esse nome em voz alta é capaz de fazer meu corpo estremecer ainda mais. Tanto eu como nossos colegas de Avonlea nunca mais tivemos notícias a respeito de Gilbert. A última vez que o vi foi no dia da fogueira nas ruínas, onde estávamos comemorando o nosso bom desempenho nas provas de admissão para a faculdade. Lembro-me de rodopiar e sorrir perto do fogo, em uma dança de liberdade única. Foi nesse momento que fui surpreendida pela figura do moreno de olhos esverdeados me observando, ele queria conversar comigo e parecia um tanto tenso. Me sentei num tronco de árvore mas Gilbert permaneceu em pé, ele andava de um lado para o outro enquanto relatava sua história. O pai de Winifred Rose lhe tinha oferecido uma proposta para cursar medicina numa das faculdades mais avançadas em pesquisa científica na capital da França, mas para isso ele teria que casar com sua filha e se mudar com ela para Paris. Gilbert naquele momento sentou ao meu lado muito próximo, e olhando em meus olhos disse que só existia uma razão para não aceitar a proposta, e essa razão era eu. Meu coração estava confuso, meus sentimentos pareciam querer explodir de dentro de mim, mas não conseguia entende-los, por isso fui uma covarde, e não assumi o quanto eu amava Gilbert Blythe. Respondi que ele deveria se casar com Winifred, eu também não poderia priva-lo do futuro que ele tanto desejava como médico. Desde aquele dia existe uma dor em meu coração que permaneceu durante os anos. Na época eu tinha dezesseis anos, e hoje estou com vinte e um. A única informação que tive de Gilbert é que no caminho para Charlottedown ele pegou um outro trem para bem distante.