Obsessão

Capítulo Um: Particularités

O despertador me tira dos meus questionamentos, demorei a reconhecer Katharina. Mas ainda desconheço o porquê ela não estava pronta e para que ela não estava, o sonho me fez acordar todo suado e necessitado de um bom banho gelado. Me levanto da cama e vou diretamente ao banheiro, me apoio na pia e me encaro no espelho.

Devo ser um pouco arrogante, mas minha aparência não é nada mal. Sou jovem, no auge dos meus 18 anos, meus cabelos pretos estão rebeldes e para o alto, meus olhos acinzentados me encaram pelo reflexo do espelho. Graças as minhas caças, meu corpo é definido – mas não em excessos, continuo tendo um corpo esguio –,  facilmente seria considerado normal, se não fosse pela cicatriz, maldita cicatriz. Uma herança familiar que puxa das pontas da minha boca até as minhas bochechas, formando um grande e bizarro sorriso.
Me desculpe, mas ainda não confio o suficiente em você para contar essa amável e familiar história.

Vou para de baixo do chuveiro e deixo que a água gelada leve o suor e a inquietação do pesadelo. Como deve imaginar, evito frequentar lugares públicos por causa da cicatriz, então tenho aulas particulares. Pesquisei sobre Katharina, seus pais são separados e seu irmão faz faculdade em outra cidade, ela dá aulas particulares de francês. Não que eu precise, mas concorda que será uma forma ótima de abordagem? Sabia que não me decepcionaria. Já estou preparado para qualquer alternativa que ela deseje, lugares públicos, sua casa e, claro, a minha casa. Desejo profundamente poder analisá-la em silêncio, sem que outras pessoas atrapalhem.
Coloco um moletom, uma calça e os tênis, sei que ela corre às oito da manhã no parque, quero vê-la e tentar entender um pouco do seu comportamento.

[...]

Passos e mais passos, o suor escorre pela minha testa enquanto tento observar a garota há alguns metros de mim. Seus longos cabelos balançam de um lado para o outro, acelero meus passos e a seguro por ele, ela cai no chão e a viro pra mim. Seguro seu pescoço e limpo meu rosto do suor excessivo, sorrio, ela está linda toda suada. Olhos castanhos claros com verde, seus traços delicados e finos, seu olhar de raiva e confusão enquanto tenta afastar minha mão do seu belo pescoço.

– Katharina – sussurro e seus olhos arregalam. Aperto com mais força até que ela se debata contra o meu corpo.

Qual a graça se isso realmente tivesse acontecido? Previsível demais, preciso que ela não esteja preparada para reagir, e que não espere isso de mim. Ah... te decepcionei? Sinto muito, não pude evitar em compartilhar esse desejo com você e sentir sua reação. Você saberá quando não for realidade, ou será que não? Deixaremos isso para depois.
Vejo que tem um papel no seu bolso que quase cai, me aproximo a passos largos e puxo.

– Ei, moça! – olha pra trás Katharina, me obedeça. Ela para a corrida, tira os fones e me olha, o capuz não deixa que ela perceba a cicatriz, por enquanto. Boa menina. – Acho que você deixou isso cair – sorrio de lado, vem pegar. Ela se aproxima a passos lentos, está receosa. A propósito, não pretendo ler e nem saber, farei ela me contar o que tem nesse papel.
– Muito obrigada – diz ao pegar o papel. Seus dedos encostam no meu, estão gelados e os meus quentes demais. – Desculpa, mas qual o seu nome mesmo? – rápido assim, querida? Algo está errado, não acha colega?
– Jeffrey, e o seu? – o quão irônico é eu saber a resposta? Estendo a mão.
– Katharina – meu corpo todo arrepia, a pronúncia vinda dos seus lábios é melhor aos do que eu já pude imaginar. Como seria ela sussurrando meu nome enquanto estamos na minha cama? Ela aperta a minha mão.
– É um prazer, Katharina – ela sentiu a ênfase no seu nome, ela sorri de canto e solta a minha mão.
– Espero te ver por aí – ela vira e volta a correr. Você vai!

Deve estar se questionando o porquê não falei das aulas particulares, seria óbvio demais. Ai ela se afastaria, preciso me aproximar aos poucos e fazê-la falar ou me mostrar sobre.