Prólogo

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Harry odiava as flores.

Era difícil admitir, para ser honesto, que o seu ódio não era tão verdadeiro quanto desejava que fosse. Harry odiava que as flores haviam perdido suas cores. Odiava como todas estavam mortas em seu jardim e como suas pétalas escuras se despedaçavam na terra recentemente umedecida pela chuva caudalosa da madrugada.

Harry sentia-se como uma de suas tulipas avermelhadas desfalecidas no chão. Pequeno, murcho e morto.

Morto. Ansiava por esse estado, por estar deitado sobre uma mesa prateada com os pés gelados e o espírito pairando em lugar nenhum, um infinito nada. Tratava-se de uma minúscula peça do enorme quebra-cabeça que era sua consciência naquela manhã. O braço direito pendia para fora da banheira, segurando com os dedos moles um copo cheio de uísque barato que comprou na noite passada. Os olhos estavam quase completamente fechados, focados no inexistente, mas revestidos de coisas que almejava desabafar.

O rapaz tombou a cabeça por um segundo de vacilo, o corpo amoleceu por inteiro como gelatina, os olhos verde esmeralda vagarosamente se fecharam e o vidro escorreu por seus dedos. O ecoar do impacto foi o que o despertou. O copo se fez em pedaços e o líquido se dispersou pelo piso cor de creme. Harry, que estava alto desde as nove horas da noite, tinha a mente presa em tudo aquilo que o atormentava. Presa nele. Não houve qualquer insinuação de importância para com aquele copo, na verdade, o soar do objeto se quebrando somente fez sua cabeça doer. O estalo da brasa que se fez presente dentro de seu crânio se alastrou por todo o corpo, esmagou seu coração e bloqueou sua garganta.

Sentiu como se fosse morrer.

Harry afundou completamente sua estrutura vestida na água perfumada – tinha cheiro de flores –, o ar ficou cada vez mais escasso conforme prendia a respiração. Apesar de tudo, estar submerso naquela banheira era calmo. Nada mais soava tão alto quanto seus pensamentos, pois estes, não importava o quanto se embebedasse, ele não conseguia calar.

Louis, esse era o nome de sua aflição. Louis William Tomlinson.

Haviam se passado quatro meses desde que o viu pela última vez. Quatro meses desde que o tocou, o beijou, admirou aqueles olhos azuis feito os mares e o disse o quanto amava cada pedacinho beijado pela sua boca devota. Quatro meses infernais, constituídos de dias vazios, horas desmedidas, improdutivas e álcool. Muito, muito álcool.

O amava tanto que doía, e passou a doer ainda mais quando deixou de ser recíproco.

"Eu a amo...", ele se lembra de escutar. Não acreditou em nenhuma palavra, principalmente quando Louis chamou seu nome nos mais diferentes tons naquela noite. Se recordava dos gemidos suplicantes e da forma como ele o admirou, o corpo suado e o peito ligeiramente oscilante. As lágrimas inundaram o rosto delicado e Harry fez questão de beijar todas elas, para fazer a dor passar. Os dois já estavam quebrados há tanto tempo, despedaçados e costurados com farrapos de pele e flores mortas do jardim de casa.

Apesar do desgaste, Harry ainda o tinha e isso foi suficiente, até que houve um dia em que não o tinha mais. Aconteceu tão subitamente que não assimilou, foi um tolo ao imaginar que poderiam permanecer entrelaçados naquela mola frágil e enferrujada, indo e vindo como se fosse normal. Como se fosse saudável. Eles não podiam e Louis foi o primeiro a se dar conta.

Harry sabia que era uma pedra no caminho e nunca conseguiria culpá-lo por seguir em frente. Era o que deveria fazer. Seguir em frente. Porém, nunca soube por onde começar quando cada canto daquela casa remetia a Louis, quando cada pétala morta o fazia recordar da voz doce lhe dizendo: "Deveríamos ter um jardim."

Harry sorriu sob a água da banheira.

"Um jardim bem grande, com uma mesa espaçosa o suficiente para que possamos jantar e depois nos beijar feito loucos sobre ela", Louis tinha um sorriso brilhante no rosto, as ruguinhas aparecendo no canto dos olhos. "Você não acha? Vou pendurar pisca-piscas em branco quente e cozinhar pra você todas as noites, até o último dia da minha vida", houve um suspiro. "Parece perfeito pra mim."

As Flores Mortas no Meu Jardim (L.S)Onde histórias criam vida. Descubra agora