A linha e a agulha

Rasgue-se

Todos os sentimentos inundaram o ser de tremenda dor. 
A tristeza nublou seu rosto. 
A ansiedade fez seu coração se entalar na garganta.
Seus intestinos se entrelaçaram, em agonia.
O silêncio foi seu mais alto grito. 

Queria que o passado não afetasse tanto...
Não tirasse seu ar, não fizesse seu corpo sufocar. Mas, as lembranças machucam. A pele ainda sente; a alma se vê violada e desrespeitada. Sua mente se adoeceu e em pesadelos se prendeu, coisas horríveis viveu. E o pior sempre foi o terror que se escondia dentro de si, bem lá no fundo, quando olhou direito, quando prestou atenção… 

Viu seus próprios olhos disparando nos seus, as cruéis verdades sobre si mesmo: que é pequeno, indefeso, sozinho, triste, vazio. Trancou tudo dentro do peito e tentou se preencher…

Construiu coisas grandes para se sentir menos pequeno. 
Criou muros, barreiras, uma casca grossa para ser menos indefeso.
Falou com as pessoas, tentou sair mais de sua casa para ser menos sozinho
Colocou sorrisos no rosto, agiu com simpatia, foi gentil com todos em sua volta, apenas para ser menos triste.
Fez tudo o que podia, assistiu séries, ficou com os amigos, foi rebelde, foi correto, tentou se apaixonar, teve as melhores notas no colégio e continuou vazio, pequeno, indefeso, sozinho e triste. 

Todo isso se repetiu, várias e várias vezes, mas sempre o mesmo resultado: sua perturbação interior tornava seu exterior sempre mais desgastado, sem cor, vontade ou forças. 

Então, se rasgou, se abriu, sofreu, libertou todos os males que trancou sem si. Se livrou do seu próprio peso, seu corpo tremeu com a saída de todas suas dores, os sentimentos ruins foram sentidos por completo. Se entregou e sem forças ficou.

E lá no fundo, onde a vista não viu quando, para dentro olhou, restou a esperança. Ela foi a linha e a agulha que seu corpo rasgado costurou e nos lábios um sorriso de alívio bordou.