Um Sono de Dois Mil Anos

Lua

Um grande espelho dourado, ornamentado com pedras preciosas, estava de pé no canto de um quarto completamente claro, destacando-se do resto da mobília. Uma garota estava de pé em cima de um banco baixo à frente dele, observando em seu reflexo seus cabelos e olhos brancos que, combinados ao tom pálido de sua pele, lhe dava a sensação de que ela provavelmente já estava morta.

Uma mulher vestida em vestes perfeitamente brancas tirava medidas do corpo da menina, dando os retoques finais a um vestido que a menina estava usando.

Um homem também estava de pé, ao lado da garota. Ele tinha cabelos vermelhos longos, parcialmente presos em um rabo de cavalo com duas tranças que se prendiam a ele. Ele tinha uma marca losangular em sua testa do mesmo tom azul escuro de seus olhos.

— Eu ainda não consigo acreditar que Locki está morto. — Ela disse, levantando levemente o queixo. — Mesmo com todos os problemas dele, eu duvido que ele realmente se mataria.

— Duvida, é? — O homem de cabelos vermelhos se aproximou um pouco dela. — Locki não estava bem, Luna... principalmente depois de ter perdido os dois irmãos...

— Eu sei... — Ela abaixou a cabeça, recordando-se do homem que, apesar de todos falarem sobre como era doente, sempre pareceu perfeitamente saudável para ela. — Mas por que apenas os cardeais tiveram acesso ao corpo dele? Eu queria muito estar presente em seu enterro.

— É uma tradição da igreja que os bispos sejam cremados, para que suas cinzas possam abençoar os novos bispos que estão para nascer. — Ele respondeu.

— Jhad'ah... — Ela engoliu a saliva da garganta antes de voltar a falar. A mulher que tirava suas medidas pediu para Luna mudar de posição. — Sobre o meu batismo, eu...

— O que há de errado sobre seu batismo, Luna? — Ele interrompeu, de forma autoritária.

— Eu só não estou com um bom pressentimento sobre ele. — Assim que ela disse isso, a mulher ao seu lado estacou, pálida, e começou a se afastar rapidamente da garota. Jhad'ah fez um movimento brusco com as mãos em direção a ela, que parou imediatamente.

Por um momento, pareceu que faíscas haviam saído dos olhos do homem.

— Você não falará mais novamente sobre isso, entendeu? — Luna fez que sim com a cabeça. — E esquecerá completamente essa ideia de que o Bispo Locki não está morto. — Ela novamente fez que sim com a cabeça.

Luna acordou de repente, desnorteada. Estava em seu quarto, deitada, mas a mulher e Jhad'ah haviam sumido. Seu vestido estava pronto, colocado em um manequim sem braços, pernas ou cabeça próximo ao espelho dourado na outra extremidade do quarto.

Era como se tudo isso tivesse sido um sonho que estivesse começando a desaparecer de sua mente. Esquecer completamente qual ideia? Sobre o que exatamente ela não podia falar mais? Sobre o que estavam conversando antes disso? Nenhuma resposta vinha à sua mente. Parecia tudo tão real por um momento e, agora, tudo já havia desaparecido. Mas algo em sua mente lhe dizia que estava tudo bem. Uma voz familiar e verdadeira, que lentamente a empurrou de volta ao sono profundo em que estava.