capítulo 1

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O mar e as rochas abaixo
Inclinadas para a correnteza
Ossos, sangue e dentes corroem, a cada momento de silêncio esmagador

Asas não ajudariam
Asas não ajudariam você a descer
O desânimo preenche o chão, a gravidade está orgulhosa
Bon Iver | Rosyln

🦊
Valentina Martin

Eu só queria estar em paz...

Me lembro exatamente o dia que minha vida mudou completamente, era meu primeiro dia de aula do último ano do ensino médio, faltava pouco para me livrar de tudo aquilo, só mais alguns meses e eu iria para alguma faculdade mais longe possível daquele lugar que era meu inferno particular.

Eu só precisava ter paciência, continuar focada e principalmente ter força para aguentar e seguir em frente.

Todas têm algum objetivo, mesmo que permaneçam ocultos muitas vezes, mas no fundo seu desejo está presente na sua mente confusa. No entanto, eu não era uma pessoa confusa, sabia exatamente o que queria e era ir o mais longe o possível daquele lugar e daquelas pessoas.

Sempre fui invisível, eu só não era quando as pessoas queriam zoar alguém, daí eu era o alvo perfeito.

Sempre sofri na escola, mas nunca me importei porque quando chegava em casa tudo era diferente, minha mãe estava me esperando para me confortar. Lembro exatamente da sensação dela passando sua mão gentil pelas minhas costas dando leves tapinhas e beijinhos na minha testa fazendo a dor toda ir embora.

Sempre falando o quanto eu era uma menina inteligente e bonita, como eu a deixava orgulhosa. Eu sentia tanta falta dela.

Mas depois da sua morte, eu não tinha mais ninguém para cuidar e me ajudar. Eu tinha ficado sozinha no mundo, só minha dor tinha ficado comigo, tendo que aguentar tudo sem ninguém para me dar o apoio.

A escola para mim era significado de purgatório e casa inferno. Apesar de odiar aquele lugar, era ali que eu ia conseguir minha salvação, pelo menos eu acreditava nisso. E contava cada segundo para sair daquela situação, só faltava mais um ano. Na minha casa era bem pior, lá tinha minha madrasta e meu pai eles adoravam me torturar. Na escola eu conseguia fugir e me esconder, mas em casa era impossível.

Só mais um ano, faltava pouco para acabar. Pelo menos a minha inocência acreditava nisso, mas eu mal sabia o que ia acontecer comigo durante esse tempo.

Eu precisava sobreviver, eu tinha prometido para minha mãe. Essa promessa era o que me mantinha firme e me dava força para continuar viva, eu precisava aguentar tudo aquilo.

Eu precisava sobreviver, eu precisava...

No primeiro dia que tudo começou...estava tão frio, lembro de ter acordado com tremores se espalhando pelo meu corpo. Era estranho estar tão frio, ainda estávamos no fim do verão, mas era como se o tempo tivesse me avisando do que ia acontecer naquele bendito dia.

Quando levantei da minha cama, minhas costas reclamaram e eu soltei um gemido de dor, mas preferi ignorar, se eu reclamasse da cama com certeza ia apanhar e era perigoso ela começar a fazer dormir no chão, aquele lugar que eu dormia já era muito gelado, eu não podia piorar a minha situação. Se eu aguentei até agora, eu consigo fazê-lo mais alguns meses.

Coloquei meu uniforme bem alinhado, e uma meia calça preta para esconder os hematomas roxos e alguns verdes na minha perna, já que as meninas tinham que usar saia no meu colégio, o que me deixava bem desconfortável, sempre tinha que esconder as marcas do meu corpo e era difícil com aquele uniforme ridículo.

Doce ArmadilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora