Descemos no labirinto de Dédalo

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Eu adoraria revelar que tinha uma breve ideia do porque estava fazendo um escarcéu durante a missão mais importante que estive envolvido até o momento, em um lugar que por si só era capaz de aleijar um semideus sem qualquer esforço. já era de se imaginar que eu não tinha nem uma pista.

Aparentemente, Annabeth deixara claro algumas centenas de vezes que o Labirinto de Dédalo era projetado para confundir qualquer um que tentasse cruzar seus domínios. Armadilhas, expansões, monstros, dicas enigmáticas de deuses interesseiros e todos os sinônimos de morte aumentavam de grau a cada bifurcação. Desde os trinta metros depois da entrada, quando notamos como as paredes mudavam repentinamente, contei as duas primeiras que conseguimos passar sem problemas. E mesmo essas, como quase todas as experiências dos verões passados, acabaram fazendo parte da minha extensa lista de não afazeres para próximas visitas.

Eu podia dizer que as coisas começaram a dar errado naquele momento. Eu estava correndo a frente de Rachel Elizabeth Dare por um corredor imenso e redondo feito de pedras gosmentas. Seguido por uma furiosa Annabeth Chase.

Água escorria pelos vãos das pedras largas que serviam como teto e rapidamente se acumulava aos nossos tornozelos. O ar tinha um cheiro asqueroso, na pior das hipóteses se assemelhava a bunda de bode molhada e, acredite, sei do que estou falando. Grover ficava com o mesmo cheiro impregnado no pelo quando pegava chuva.

Um pouco antes de iniciar meu primeiro verão no acampamento meio-sangue Grover perdera as calças em uma épica fuga de carro. Assim que o descartei no terminal rodoviário tive a certeza de que seria o suficiente para não ser perseguido, e, surpreendentemente, ele apareceu horas depois de baixo de uma terrível tempestade na porta do chalé onde minha mãe e eu tentávamos passar três dias pacíficos, em Montauk. Depois disso fomos perseguidos pelo Minotauro, meu melhor amigo se revelou um Sátiro, Destruímos o Camaro 78 de Gabe e todos nós quase morremos.

Agora, o cheiro hircoso de bode que aparecia nos meus pesadelos era dez vezes pior.

Continuei seguindo caminho em silêncio.

Por cima do ombro olhei Annabeth, ela acompanhava apressada os passos de Rachel. O rosto brilhava com o suor e mechas finas de cabelo dourado acabavam grudadas em suas bochechas, seus brincos de coruja, símbolo de sua mãe, Atena, cintilavam nas orelhas e a adaga presa a cintura emanava uma aura ameaçadora. Sua expressão rígida era terrível.

Nossos olhos se encontraram e, por um segundo, pude jurar que aquele cinza intenso havia se transformado no vermelho ardente e ameaçador das orbitas de Ares.

- Percy, me escute! - Disse Rachel, pela segunda vez. Seu rosto ainda mais avermelhado do que seu cabelo. - Talvez se voltarmos agora consigamos encontrar o caminho.

Eu não tinha a habilidade de ver através da nevoa como Rachel, mas era fácil saber que estávamos nos afastando cada vez mais da oficina de Dédalo. Em parte, a culpa era minha mas Annabeth também causara a maior parte da situação. Nunca fui bom com garotas, não sabia lê-las, mas porque eu tinha a impressão de que com Annabeth era ainda pior?

- Podemos detê-los, mas só se voltamos AGORA MESMO!

- Não precisa lembra-lo - Annabeth revirou olhos - ele sabe disso. Deixe com que faça o que quiser! Ele sempre faz, mesmo.

Estive aturando a senhorita sabichona rabugenta desde que pedira a ajuda de Rachel.

Horas atrás Annabeth era a garota que perseguia destemida uma aranha robótica até uma das forjas de Hefesto, seu pavor - e uma certa rixa de sua mãe com Aracne - eram nulos diante a coragem. Era a garota que não desejava me abandonar para ser esfolado vivo por um enorme grupo de garotos-dobermanns-marinhos. Que, furiosa, me beijou atrás de um caldeirão de bronze. E agora, tudo o que fazia era se irritar e falar sobre Luke, o ex-conselheiro chefe do chalé de Hermes que havia nos traído e se unido ao vingativo senhor titã, Cronos. Eu estava farto daquilo.

Me virei e uma marola quebrou a calmaria do riacho que se formava no chão.

- Ei, não fui eu que ignorei Rachel e segui pelo caminho errado de proposito! - eu disse.

- E não é isso que esta fazendo agora?! - questionou ela.

E esse simples comentário me fez enrubescer de vergonha.

- A menos que os dois pombinhos queiram escolher o caminho a dedo - interviu Rachel - É melhor me deixar guiar dessa vez. Foi por isso que me chamaram, certo?

- Bem, é melhor mesmo que você tenha um plano para nos guiar. Seria uma perda de tempo se não tivesse.

Por mais grosseira que Annabeth fosse eu não conseguia deixar de ver a garotinha cautelosa que ficara brava por eu ter "acidentalmente" recebido a missão em seu lugar. Isso me fez pensar que talvez estivesse irritada por uma normal - ou quase isso - se tornar o centro dos holofotes em uma missão que deveria ser sua.

- Olhe - disse eu - Desculpe por nos desviar do caminho. E Annabeth... - uma dor lancinante me fez engolir a fala. Algo pesado esmagava meu pé esquerdo, que gradativamente afundava nas pedras como em areia movediça.

- Acho que estou com problemas.

Rachel Elizabeth Dare empalideceu.

Fui lançado ao chão tão repentinamente que não cheguei a dar conta até estar encarando o teto cinzento da caverna. Minha cabeça topou contra uma elevação e o zumbido agudo que martelou nos meus ouvidos deixou meu cérebro ainda mais desordenado. Rachel disparou ao meu encontro, ela juntou os braços ao redor de meu peito, fincou os pés nas rochas e impulsionou os calcanhares.

- Percy! - ouvi Annabeth chamar.

A água cristalina fulgurou em tons de verde e o pânico explodiu no meu peito. Então senti algo no meu bolso, uma sensação congelante ficando cada vez mais fria. O apito pra cães de Quintus queimava minha pele através do jeans.

Em poucos segundos meu corpo também começou a afundar, minha perna havia desaparecido quase por inteira, sugada para dentro do chão. A dor era como ter um milhão de facas envenenadas rasgando a pele. Eu tinha que agir o mais rápido possível.

Percy Jackson e os corredores do labirintoOnde histórias criam vida. Descubra agora