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Era isso, ela iria embora.

Estava acabado.

— Mamãe? – Ouvi a voz doce de Sophie e direcionei minha atenção a ela, apertando mais ao meu corpo. – Aquela moça não gosta de mim, não é?

— Ei, é claro que gosta, só está um pouco nervosa. Por que pensa isso Sophie?

— Todas às vezes que a olho, ela vai embora. Em todos os lugares que estou, faz questão de não ficar por muito tempo. – Vi sua expressão mudar, antes de prosseguir. – Talvez seja por aquela coisa que ela tem nos olhos.

Coisa? Sobre o que Sophie estava dizendo?

Poderia Lauren ter sido infectada?

— Que "coisa" é essa? Não vi nada. – Senti seu braço em volta do meu pescoço apertar mais.

— Promete que não vai ficar brava se falar de minha outra mãe? – Aquela pergunta me pegou de surpresa, Sophie começava se apegar a mim como uma figura materna substituta. Seria isso preocupante?!

Entretanto, seria hipocrisia dizer que não estava tomando-a como filha.

Neguei com a cabeça e a mesma prosseguiu:

— Minha mãe dizia que, quando a tristeza das pessoas é grande demais, quando não conseguem suportar e mesmo assim tentam esconder, ela vai para os olhos, que as coisas boas e ruins sempre ficam a mostra neles. Consigo ver várias coisas assim nos olhos dela.

— Eu... É... Não percebi isso.

— Tudo bem mamãe. Era só algo que minha outra mãe dizia. Vocês brigaram?

— Não, só tivemos um desentendimento, coisa boba de adulto. – Disse e consegui arrancar um sorriso inocente da pequena em meu colo, vendo em seguida um bocejo. – Parece que alguém está com sono.

Ela riu e se aconchegou ao meu corpo com a cabeça em meu ombro. Cantei em baixo tom para ela, enquanto fazia carinho em seus cabelos encaracolados, vendo a delicadeza do rosto e as bochechas rosadas. Logo percebi que já se encontrava em sono profundo, a coloquei na cama e cobri até o pescoço. Dando um beijo em sua testa e pegando meu casaco, saí da tenda para encontrar a fria noite que começava.

(...)

— Max, por que fez isso? - Questionei assim que o vi em uma das tendas. - Sabe que ela não sobreviverá por mais que algumas semanas.

— Ah! Agora a culpa é minha?! Mila temos que cortar o mal pela raiz, desde que Lauren chegou nada de benéfico trouxe para nós. – Argumentou, ingerindo um pouco do café que Cher preparou há pouco. Possuía uma xícara em minhas mãos também, e, lá fora, todos estavam em volta da fogueira.

— Max, entendo sua posição e com certeza respeito-a, mas não pode expulsa-la. Admito a culpa, comecei a briga. Ela não tem para aonde ir, confio nela, apesar de ser estúpida e...

— Camila, chega! Se entende minha posição e a respeita, então não questione minhas decisões.

— Droga! - Esbravejo sabendo que nenhum argumento o faria mudar de ideia.- Como está Jason?

— Estável, porém febril há dias. Pode ser apenas uma infecção leve, mas as hipóteses disso são mínimas. – Soltou o ar cansado. Max poderia ser um tirano por expulsar Lauren quando a culpa da briga era toda minha, mas duvido que isto não o tenha afetado. - Temo ter que o matar antes que algo de pior aconteça.

— Espero que não chegue a tal ponto. Ele precisa se recuperar.

— É Mila, também espero.

Exausta e sem esperanças, saio da tenda para me juntar ao grupo. Lá fora, o ar se encontrava mais gélido do que o comum e todos se amontoavam na tentativa de se esquentar. Procurei Lauren com o olhar até a localizar perto do barranco, olhando para as estrelas com os braços cruzados. Era impossível evitar pensar que teria que voltar sozinha para o caos, correndo perigo porque não segurei a língua.

— Se quer um conselho, deveria ir até lá. – Ouvi a voz de Eric, aconchegando-se a meu lado com uma xícara de alumínio.

— Desculpe?

— Você me entendeu. – Eric soltou uma piscada de um olho só com o sorriso adolescente. – Deveria falar com ela ou pelo menos tentar, sem encostar. Acredito que precisa disso, mesmo que não queira que venha de você diretamente. – A atitude de um menino de apenas dezessete anos me deixou boquiaberta. – Espere.

Vi seu corpo esguio levantar e ir em direção ao bule suspenso sobre a fogueira, para manter o café aquecido. Retirando uma xícara de porcelana de uma sacola, encheu-a com o líquido preto e voltou para mim.

— Tome, leve junto, creio que também esteja com frio. E lembre-se: somente conversar. – Seu riso era divertido, Eric conhecia meu gênero.

— Sabia ser o meu garoto favorito no mundo? – Digo sorrindo, pegando a xícara de sua mão.

— Provavelmente sou um dos poucos garotos realmente vivos no mundo, sem falar de minhas qualidades peculiares, o que faz com que todos amem somente a mim. Agora vai, café e amor são duas coisas que não se servem frio.

(...)

— Não preciso de sua compaixão, Karla. – Disse assim que parei atrás dela.

— Como sabia ser eu?

— Seu perfume, não há muitas pessoas usando perfume atualmente, algumas nem tomam banho mais. – Explicou ainda fitando o horizonte. O vento balançava seus cabelos, fazendo com que os mesmos dançassem lindamente. – E também, mais ninguém liga para o que estou fazendo aqui, alguns estão contanto os minutos para me ver ir embora.

— É... Percebi que ninguém veio aqui lhe dizer que, em noites de frio, fazemos café e nos sentamos ao redor da fogueira. – Coloquei-me a seu lado, tentando visualizar seu olhar. – Tome.

— Não quero nada seu.

— Por favor, deixe de ser cabeça dura, professora. Só quero que beba o café e se mantenha aquecida. Seus lábios não mentem, está com frio, hipotermia também pode matar.

Pela primeira vez a morena de olhos claros focou seu olhar em mim. Provavelmente chorou, pois, as marcas das lagrimas permaneciam em seu rosto. Os lábios roxeados tremiam levemente. Dando-se por vencida, pegou a xícara de minha mão, tomando um longo gole, para, em seguida, voltar olhar o horizonte.

— Obrigada.

— Podemos conversar? Não me negue isso, por favor. – Supliquei vendo-a ponderar sobre meu pedido, assim assentindo, sentai ao seu lado mantendo certa distância. – O que tanto olha?

— Alguma vez já se deu conta que as estrelas são a única ligação mais próxima que temos com quem amamos, mas que não estão entre nós mais? – Engoli em seco com sua pergunta, sentindo a garganta fechar-se por completo, o café parecia queimar como brasa. – Sei que não, mas deveria. É algo que uso para não me esquecer das únicas pessoas que mais amei na vida.

— Com certeza é a coisa mais linda que já ouvi. – Revelei tomando meu café, vendo-a sorrir deprimida. – Então, tinha uma esposa?

— Sim, seu nome era Alexia. – Percebo uma lágrima escorrer por seu rosto.

— Desculpe... Vamos falar de outra coisa. É... Sei que pode não parecer, mas quero me desculpar. – Percebo seu olhar confuso. – Irá embora por minha culpa e eu... Não quero que vá.

— Karla, está tudo bem. Sei que não acredita nisso, mas vou conseguir sobreviver mais do que algumas semanas. A culpa é sua, mas sinto que tenho uma dívida com você por salvar a minha vida, apesar de se arrepender disso, mas eu não me arrependo de ter confiado em você.

— Disse aquilo em um momento de raiva e...

— Se arrepende. – Completou. – Sim, mas não é esse o ponto. Palavras são como facadas que depois que perfura a pele, pedir desculpas não fará com que a ferida pare de sangrar. Sua justificativa foi ter dito em um momento de raiva, mas não são esses os momentos em que mais falamos a verdade?

— Faria tudo de novo, sem pensar duas vezes e o fato de ter dito aquilo não muda que me apa...

Minha frase ficou incompleta ao ouvir os gritos de Wes pelo acampamento.

— ARMAS! TODOS PEGUEM SUAS ARMAS! ESTAMOS SENDO ATACADOS!

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