Capítulo 1

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                                               ––– Um ––

 Eu sabia que estava em apuros. Ninguém precisava me dizer isso.

     Sentada numa carteira dura e fria na sala de aula, segurando a minha prova do último bimestre, eu não tinha mais dúvidas de que o tal sexto sentido feminino realmente existia.

     Foi quando o sinal tocou... Sim, ele veio para decretar o que eu mais temia. E, apesar de ter soado de forma tão libertadora por diversas manhãs, justamente naquele belo e ensolarado dia de primavera ele parecia querer me aprisionar.

     De repente, uma voz sussurrada ecoou em minha mente, anunciando dias de desassossego. Não que a vida de uma garota de 15 anos seja — exatamente —sossegada, mas por algum motivo tive a intuição de que tudo estava prestes a mudar. Senti um calafrio na espinha, enquanto meu peito se agitava. Minhas mãos estavam suando e deixavam a folha da prova com leves ondulações de umidade. Mas, afinal, o que era aquilo?

     — Melissa, eu sinto muito, mas não adianta ficar olhando para o papel — disse a professora, interrompendo minhas divagações. — O sinal já tocou. Você não ouviu?

    Não respondi. Apenas recolhi o meu material e me levantei, dando uma última olhada na prova. Havia pouquíssimas respostas, a maioria das questões estava em branco. Fui caminhando lentamente, ainda relutante. Mas não tinha jeito, eu precisava entregar a bendita avaliação de matemática.

    Marta, minha professora, não se importou em manter um silêncio constrangedor entre nós, apesar de me observar com o olhar atento, mergulhado no roxo de suas enormes olheiras. O cabelo desgrenhado estava preso por um coque no topo da cabeça e o vestido comprido, cor de carne, deixava à mostra apenas o seu tornozelo roliço.   Nunca entendi essa obsessão da Marta em querer parecer tão desinteressante. Porque no fim das contas, ela não era feia, pelo contrário. Mas, fazer o quê? Tem gente que não se ajuda. Pensando bem, até que para uma roubadora de férias de verão ela se vestia muito bem.

     Depois de deixar a sala, desci as escadas do antigo Colégio Santo Antônio de Pádua em disparada. Minha respiração estava ofegante e o meu coração cada vez mais acelerado. Como eu poderia ficar reprovada? Não fazia sentido! Logo na minha estreia no ensino médio...

    Eu sempre fui uma boa aluna e nunca precisei realizar uma “quinta prova”. Isso sem falar que aquele tinha sido um bom ano. Exceto pelo meu péssimo rendimento em cálculo, é claro! Mas, definitivamente, não imaginei algo tão trágico. O que eu diria aos meus pais? Não era justo, eles trabalhavam tanto para pagar um bom colégio. Eu não poderia decepcioná-los. Não mesmo! Tudo bem que ainda me restava a recuperação, mas a julgar pela prova que eu havia acabado de realizar, as minhas chances não eram muito animadoras.

    Talvez, por sorte, faltassem poucos pontos para alcançar à média, porque no início do ano eu ainda conseguia tirar boas notas. O problema surgiu a partir do terceiro bimestre. E eu, tola, ignorei os indícios de que teria problemas futuros. Acabou dando nisso.

    Quando cheguei ao pátio do colégio, esquadrinhei toda a área na esperança de achar Alice ou Patrícia, minhas duas melhores amigas. Mas não vi nenhuma das duas. No fundo, já sabia que não as encontraria mesmo; afinal, somente eu estava pendurada em matemática.

     Àquela hora elas já deviam estar chegando a suas casas, satisfeitas com o início das férias. Eu podia imaginá-las felizes, tranquilas, arrumando suas coisas para a festa do pijama que havíamos combinado para mais tarde. Eu só não imaginava que me faltariam motivos para comemorar.

Que fase!Onde histórias criam vida. Descubra agora