O que aconteceu com Alice?

Lembrar de que?

- Então você não se lembra?

O advogado me encarou seriamente enquanto espera a resposta. Mas que resposta se eu nem sequer consigo me recorda perfeitamente do motivo que me fez levantar essa manhã para vim até aqui; de modo geral, ele quer saber o mesmo que eu.

- não... quer dizer, sim eu me lembro... aish, eu não sei.

Há vários momentos na minha inútil existência em que me senti assim: confusa. Mas agora eu não deveria estar assim, eu não quero estar assim.

Voltei a olhar fixamente para minhas mãos em cima da mesa.

- Respire fundo Alice e tente lembrar.

Ouvi a voz de fundo dizer. Mas de quem é essa voz? Apenas Sr. Camp e eu estamos aqui no momento.

Independente de quem seja fiz o que havia dito: respirei fundo e tentei lembrar, mas lembrar de que?

Continuei encarando minhas mãos, os movimentos que a unha da mão direita fazia ao tentar tirar o esmalte lilás da unha da mão esquerda, pareciam até que não estavam sendo controlados por mim. E mesmo já bastante estragado o esmalte ia sendo arrancado aos poucos, alguns caiam diretamente na mesa e outros ficavam presos em baixo da unha da mão esquerda.

Sr. Camp parecia estar tenso ou talvez até irritado. Mesmo sem olhar pra ele foi perceptível saber disso pela forma que ele se levantou da cadeira que estava a minha frente. Levantei um pouco a cabeça e pude ver apenas uma parte de suas pernas, no momento me falta coragem para encara-lo novamente.

Era apenas uma mesa estranha de madeira que nós separava, "era" por quê agora a distância que ele tomou de mim ao caminhar para algum lugar perto da parede também nós separava.

Um suspiro. Impaciente, sim Sr. Camp era impaciente, ou talvez eu que tenha lhe deixado assim depois de ficar mais de uma hora aqui sem conseguir pensar em nada coerente. Também suspirei, aquilo estava me dando dor de cabeça e vontade de chorar.

- Alice...

A voz de fundo se fez presente novamente então finalmente resolvi conferir para ver quem estava lá. Me virei para trás e o vi, estava usando a parede para se escorar e me encarava. A vontade de chorar aumentou então me virei novamente e olhei para Camp.

- Eu não sei como explicar...

E eu realmente não sabia. Mas certamente não quero passar o resto da vida aqui nessa sala, e muito menos se: "passar o resto da vida aqui" significa ter que ficar com o cara lá de trás também.

- Ok, vamos fazer assim: tente se acalmar um pouco, depois voltaremos a conversa e você tentará me contar o que aconteceu, pode ser?

Assenti com a cabeça e voltei a olhar para minhas mãos.

- Você quer alguma coisa? Uma água, café ou talvez um suco de maracujá pode lhe ajudar a se acalmar!

Sr. Camp estava sendo simpático, gosto de pessoas simpáticas. Queria poder contar- lhe logo o que aconteceu, assim ele poderia parar de perder seu tempo comigo e voltar a cuidar de seus casos mais importantes e menos complexos...

- Suco de maracujá não irá te acalmar...

Disse a voz do lá de trás novamente.

- E você sabe disso.

Terminou sua fala com um suspiro que soou mais como uma risada abafada.

Respirei fundo e olhei para Sr. Camp.

- Um copo de suco de maracujá séria ótimo.

Disse com a voz um pouco mais firme dessa vez, provavelmente porquê ele havia me deixado assim.