O velho
Tinha uma coisa que João sempre gritava aos quatro ventos que queria ser e essa coisa era "Fazedor de pizza", quando ele tinha cinco anos era o que ele dizia e quando fez vinte foi uma convicção dentro do seu coração que parecia ser boba até não ser.
As pessoas costumam achar profissões como essa pouco válidas mas quem faz pizza não só joga o molho sobre a massa e salpica mussarela ralada e bota pra assar, essa pessoa tem capacidade de juntar uma família enquanto elas coloca na novela das nove e fazer desse momento o mais especial entre pais e filhos, já que na realidade do país, os pais precisam trabalhar tanto que mal podem observar os detalhes das vidas de seus próprios filhos.
E o outro motivo era que a pizza podia iniciar um amor fenomenal assim como o dele e de Clara foi por causa de uma pizza, a sua, de manjericão que juntou essas duas pessoas de lugares e pensamentos diferentes em uma só e se multiplicaram em Edite. — Embora ele não soubesse que isso iria acontecer aos vinte anos de sua vida.
Então á cada cansativa briga que tinha com o paí, o seu sonho ia se desgastando e se desmontando um pouco se escondendo debaixo da sua cama de tal maneira que ele nunca mais achou. Em uma dessas discussões, ele e o pai, mataram o que sobrou da relação deles.
— Eu odeio o fato de você ser escritor.— João gritou tão forte que a mãe se encolheu e isso deixou o pai furioso. — Eu odeio que você tenha se formado em Jornalismo e Letras na UFSV. — Ele estava certo do que estava dizendo ao pai, não tremia e se sentia enfim um homem. — Eu tenho odiado você, pai.
— Aé, Jão?— O pai indaga tão furioso quanto seu filho. — Então, já que sou um péssimo pai por querer que você tenha uma vida e seja alguém nesse mundo, vou te deixar livre.— Correu para porta da sala e abriu, apontando pra ela.— Vaza.
João juntou suas coisas do chão, beijou a testa da mãe que chorava e implorava para ele pensar melhor. Mas não havia nada para se pensar, o pai o expulsou e isso tava mais que claro em sua cabeça e ele não recuaria mais, passou a vida recuando e agora não podia mais fazer isso.
Parou diante do pai, cara a cara, não se encolheu como um bichinho assustado e isso não significava que ele estava peitando o pai mas sim mostrando que ele estava á altura dele.
— Eu tenho uma vida. — Disse com a voz baixa mas não era um sussurro, ela uma explicação clara e exposta. — Eu sou alguém nesse mundo, eu me chamo João Américo da Silva, tenho quase vinte anos e sou filhos de Sandra Maria Américo da Silva e eu tenho sonhos.— Ele encara o pai, sente a raiva inflando em cada parte do seu corpo e respira fundo dissipando-se dessa raiva.— Adeus, pai.
— Espero que você nunca volte, mas se voltar saiba que eu estarei aqui pra dizer o quanto suas escolhas serão uma merda na sua vida.— Sentiu a porta bater contra suas costas e limpou uma lágrima teimosa.
Continuou não recuando mas seguindo em frente, viu uma enorme oportunidade diante de si, ele estava livre. Completo e inteiramente livre para ser quem sempre sonhou ser.
Cinco meses depois ele voltou pra casa do pai.
Não porque os negócios foram ruins mas por um motivo e esse era muito doloroso, a morte da sua melhor amiga, o pai não tentou contato com ele mas a mãe ligou para ele todos os dias e ia visitá-lo na sua nova pizzaria, comia sua pizza e ia embora dizendo que Deus o abençoaria sempre.
A sua melhor amiga tinha ido embora lentamente, agonizando na cama e ele não esteve presente em nenhum dos seus momentos de angústia. Enquanto carregava o caixão da sua amada e adorada mãe, perguntou-se sobre sua dor, se ela tinha sentido medo durante a sua longa e valente batalha.
A mãe tinha lutado bravamente contra um câncer de estômago, uma mulher que a vida inteira foi saudável e se cuidou, tinha partido enquanto ele que mal ligava se tinha comido ou não estava ali, vivo e se sentindo um desgraçado por ter dado as costas ao pai.
Nesse momento que a terra cobre sua querida esperança, ele pensa o quanto foi egoísta por ter ido embora porque não deixou só o pai para trás mas a mulher que lhe gerou a vida. A mulher que sempre escolheu acreditar nele e sonhar os sonhos dele junto com ele.
As lágrimas desceram de seus olhos, a tristeza revestindo todo o seu coração, a única pessoa que poderia tirar ele desse momento de sofrimento é a única na qual está fazendo ele sofrer. Ele se sentiu desprotegido mesmo já tendo vinte anos e sendo un homem adulto agora, se sentiu criança de novo.
— Me perdoe, mãe.— Ele se agachou no chão, colocou a mão em sua lápide bem polida e deixou as lágrimas caírem até secar em seu rosto. — Me desculpe por não estar do seu lado, por favor, não me odeie.
— Ela nunca faria isso.— Ele ouviu a voz de longe e subiu o olhar, o sol castigou suas vistas enquanto observava alguém se aproximando.
Os cabelos loiros foi a primeira que reparou, depois passou os olhos nos verdes e mel do olhos da desconhecida de lábios bonitos. Ela tinha uma verruga pequena e pouco protuberante e achou graça das duas pintas que descansava em seu nariz e bochecha.
— O quê?— Perguntou, o vento frio desmentia o sol do céu.
— A pessoa que você perdeu, ela não te odeia, independente do que você fez. — Ela diz, se aproximando como se fosse melhores amigos desde de sempre.
João parou de reparar na garota porque ele estava parecendo um doido, apesar de não conhecê-la e achar rude da parte dela ouvir conversas alheia percebeu que ela tinha distraído sua dor.
— Eu fui péssimo.— Admitiu sentindo o coração minúsculo no peito.
— Quem era?— Pergunta, colocando as flores que estavam em sua mão sobre a lápide da mãe.
— Minha mãe.
— Hum, então descanse, mães vem com o mecanismo para nunca nos odiar.— Ela diz ainda arrumando as flores.— Chore o que precisar mas depois se agarre as boas lembranças porque é a única coisa que o tempo não vai nos levar.
— Quem você perdeu hoje?— João pergunta, ela o encara e sorri.
Um sorriso tão bondoso e sereno, ele não a conhecia mas podia acusá-la de ser uma menina boa. Ela exalava bondade e conforto, João queria tocá-la um pouco para roubar um pouco dessa bondade para si.
— Meu irmãozinho, mas não hoje. — Ela diz em tom de quem fala de alguém ainda presente.
— Meus pêsames. — Sorrindo, a garota misteriosa se levanta.
Bate as palmas uma na hora, o sol doura a sua pele branca demais e os cabelos venta junto ao vento que balança as árvores. João olha para o céu sorrindo, entendendo o claro sinal.
— Qual o seu nome?— Pergunta, João dando um breve sorriso.
— Clara.— Ela sorri lentamente e ele mastiga aquele momento saboreando e se deliciando.— Clara Vilela. E você?
— Eu sou o Jão.— Responde, sorrindo de verdade agora.
A mãe não o odiava. Ela tinha lhe dado este sinal claro e bonito, Clara seria a sua nova amiga e a sua segunda esperança.
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Proză scurtăSeu Aparecido Silva, ou Cido para os íntimos, sumiu. Ninguém sabe para onde o gentil velinho foi, sua casa está revirada, mas ele não levou nada, nenhum dinheiro, nenhum bem precioso, apenas o que ele deixou foi uma carta de despedida. Os seus três...