COLE
Dois anos antes...
Isso não pode estar acontecendo. Não pode.O pequeno eixo do meu universo foi ferido, não pode ser real!
Meu peito parece inflamado, em chamas. O zunido nos ouvidos permanece desde que recebi aquele telefonema. Levou toda a força do meu corpo para manter a mente funcionando e conseguir vir até aqui. Minha menina precisa de mim, só
consigo pensar nisso agora.
Empurro as portas, trombando contra as pessoas, apressado, cego, querendo que a situaçãonão passe de um mal-entendido. Já entrei neste
hospital centenas de vezes antes e nunca reparei no quão desesperador o lugar é.
— Cole! — a voz cortante de minha mãe me para no meio do caminho até o balcão da recepção.
Sua expressão de aparente calma não encobre o que vejo em seus olhos. Há algo de errado.
— Como ela está? Como a Ana está, mãe?
— Eles a levaram para a sala de cirurgia,filho, mas ela está bem, tudo ficará bem.
— Eu preciso vê-la.
Tento desviar de seu corpo, porém Eva,minha irmã, se coloca em minha frente.
— Eles não vão te deixar entrar, Cole. Você,melhor do que ninguém, sabe como estas coisas funcionam. Deixe os médicos trabalharem.
— Eu quero ver ela, Eva! Eu tenho que saber como a minha filha está!
Ela toca meu peito.
— Eu a vi, irmão, fique calmo, Ana não corre nenhum risco.
Estreito meus olhos quando ela desvia os dela.
— O que vocês não estão me contando?Onde está a Francine?
Assisto à ligeira troca de olhar entre elas.
— Sua mulher está bem, Cole— as palavras de Eva saem em evidente desgosto — Aquela bêbada irresponsável está sob observação.
Temo perguntar, até porque já sei a resposta,mas necessito da confirmação.
— Ela provocou o acidente? Francine havia bebido?
Minha irmã deixa esvair um longo suspiro.
Sua opinião sobre minha esposa não é nenhum segredo. No momento, a aversão parece ainda mais destacada.
— Você já deu todas as chances que podia,Cole. Aquela mulher nunca valorizou sua família. E hoje… — meneia a cabeça, inconformada — Hoje ela foi longe demais, colocou a vida da Aninha em perigo —encarando-me com crueza, finaliza —Até quando, meu irmão, até quando você vai se sentir responsável por ela e permitir que esta mulher continue levando a todos para o buraco?
Cerro meus punhos, frustrado, indignado comigo mesmo.A culpa é toda minha. Eu nunca
deveria ter acreditado que minha mulher estava recuperada e poderia cuidar de nossa filha. Ela nunca o fez. Jesus, ela mal pode cuidar de si!A verdade é que este casamento já chegou ao fim há muito tempo, mas não tive coragem de admitir. Deixei-a permanecer em minha vida por nossa menina, pensando ser o melhor para a pequena. No entanto, hoje, Francine ultrapassou todos os limites e mostrou que cometi um grande erro.
— Eu tenho que ver a Ana. Preciso saber como a minha filha está.
Depois de uma espera agoniante, finalmente posso botar os olhos na luz do meu mundo, através da vidraça do setor pós-cirúrgico. A pequena
completou dois anos há um mês, e desde seu nascimento minha vida se transformou por completo.Não foi uma concepção planejada. Quando Francine revelou que estava grávida, eu recebi a notícia meio em choque. Meu casamentocom ela já estava à deriva, se sustentando por muito pouco, e, confesso, a novidade me pegou de surpresa. Contudo, ainda na maternidade, no minuto em que vi Ana Carolina pela primeira vez,eu soube que aquele pequeno ser, de menos de três quilos, seria a minha nova razão de viver. Bato suavemente no vidro, pedindo para a enfermeira me deixar entrar, depois de vê-la estabilizar minha menina no leito. Seu olhar profissional encontra o meu e não gosto muito da benevolência nele.
Mas o quê…?
Uma mão se apoia no meu ombro. Viro meu rosto para encontrar o Dr. Willian parado atrás de mim.
— Cole.
Nós nos conhecemos há sete anos, pelo menos. Sou médico socorrista e, normalmente, a pessoa a lhe entregar pacientes necessitando de atendimento imediato.Hoje, no entanto, estou na
posição de familiar de um deles. E é como estar no próprio inferno.
— Willian, qual é a situação da minha filha?— Fora de perigo. Ela chegou com algumas escoriações pelo corpo…
— E por que você a operou? — vou direto ao assunto, não gostando nada da sensação acelerando meus batimentos, pois reconheço na expressão dele a má notícia.
— O impacto do acidente ocasionou um esmagamento de perônio e tíbia.
A pressão em meu peito aumenta.
— Você a engessou… certo?
O homem não hesita: mantém-se firme, me encarando.
— Não havia o que fazer, Cole, eu sinto muito. Os ligamentos, músculos e ossos foram muito danificados entre as ferragens. Tivemos que remover acima da articulação do joelho direito.
Sinto o chão sob os meus pés desaparecer.Minhas pernas enfraquecem e lágrimas surgem, queimando meus olhos. Tenho de me apoiar na parede. Sem controle de meus sentidos, deixo as
costas deslizarem pela superfície até chegar ao piso frio.Pendo a cabeça e seguro o rosto entre as mãos.
Minha criança.
Minha menininha foi ferida e eu não pude estar lá para protegê-la.
A realização dói como o inferno.
Limpo com o punho lágrima atrás de lágrima.O choro vem fácil; é algo que não me lembrava de fazer desde os meus seis ou sete anos de idade.
Eu não a protegi como deveria.
Falhei como pai.🦋
Eu amo esse livro...
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Luz da manhã | adaptação sprousehart
RandomTodos passam por um momento na vida em que algo acontece e as coisas simplesmente... mudam. É quase sempre inesperado. Mas, às vezes,a importância deste fato só é percebida algum tempo depois... Para Lili, o divisor de águas aconteceu quando uma men...