Prólogo: Impermanência

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#GuardaChuvaParaJK🌂

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#GuardaChuvaParaJK🌂

Como dizer para alguém que tudo, ou o pouco, que fez na vida, no final se transforma em pó? Como fazer para voltar atrás e resgatar das minhas próprias mãos o tempo perdido? E se tudo o que eu trouxe comigo foi arrependimento, como faço para buscar a redenção?

Infelizmente o último grão de areia passou pelo espaço da ampulheta e se findou a vida de alguém que mal soube vivê-la.

Foram 15 primaveras sem saber dar valor às flores que brotaram e sem sentir o perfume que exalam. Mesmo contendo imensas cores vibrantes, eu nunca soube dar valor a aquarela que elas pintavam pelo meu caminho.

Foram 15 verões sem apreciar o calor em minha pele, e mesmo passando todos os dias pela pintura azul de ondas que quebram e se mostram brancas na sua verdadeira essência, meu olhar sempre foi de desapreço.

Foram 15 outonos sem admirar uma folha cair da árvore indicando a transição de estações. Indicando a chegada dele...

Foram 15 invernos e diferente das outras, eu me sentia abraçado por ele. De certa forma eu conseguia captar cada nuance de seus traços frios e melancólicos. Era como se ele estivesse me observando e sabendo meus passos e pronto para me abraçar com o seu álgido.

Como fora a maior parte da minha vida, me vi naquele dia vivendo a normalidade de um verão quente, e novamente, não soube ter um olhar diferente para ele.

A pintura azul passava rápido mas constante pela minha vista através da janela do carro, e a impermanência veio através de gotículas transparentes que começaram a cair do lado de fora.

Era uma incomum chuva no final do verão de 87.

Porém, naquela manhã, uma paisagem diferente, no meio de tantas outras que eu estava acostumado diariamente fez-se presente. Enquanto cada um passava pelas listras brancas no asfalto carregando seus guardas-chuvas monocromáticos, um ponto azul chamou a minha atenção.

O parabrisas passavam em câmera lenta na medida que o homem caminhava à frente. Com o seu rosto coberto pelo objeto azul, diferente dos outros, ele para e lentamente levanta o seu guarda-chuva. Seu rosto em seguida é levado aos céus.

Estranhamente a chuva cessa e o céu começa a derramar minúsculos flocos de neve.

Pela primeira vez na minha vida vazia eu me permiti admirar algo. Mesmo que fosse pelos poucos restantes dela.

O homem com o guarda-chuva azul abaixa o olhar e se vira para frente, para mim. Mesmo distante, pude ver seu rosto infeliz. Seus olhos pequenos e tristes traziam com a neve uma melancolia conhecida por mim. Me senti abraçado por eles.

Ele então desarma o objeto e quando a ponta deste bate contra o asfalto, o barulho alto de algo derrapando na pista chega aos meus ouvidos e meus olhos se fecham.

Eu havia sido atingido pela impermanência e minha vida havia sofrido a mudança trazida por ela.

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