Único.

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[NARCISOS]

Sapnap era, acima de tudo, um cara decente. Provavelmente por isso que Karl o detestava.

O homem havia sido um garoto em algum momento, quando ainda não estava dentro de roupas caras feitas sob medida ou defendendo apaixonadamente alguma causa nos tribunais de uma Virgínia que o idolatrava. Ele costumava jogar futebol na escola, porra. E era capitão do time. Dolorosamente piegas e previsível, mas mesmo assim ainda conseguia arrastar quase um fã-clube a cada passo que dava. O que aquele bando de garotas tinha na cabeça, afinal? Não havia absolutamente nada de especial sobre Nick. Ele era apenas um garoto. Um garoto como qualquer outro garoto, que ganhava um prêmio super famoso após uma redação super elaborada, e que tinha pais ricos e uma vida inteira entregue de mão beijada. Ele era como qualquer outra pessoal normal.

— Você só tem inveja dele. — A melhor amiga disse, quando eles ainda estavam na escola. 

Karl tinha dado uma gargalhada absolutamente desdenhoso, e torceu os lábios, em uma careta obscena quando ela não estava mais olhando. Inveja? De Sapnap? Por favor... Ele não tinha nada de especial. Era só um cara, que agora era um homem, que tinha um escritório famoso no centro da cidade e que vivia uma vida aparentemente perfeita, namorando modelos capa de revista e sendo invejado por uma quantidade absurda de pessoas, mas não por Karl. Nunca por Karl.

Sapnap nunca tinha realmente sido amigo de Karl antes. Eles eram, basicamente, conhecidos. Eles sentaram juntos na aula de Biologia uma vez para fazer um trabalho. Biologia era a matéria que ele menos gostava e odiou a sensação de parecer absurdamente burro e obtuso na frente de Nick — não que ele quisesse impressionar, mas ele também não queria parecer absurdamente um panaca. Karl não tinha muitos amigos. Ninguém nunca gostou muito do filho do cara que tinha matado uma mulher em um assalto à mão armada. Karl precisava passar o resto da vida vivendo na sombra dos pecados de outra pessoa e ele já estava habituado a isso então era fácil colocar no rosto a melhor expressão de frívola indiferença e seguir em frente como se nada pudesse atingi-lo. No entanto, naquela tarde em que o sol preguiçosamente estava projetando uma imagem distorcida nas carteiras que estavam juntas no meio daquela sala de Biologia, Sapnap inclinou um pouco a cabeça e olhou para Karl por baixo de uma franja estupidamente bem cortada.

— Oi. — Ele disse. E sorriu um sorriso que cegaria um desavisado. Dentes absurdamente brancos, tão patético. E aquele cabelo estúpido, e aqueles dentes ligeiramente pontudos estúpidos, e aquele uniforme todo certinho e estúpido. — Eu sou Nick. 

— Eu sei quem você é. 

— Sabe? — Nick piscou duas vezes antes de voltar a falar. — Eu não lembro de... 

— Nós nunca conversamos. 

— Então como...

— Todos conhecem você. — Karl odiou tudo sobre Nick naquele momento. Odiou com tanta força que o peito se encheu de um sentimento capaz de sufocar. — Quer dizer você é... capitão do time e essas merdas aí.

Sapnap suavizou a expressão, mas um lampejo de melancolia passou pelo rosto dele. Ele ainda estava sorrindo, mas dessa vez sem mostrar os dentes. Karl achava absurdamente estúpido o jeito com o sol estava tocando só um pedaço da pele dele, fazendo com que cada olho parecesse de uma cor — dourado e castanho e talvez com nuances de chocolate. 

— Eu também conheço você. — Nick voltou a falar, aparentemente ignorando as palavras anteriores. — Você é Karl Jacobs. 

Karl já ouvira a voz de Nick antes. Ele fez um discurso de agradecimento no final do ano passado, quando foi o aluno homenageado. Claro que ele seria o representante de turma. Quem mais teria tal honra? Mas, de perto, ele falava com calma e tranquilidade, muito bom de dicção. Não era à toa que ele agora era um advogado tão bom quanto os pais dele.

Narcisos. - KARLNAPOnde histórias criam vida. Descubra agora