O jovem estudante mantinha uma expressão neutra enquanto olhava ao redor, a noite estava agradável, e estaria ainda mais se ele tivesse convencido o melhor amigo a deixá-lo em casa trabalhando na apresentação do trabalho para a faculdade ao invés de estar na festa anual que o prefeito da cidade organizava no jardim do maior ponto turístico da região: O castelo.
— Por que você veio se era para ficar com essa cara? Francamente, lucas.
Vitor se pronunciou com um falso tom de reprovação na voz enquanto negava com a cabeça, fazendo Rodrigues fechar os próprios olhos para conter o impulso de tacar o liquido do copo em sua mão na direção do amigo.
—Ah você sabe, eu tenho um melhor amigo com problemas de rejeição que não aceitar ter um pedido negado.O mais novo respondeu em um tom irônico, mas lançou um breve sorriso ao amigo. Vitor Albuquerque e Lucas Rodrigues eram a definição de diferentes, desde sexualidade e crenças a forma de levar a vida, mas faziam parte da história um do outro desde sempre, ambos se jogariam na frente de uma arma carregada se significasse proteger um ao outro. Foi através do mais velho que Lucas descobriu sua sexualidade, eles estavam no segundo ano do ensino fundamental, Rodrigues havia machucado o joelho enquanto os dois brincavam no pátio da escola. Vitor o socorreu totalmente preocupado, inocente demais para saber que um machucado no joelho não era o fim do mundo, mesmo que estivesse sangrando. Lucas, que pelo drama do outro achou que estava correndo risco de morte, tomou coragem para contar ao amigo que estava apaixonado por ele, e que queria um beijo antes de chamarem a ambulância. Vitor então juntos os lábios de ambos por pouco mais de um segundo, o que para duas crianças já era muito. Albuquerque foi o primeiro a dizer que não havia sentido nada, Rodrigues demorou alguns segundos a mais para concluir que não estava apaixonado pelo amigo. Dois minutos depois a professora chegou e descobriram que um machucado, mesmo com sangue, podia ser resolvido com água e band-aid. E que as vezes, alguns acidentes acontecem por uma boa causa, naquele dia, ambos se tornaram inseparáveis, e o segredo de Lucas foi guardado a sete chaves por Vitor, ate Rodrigues estar pronto para contar ao mundo.
Enquanto o universitário comia o cachorro quente da barraquinha e aproveitava o resto do refrigerante no pequeno copo descartável que carregava, aproveitava para observar a festa ao redor. Era como todo ano, as flores do jardim se encontravam floridas devido a primavera, as pessoas passavam de u lado para o outro, geralmente procurando a barraquinha mais agradável para comer, havia cama elástica para crianças e piscina de bolinhas, e tiro ao alvo. Ano passado, Vitor havia conseguido um unicórnio e dado a Lucas, até hoje o bichinho de pelúcia ainda ocupava um lugar especial em seu quarto. A banda tocava algumas musicas brasileiras, ganhando uma boa atenção do público
— Eu achei uma cigana! E ela lê mãos, cara. Vamos logo, joga esse copo fora, vamos.
A aproximação repentina de Vitor foi o suficiente para atrair a atenção do mais novo, que por sua vez soltou um longo suspiro ao se aproximar de uma lixeira e jogando o copo e o papel do cachorro quente fora. Não acreditava em leitura de mãos, em destino ou qualquer coisa do tipo, mas seu amigo sim, e já tinha tido conversas demais para saber que quando era esse o assunto, tentar argumentar com o mais velho era inútil.
O seguiu sem muito entusiasmo enquanto Vitor continuava a falar, quando chegaram perto da cigana, Lucas franziu levemente a testa. Ela era linda, o cabelo ruivo cumprido, a pele branca como papel e os olhos azuis. Usava um vestido florido e tinha um sorriso amigável nos lábios.
—Vejo que voltou.
Falou em um tom calmo para Vitor, que anunciou que agora era a vez do amigo, e então o empurrou em direção a mulher que não deveria ter mais de vinte cinco anos. Lucas contra a vontade de revirar os olhos, deixando a cigana pegar em sua mão, as unhas grandes em tom preto deslizando pela palma da sua mão. Rodrigues observou quando o sorriso da mulher se encerrou, seu rosto ganhando uma aparência mais seria e apertando de forma nada delicada a mão do rapaz, que agora se encontrava com a testa franzida em confusão, tentando sutilmente se soltar.
— Eu sinto muito, mas seu caminho foi traçado a muito tempo, a séculos antes. Você não pode mudar, ninguém pode, ele já te achou. Vai acontecer novamente, a maldição esta marcada em sua alma.
A cigana falava com olhos realmente assustados, as palavras baixas como se estivesse contando um segredo antigo. Lucas, apesar de todas a descrença que carregava consigo, sentiu seu corpo tremer levemente e engolir em seco, finalmente tendo sua mão livre, mas antes mesmo que ele pudesse questionar o que havia acontecido, a ruiva já se afastava, olhando para os lados de forma desconfiada.
Foi Vitor que se mexeu primeiro, tocando o melhor amigo e olhando com atenção, como para garantir que ele estava inteiro.
—Isso foi sinistro, e pensar que para mim ela só falou que eu tinha um futuro pleno e iria morrer de velhice. Sabe, se você quiser admitir que ficou com medo e tudo mais...
—Eu não fiquei. – Lucas o interrompeu, mentindo. — Ela só deve ter sentido vontade de dar um showzinho por vê que você acredita em toda essa palhaçada. Agora, será que finalmente ganhei o direito de ir para a casa? Cara, eu te amo. Mas eu realmente preciso do conforto de casa agora.
O universitário sorrio para o amigo na tentativa de acalma-lo, tinha medo que Vitor acreditasse o suficiente naquilo para achar que o amigo realmente tivesse consigo uma maldição. Mas por mais que Lucas estivesse decidido a ignorar o estranho evento, algo dentro de si estava agitado, seu coração ainda estava acelerado e podia sentir a náusea irritante em seu estomago.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Entre o inferno e a terra.
RomanceSer homossexual em uma família cristã não é exatamente algo fácil, mas ser negro em um país tão racista quanto o Brasil pode ser algo igualmente difícil. Apesar de alguns fatores não favoráveis para Lucas, o garoto tem uma determinação admirável...