Epílogo

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Estava caminhando tranquilamente na praça, Delphine, minha dama de companhia, parecia querer estar em qualquer outro lugar. Não que eu pudesse culpa-la.

Fazia algumas semanas desde que papai decidira que eu deveria ter minha própria companhia, o que na minha opinião, não se enquadrava em vários quesitos justos. Não fazia nem um mês que completei dezesseis anos e mamãe já estava planejando festas, bailes, recepções e chás. Muitos e muitos chás, com cavalheiros que na pior das hipóteses teriam mais idade que meu próprio pai. Mas isso nunca seria importante, detalhes, eles diziam. O que importava era o dote, o título, a reputação para a família.

É assim a vida das mulheres, nascemos para o horror de nossos pais, e quando crescemos nos tornamos o pesadelo das mães — caso não consigam nos casar no tempo certo, tornando não só um escândalo para a família, como para reputação.

Uma vez perguntei a minha ama, como era ter liberdade de escolha. Para viver, amar e se casar com quem quisesse. A ama me disse, um pouco desoladora, que não tínhamos liberdade. E jamais teríamos, porque éramos mulheres e tínhamos um dever com nossos maridos.

Perguntei para o jardineiro, no outro dia, que deveres os homens tinham com as mulheres, e ele me respondeu, um pouco acanhado, que os homens eram responsáveis pelo sustento e a proteção. O que, pelo que notei, era um pouco equivocado. Nosso vizinho, o senhor Fitzwilliam, tinha o hábito de bater na esposa quando estava embreagado. Nas noites de pôquer, quando seus companheiros iam para a recepção da senhora Fitzwilliam, havia boatos terríveis do que acontecia durante a noite. E ninguém a protegia.

Nunca víamos a senhora Fitzwilliam no dia seguinte, e nem no próximo depois daquele, durante algumas semanas.

Mas a ama disse que era nosso dever. Então tudo bem se submeter ao marido porque ele nos protege e nos sustenta. Mas, quem queremos enganar? Se você debuta, precisa se casar o mais rápido possível antes dos vinte anos ou ficará falada. Se você tiver um pretendente, todos ficam curiosos para saber quando será o famoso pedido, ou ficará falada. Se ninguém a quiser, ficará falada. Se, se casar com um homem tão velho quanto seu pai, ficará falada.

Não importa o que você faça, se você é uma jovem mulher na alta sociedade, você tem três obrigações pelo resto de suas vidas: casar, ter filhos e cuidar da casa. Pobre de nós se não conseguirmos dar um herdeiro para nossos maridos, eles vão atrás de outras que podem e você ficará falada.

Pobre de nós fazer tanto esforço e morrer no parto, ganhará um quadro em sua homenagem e ele se casará com outra. E ainda sim, você ficará falada.

Então perguntei, finalmente a Delphine o que ela achava de ser uma dama de companhia, suspirando ela me disse o que os patrões querem ouvir, era uma grande honra. Mas, será que era mesmo?

— Senhorita, sua mãe pediu para que voltasse antes do sol ficar quente demais. Ela não quer que você se queime.

— Estou bem, não vou me queimar. Não com essa pavorosa sombrinha que tanto carrega.

Delphine me fitou, as sobrancelhas erguidas.

— É para seu próprio bem senhorita, além disso, moças descentes devem sempre andar com uma. Estão na moda este verão.

— Imagino que sim — disse, olhando em volta, enquanto percebia mais e mais garotas segurando delicadas sombrinhas embaixo do braço, deixando suas peles lisas e brilhosas para quaisquer pares de olhos masculinos a vista. — Algum dia, espero que sejamos valorizadas.

— Não diga essas coisas em voz alta — A criada repreendeu baixinho — Alguém pode ouvir.

É claro que podia. Todos estavam com os ouvidos bem atentos, sempre.

Primeira regra para uma jovem dama: Não fale o que pensa.

— Delphine, vamos para casa. Não há nada aqui para mim.

Era uma vez, Maria Alicia • A Garota que Mudaria o MundoOnde histórias criam vida. Descubra agora