- Eu acho que ele é.
Olhei para Hannah por cima do ombro, e depois voltei a olhar para o homem sobre o qual... bem... fofocávamos. Ele era o mais novo pretendente da mãe dela, um troféu sendo exibido no jantar de aniversário da filha. Pessoas ricas eram estranhas...
Estudei-o de cima a baixo. Tinha cabelo prateados pelo tempo, bem penteados e aparentemente recém cortados. Usava um terno preto simples e bonito, com uma gravata azul escuro. Porém algo no tecido dele me dizia que ele não era nada barato; não que isso fosse um problema, já que o relógio prateado no pulso e os sapatos bem envernizados nos pés do homem também não pareciam nada baratos. Ele ainda tinha um sorriso caloroso, e conversava animadamente com os parentes de Hannah, acompanhando a mãe da mulher pelo salão. Eles formavam um casal bonito, pelo menos dali onde eu os observava.
- Não acho que seja... – disse, depois de suspirar. Mexi-me na cadeira, tentando recolocar meu vestido em seu lugar, pela quinta vez.
- É claro que é, Eve! Todos os sinais estão na nossa cara! – ela disse, sussurrando um tanto alto demais. Ela mordeu a ponta do dedo. – Mamãe vai ficar arrasada...
- Ela vai ficar mais ainda se ver você assim no dia do seu aniversário.
- Mas como posso evitar?! Ela já se magoou demais...
Sustentei o olhar sobre ela durante um tempo. Hannah tinha uma empatia imensurável e uma conexão profunda com a mãe. Aquele já era o quarto relacionamento dela depois do divórcio e eu já vira como ela ficava quando terminava com alguém por qualquer motivo que fosse: se afastava da vida, uma mulher sempre tão vaidosa e que gostava de viajar de repente se prendendo em seu quarto e esquecendo-se de um banho por dias. No mais, seria um pena: como já disse, eles formavam um casal bonito.
- Sobre o que estamos conversando?
Ian se aproximou, sentando-se na outra cadeira vazia. Só nos três ocupávamos aquela mesa, já que Hannah não convidava seus outros amigos para jantares como aqueles. "Só os meus melhores amigos vão", ela sempre dizia isso, e por isso eu e o ruivo estávamos lá. Os outros (e a gente também, claro) eram convidados para passar uma noite em alguma boate ou algo assim.
- Hannah está desconfiada do namorado da mãe dela.
- Por quê?
Ele fez a pergunta a ela, mas Hannah não respondeu, não desviando a atenção do casal. Ele também voltou-se para eles, estreitando os olhos. Depois de um movimento por parte do outro, uma luz pareceu banhar sua expressão.
- Você não acha que...?
- Você também acha?! – ela finalmente voltou-se para ele.
- Não. Só queria te distrair.
Hannah bateu nele, enquanto Ian se esquivava e eu me limitava a rir.
- Vocês estão brincando com algo sério!
- Você que está enxergando coisas onde não tem. - disse, me mexendo mais uma vez para tentar arrumar o vestido. Nada. – Eles parecem perfeitamente bem para mim.
- Esse é o problema: mamãe coloca muita confiança nas pessoas para nada. Depois, fica chorando por aí. – ela fez uma pausa. - Temo por ela, temo que isso possa acontecer de novo. Ela é mais velha que eu mas não sei se aguentaria isso de novo...
Por um instante, achei que ela iria chorar. Inclinei-me para frente, mas Ian foi mais rápido, pegando as mãos dela e tomando sua atenção. Ótimo: ele era o amigo sentimental mesmo.
- Não acho que você deva se preocupar tanto, Ann. Sua mãe é grande o suficiente para saber lidar com isso.
- Eu sei disso, Ian, mas...
- Além disso, - ele a interrompeu - não precisa confiar nele, no fim das contas. Realmente existem muitos canalhas por aí e ele definitivamente pode ser um deles. Deveria confiar mais na sua mãe, acreditar que ela vai conseguir sair disso numa boa se for o caso.
- Eu confio nela... Mas ainda assim não quero vê-la machucada.
- Bom, pelo menos ela está aproveitando o momento. – sorri. – Foi algo que ela já disse pra gente, lembra? "Aproveitar o presente enquanto dádiva" ou algo assim.
Um sorriso mínimo esboçou-se nos lábios dela e eu me dei por satisfeita. Ian também pareceu se acalmar, voltando a se encostar na parte detrás de sua cadeira.
- No mais, se ele magoá-la, eu mato ele. – ele disse, simplesmente.
Ambas olhamos para o ruivo, que estreitava os olhos encarando o homem. Não pudemos deixar de rir e ele não demorou a nos acompanhar. Por fim, nos três olhamos para o casal.
Outro gesto.
- É, ele não é.
- Definitivamente não.
- Ufa... – Hannah relaxou o corpo, toda sua tensão esvaindo-se em um segundo. - Agora posso começar a festejar! Vou buscar as bebidas e vocês esperam aqui!
Ela se afastou, a mudança de humor repentina acompanhando-a pelo salão. Mordi o lábio, contendo outra risada.
- Realmente mataria ele?
- Você me conhece pouco, Evelyn Ross. Mas – Ian se levantou, estendendo a mão para mim. – me conhece o suficiente para saber que gosto de dançar.
- Ótimo. – aceitei a mão de bom grado. – Talvez dançando eu consiga colocar esse vestido no lugar.
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É o que eu vejo
ContoOne-shot inspirada na música The other team, da UPSAHL. História planejada, desconfiada e escrita para o desafio mensal da página do Facebook Sodalício das Pétalas. Este é o quarto de uma série de contos sobre Eve e Ian.