Naquele dia fui para a casa do meu pai. As ruas estavam movimentadas e a pequena cidade parecia menor do que nunca com a grande quantidade de pessoas que transitavam por ali.A casa ficava do outro lado da cidade, então peguei o ônibus que me levava até um ponto próximo e percorri o restante do caminho a pé. Uma leve chuva molhou minha calça jeans e minha camisa preta, e ensopou minhas botas de cano baixo.
É incrível como até o clima parece não estar ao nosso favor quando o dia não está dos melhores.
O lugar em que eu, particularmente, acho que deveria morar, era uma casa relativamente grande, com dois andares e uma varanda bonitinha que minha madrasta insistira em construir para acomodar samambaias e trepadeiras no andar de cima. A construção amarela que meu pai batalhara tanto para construir apenas para dar o conforto que sua família merecia só foi meu lar por um curto período de tempo, alguns meses ou um ano, não me lembro mais. Vivi meus dias mais felizes ali, brincando no quintal grande e pregando peças em Colin, antes de minha mãe trocar meu pai pelo primeiro cara rico que apareceu a sua frente, e ganhar na justiça a guarda dos filhos.
É, a minha família era um tanto complicada. Ainda é, por assim dizer.
Não preciso bater à porta, porque a noiva do meu pai (eles não eram casados ainda), uma mulher extraordinária de cabelos ruivos e pele levemente bronzeada me viu do lugar em que estava na varanda, e correu para abrir a porta.
Parece errado, mas eu a achava uns dez níveis melhor que a minha mãe.
Ela me recebeu com um abraço caloroso e olhou com uma cara feia para minhas roupas ensopadas.
- Pois é - eu ri, e ela me mandou entrar e tomar café enquanto buscava roupas secas.
- Seu pai está na mesa - falou ela antes de sumir no corredor do andar de cima.
Caminhei para a cozinha; a casa toda parecia um grande chalé de contos de fadas; plantas artificiais decoravam tudo quanto é canto, e quando eu digo tudo, quero dizer até as paredes.
Quando adentrei a cozinha os olhos de meu pai subiram do jornal para mim, e nós sorrimos um para o outro enquanto fazia um gesto para que eu me aproximasse. Ele era diferente de minha mãe de tantos modos...
A barba por fazer o fazia parecer mais velho do que realmente era, por mais que ele não aparentasse ter seus bons 40 anos. Seus olhos eram - são - iguais aos meus, de um castanho escuro, a única diferença, por mais que pareça exageradamente clichê, é que eles brilham, enquanto os meus estão opacos a muito, muito tempo.
- Você está ensopada! - disse ele rindo à guisa de bom dia.
- Eu também estava com saudade - eu respondi rindo e me sentando à mesa, logo em seguida me servindo de suco. - Cíntia foi pegar umas roupas secas pra mim.
Ele assentiu.
- Como você está? - ele perguntou e senti seus olhos preocupados sob mim mesmo estando com o olhar fixo em meu suco. Meu pai sabia do incidente com meu padrasto, e até tentou levá-lo à justiça; mas perdeu o caso, porque minha mãe fez um belo teatro ao negar tudo. Depois disso ele passou a ligar com mais frequência e casualmente chamar-me para visitá-lo quase que cinco vezes por semana.
- Terminei o namoro - respondi olhando para ele como se aquilo não tivesse importância.
- Sinceramente - ele franziu a testa - já estava na hora. Além de aquele garoto parecer uma versão vinda da deep web do Shanw Mendes, ele era bem idiota. Nunca ligava quando eu mostrava minha coleção antiga de CDs e não se incomodava em disfarçar o tédio quando jantávamos juntos.
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Nossos Demônios Internos
Ngẫu nhiênDespertamos o que há de pior em nós, nossos demônios internos. Hanna é alguém que aprendeu da pior forma sobre a vida. Com conflitos familiares, decepções amorosas, e várias outras situações deploráveis pelas quais passou, ela desiste, desiste de te...