Uma Surpresa em Forma de Amor [Degustação]

Prólogo

Eu não poderia estar com raiva. Era errado. Muito errado estar com raiva daquilo. Eu deveria estar soltando fogos de felicidade, afinal meu melhor amigo iria casar, não é? Ele estava sorridente, com aqueles olhos castanhos perdidos nos próprios sonhos, falando da noiva como se ela fosse um anjo criado por Deus apenas para alegrar e iluminar a sociedade obscura. 

Enquanto ele falava dela com paixão, o meu café  esfriava e por dentro eu desmoronava. Mordi um pouco a língua para segurar a droga das lágrimas que queriam sair. Se fossem bem pouquinhas, eu diria que era por conta da emoção de ver meu querido amigo indo ao encontro de um final feliz ao lado da mulher que ele realmente amava. 

Foi um soco no estômago dado com delicadeza, contudo não deixou de ser um soco no estômago. Creio que no fundo, George sempre soube que eu tinha uma quedinha por ele. Só não poderia imaginar que nos últimos meses eu vinha me apaixonando de verdade. Daquele jeito intenso, forte mas ao mesmo tempo manso. Aquela vontade boa de ficar ao lado da pessoa até o fim! Até  que a morte nos separasse. Não até que Juliana nos separasse. 

Nada contra ela. Só inveja mesmo. Até porque o cara que agora é noivo dela, foi possivelmente o primeiro amor da minha vida. 

Depois de sair da cafeteria KaFê completamente desnorteada, fingindo que precisava ir pra casa por conta de uma enxaqueca repentina, voltei para o Campus. Chegando no dormitório feminino, disparei em direção ao meu quarto mal contendo os soluços que eclodiam do meu peito dolorido. Culpa dessa má sorte que é se apaixonar pela pessoa errada. Tipo seu melhor amigo que não tem o mínimo de interesse romântico em você.

   

Chegando ao meu destino, no auge do meu desapontamento, entrei o mais rápido que pude e bati a porta com força. Eu estava sozinha, sem a Mila (minha amiga e colega de quarto) para me amparar, então me conformei com a solidão enquanto deslizava  pela porta dramaticamente vivendo um choro silencioso e de gosto amargo. Constantemente perguntando a Deus o motivo de toda aquela esperança  de um dia estar com o George, ter acabado de forma bruta em um Café fofinho, depois de eu decidir que daquela tarde não passaria e que ali eu abriria meu coração pra ele. 

Levantei furiosa e já na minha cama comecei a socar o travesseiro. Soquei com muita raiva, com muita força, no entanto a fúria e o sentimento de desilusão não passaram. Resolvi intensificar o processo. Fui socar os cobertores que estavam na prateleira ao lado da porta de nosso quarto. Soquei, soquei os cobertores com ódio da paixão que eu ainda sentia. E no derradeiro soco, de alguma forma errei a direção e acabei socando a própria porta. Esmurrei a madeira rígida da porta com tanta determinação que meu dedo mindinho da mão direita doeu como se houvesse quebrado. Gritei irritada com minha imensa estupidez e depois chorei desolada. 

Chorei pelo dedo.

Chorei pelo George. 

Chorei pelo café expresso desperdiçado por mim.

Chorei pelo dedo outra vez.

Chorei por ter esmurrado  coisas e parecer uma louca raivosa. 

Chorei pelo George.

Chorei pelo dedo. 

Chorei mais ainda quando a Mila chegou no quarto e me viu com o rosto molhado de tanto chorar, meus longos fios pretos completamente bagunçados e o dedinho da mão direita inchado  e vermelho como um pimentão. 

— Meu Deus! Amiga, eu volto um pouco tarde e isso acontece? Prometo nunca mais te deixar sozinha! O que aconteceu, Luz? — ela perguntou aflita. 

— Eu… eu… eu — solucei chorosa —  bati o dedo na porta enquanto… enquanto tentava pegar um cobertor.

— Mas essa tarde está muito quente, meu bem. E como isso aconteceu? —  Mila apertou os olhos cismada com minha resposta, e como se tivesse voltado a dimensão normal se alarmou outra vez com meu dedo — Amiga, enxuga esses olhos, pega sua bolsa e vamos para a enfermaria agora!