1- Lágrimas na enfermaria

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Janeiro

 Luz.

— Luz, não estou acreditando nessa sua história. Tá, a gente sabe que apesar de ser um crânio  quando o assunto é literatura, seu maior dom mesmo é ser estabanada. Mas não a ponto de quebrar o dedinho enquanto tenta pegar um cobertor. 

— Camila, seu discurso de desconfiança não está ajudando a passar a dor, tá bom? 

— Luz? — Olhei pra Mila, ainda com o olhar de um cãozinho abandonado e lágrimas descendo pelo canto dos olhos —  Amiga, isso tem a ver com o noivado do George? Ele me ligou hoje pouco antes de eu chegar no quarto e me disse que está  noivo da Juliana. Juro que na hora fiquei sem reação e tudo. Foi tão de repente, eles nem namoravam … — ela fez um muxoxo — A questão é que sei o que você sente por ele, Luz.

— Amiga… —  minha voz embargou — acho que o cobertor não  era pra mim, mas eu queria tanto ser abraçada pelo cobertor… — falei figuradamente, fungando —  orei por muito tempo para ter aquele cobertor, e hoje seria minha confirmação, mas não  pensei que buscar o cobertor iria me machucar tanto.

Ela me envolveu num abraço carinhoso e me acomodou no seu ombro, enquanto aguardávamos por atendimento, sentadas nas cadeiras acolchoadas da recepção da enfermaria. Mais soluços e lágrimas. De verdade, eu não  sabia o que mais doía  naquele momento. O dedo ou o coração partido. 

— Ao menos concordamos com o fato daquela pancinha do George deixar ele bem fofinho… — Mila disse tentando me fazer rir. Eu estraguei seus planos soluçando e permitindo que as novas lágrimas que me vinham aos olhos deslizassem até a manga de sua camisa polo. 

— Eu queria muito me aconchegar nele, naquele abraço gordinho e carinhoso. Tirar um cochilo à tarde abraçada a ele… — mais soluço — Eu sou uma estúpida mesmo! Agora o que  ele quer é passar a lua de mel com a Juliana nos Lençóis Maranhenses. Tenho certeza que vai ser lá, já que a Juliana sempre sonhou em conhecer o lugar— de repente parei ergui a cabeça e declarei depois de pensar melhor — E se eles forem para Morro de São Paulo, Mila? Eu sempre sonhei em passar Lua de Mel lá— voltei a abrir as comportas da minha represa emocional e deitei outra vez no ombro da minha amiga. 

— Ah, meu bem! Pode chorar — ela batia com carinho nas minhas costas — pelo menos as pessoas vão  pensar que é por causa desse pimentão preso a sua mão. 

Chorei por mais alguns poucos minutos e depois só solucei, envolvida pelo braço de Mila, aguardando minha vez de ser atendida pelo Ortopedista do Campus. 

— Luzia Alcântara de Assis? Sua vez, querida — a recepcionista avisou vindo até  mim— Vá à sala quatro, Luz. Logo, logo essa dor vai passar. Já vou providenciar o paracetamol que ele pediu para eu dar a você. Expliquei o caso ao Dr. Conte e ele aconselhou-me a buscar o analgésico.  

— Obrigada, Samanta. Você  é um doce— tentei sorrir pra ela.

— De nada, querida! — Tata me beijou a testa e saiu.

Assim que ela se foi, Mila limpou meu rosto e me encorajou a ir para a sala quatro. 

Entrei no consultório que o ortopedista dividia com o clínico geral e o vi sozinho, sentado atrás de uma mesa de escritório branca com tampo de vidro. 

— Luzia, numa escala de 1 a 10, como está  a sua dor? — Ele me perguntou depois de me cumprimentar e pedir para eu sentar na cadeira de frente à sua mesa. 

Olhei para as íris  azuis dele e tive vontade de gritar  “olha pros meus olhos inchados de tanto chorar e adivinhe", contudo isso seria muito injusto. Primeiro, por ele apenas estar fazendo o trabalho dele. Segundo, por eu não ter chorado apenas pelo dedo. 

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⏰ Última atualização: Jun 13, 2021 ⏰

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Uma Surpresa em Forma de Amor [Degustação]Onde histórias criam vida. Descubra agora