Limpando a consciência

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A loira alta se olhava no espelho, satisfeita com o resultado. Não que precisa de muito esforço para ficar linda. E caso precisasse, ser uma gigante já serviria para deixar seu sex appeal nas alturas.

Desce as escadas do casarão de última geração e decoração rústica. Encontrando sua querida família na sala.

- Sem dó nem piedade dos pequenos mortais – Vidar Jutul, seu pai naquela geração, diz da cozinha onde enchia um copo com vinho branco – Assim que eu gosto – Levanta a taça como se brindasse.

Saxa sorri satisfeita.

- Obrigada papa.

- O baile é só no final do ano – O irmão desdenha do sofá, sem tanto ânimo assim.

- Guarde suas frustrações de não conseguir conquistar você sabe quem, para você.

- Não tenho a necessidade de ter todos os garotos e garotas aos meus pés como você.

- Acontece naturalmente. Não posso evitar – Se gaba.

- Meninos... – Ran surge na sala, tão bem vestida quanto os demais – Todos prontos?

- Sim. Vou no meu carro – Fjor se levanta.

Ran assente e volta seu olhar para a filha.

- E você?

- Vou... – Começa a dizer que iria com ela, mas ao encarar as expressões da mulher, logo percebe que ela teria planos aquela noite – Acho vou com o meu também...

Os três adentraram o ambiente iluminado, podendo sentir o calor e a energia do lugar. Desejo e tensão sexual emanavam alucinantes.

Eram instintivamente sensitivos.

- É disso que eu tô falando – Fjor abre os braços e fecha os olhos aproveitando a atmosfera.

- Divirtam-se, mas sem esquecer que vocês são os filhos da diretora – Ran diz, afastando-se até onde estava o corpo docente da escola. A festa era uma espécie de arrecadação de fundos e havia sido proposta por Erik, o solitário professor de história que havia perdido a esposa há alguns anos. Mas não era nele que a atenção da diretora estava focada aquela noite... Varre os olhos pelo local, logo encontrando os alvos de seu desejo. Era a matriarca no teatro daquela família perfeita, mas isso não queria dizer que não poderia se divertir de vez em quando.

Saxa havia ficado na pista de dança depois de Fjor sumir atrás de Gry. Fecha os olhos se deixando embalar pela música. Sentia o seu corpo todo pulsar. Adorava a vulnerabilidade das pessoas a sua volta. Sentia-se ainda mais poderosa.

Abre os olhos verde âmbar encontrando a figura desajeitada do outro lado da pista. Uma peça que geralmente não se encaixava no quebra cabeças daquele lugar, ainda mais em um dia como aquele.

- Vadia esnobe...

- Você é boa demais para Saxa. Ela não merece você.

As palavras pairam em sua mente como nuvens densas e carregadas do despeito que lhe trouxeram. Se havia ouvido a conversa entre os dois seres mais estranhos da escola? Sim. Alguns gigantes tinham habilidades sobrenaturais e Saxa era um deles. Podia induzir os sentidos ao toque de suas mãos e, por isso, os seus próprios eram mais aguçados. Sabia da paixonite secreta da senhorita Green Peace por ela? Sim. Não era nenhuma grande novidade. Atraía aquilo para si por todos os lados que passava. Era corriqueiro.

Concordava com o que havia ouvido? Não. Em nenhuma situação possível aquilo se aplicaria. Ninguém era bom demais para Saxa Jutul. Ninguém estava acima dela. Acima dos gigantes.

Se põe a caminhar graciosamente em direção a garota sentada sozinha em um canto mal iluminado. Pega uma garrafinha de água no caminho, jogando-a no chão assim que para frente a garota.

- Isolde! Garrafa de plástico a vista – Diz em um tom alarmado. Os olhos azuis da garota a encaram assustados, para logo depois assumirem um semblante contrariado e um tanto envergonhado com a cena que Saxa fazia. Alguns alunos haviam notado e já riam da garota – Vamos... Você não vai pegar?

Isolde se praguejava por ter saído de casa aquele dia. Não era um bom dia para sua família. O que havia ido fazer ali mesmo? Fácil. A festa era iniciativa de seu pai e jamais faria essa desfeita a ele. Contava que passaria despercebida em seu canto, mas claro que algum dos descolados da escola não permitiria aquilo.

Poderia pelo menos, não ser Saxa. Pois sempre ficava petrificada por algum tempo frente a garota. Recuperando sua habilidade de agir, revira os grandes olhos azuis, levantando-se.

Mesmo que Isolde fosse um pouco mais alta que a outra, a diferença de altura entre elas era notável. Por conta do salto que Saxa usava, mas a menina de cabelos coloridos não se deixou intimidar.

- Pode zombar – Diz após uma longa troca de olhares. Se abaixa, pegando a garrafa calmamente – Pelo menos, a minha consciência é limpa. E quanto a sua? – Pergunta, abrindo a garrafa – Talvez precise de uma ajudinha...

Antes que Isolde pudesse controlar os próprios impulsos e Saxa previsse o que estava por vir, a garrafa estava vazia e a Jutul mais nova estava encharcada.

- Você não fez isso – Fecha os punhos e já se preparava para voar em cima da mais baixa quando Magne aparece do nada, se pondo entre elas, protegendo Isolde.

- Deixe-a em paz.

- Saia. Da. Minha. Frente – O encara de forma ameaçadora. Já começava a sentir a ebulição em seu corpo. O sangue corria quente em suas veias. A vontade de reagir com sua natureza começando a tomar conta de si.

O pequeno tumulto tomou proporções maiores, conforme os outros alunos se aproximavam, até que toda a escola estivesse ali. Inclusive Ran e Erik.

- Algum problema aqui? Saxa... Magne... – A diretora começa do jeito calmo e imponente de sempre. Se estica um pouco mais podendo ver a garota atrás de Magne que segurava a garrafa de água vazia – Isolde... – Já imaginava o que acontecera ali.

- Olha o que essa selvagem fez as minhas roupas. Isso aqui é Prada, sabia?

- Ela começou... – Isolde devolve. Já não mais se protegia atrás do amigo.
Saxa a encarava mortiferamente.
Ran apoia uma mão sobre o ombro da filha.

- Tenho certeza que existe uma forma diplomática e pacífica de resolvermos esse mal entendido e darmos continuidade a festa... – Diz brandamente para os que assistiam de fora, mas como um aviso a Saxa para que controlasse seu pantin e instintos e não impedisse seus planos.

- Eu sinto muito por isso – Erik se coloca a tentar apaziguar a situação falando pela filha. O que não adiantou muito.

- Pois eu não – A garota devolve cruzando os braços.

- Isolde, querida...

A menina não dá ouvidos. Lança um olhar marejado em direção ao pai. Alterando-o entre ele, Saxa e a diretora e logo se põe a correr, empurrando as pessoas que estavam em seu caminho, saindo dali em disparada. Odiando-se por estar tão frágil aquele dia.

- Me desculpe por isso – Eric diz, enfiando as mãos nos bolsos da calça – Hoje é o aniversário de falecimento da mãe dela – Começa com pesar – Não é um bom dia para ela e... Eu a pressionei a vir a festa mesmo assim.

- Oh Erik. Está tudo bem – Ran afaga os ombros do homem – Não foi nada demais, não é, Saxa?!

Saxa sorri forçadamente. Concordando com a cabeça.

- Claro – Finge mais uma emoção que não sentia. A empatia - Todos temos nossos dias ruins... Eu não fazia ideia. Sinto muito senhor Eidsvoll.

O professor de história assente constrangido por toda atenção chamada para eles. E aos poucos a aglomeração vai se dissipando. E a festa voltando ao normal.

Ran lança um último olhar a Saxa que bufa, saindo dali. Sua festa havia acabado. Não ficaria ali ensopada do jeito que estava.

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