O cachorro Feio

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Meus vizinhos de rua me contam que há um ano andei pelas calçadas sujas da cidade onde moro um cachorro que todos chamavam Feio.
De acordo com o homem na esquina, o cachorro tinha apenas três pernas e pouquíssimos pelos, e era tão desagradável que dava medo.
Até aquele momento não tinha tido o prazer ou a infelicidade de topar com o dito cão vadio, mas naquela tarde, depois de ter revirado o lixo de todos os vizinhos —onde não encontrei nada que me servisse de comer, e com o estômago tão vazio que nem mesmo o rugido de um leão poderia competir com ele— tropecei com alguma coisa e caí no chão. Meu corpo machucado estava tão fraco que não consegui segurar as paredes do beco, e machuquei meus velhos  joelhos.
A dor era insuportável e pensei que não escaparia até que a visse, emergindo de debaixo das caixas de papelão no fundo do beco estava a criatura mais feia que eu já tinha visto na minha vida, me chocou tanto que até esqueceu-se da dor.
Disse a mim mesmo que aquele devia ser o cachorro feio de que tanto falavam meus vizinhos sem-teto, e sua avaliação foi mais do que correta.
O caso era, meus amigos, que tal criatura veio ao meu infeliz encontro, e quando pensei que o meu dia não poderia ser pior, o bendito cão começou a latir sem parar, o que me causou uma dor de cabeça que até agora não tinha tido, e isso me lembrou da dor no joelho. Eu disse a ele para calar a boca, mas o muito feio não parava.
O latido era tão alto que chamou a atenção de um grupo de jovens que passeava pela calçada em frente e eles ficaram curiosos com o espetáculo montado pelo cachorro, ficando perplexos com aquela pintura (um velho sujo com um rosto de sofrimento e uma criatura tão feia, que o mais aconselhável era desviar o olhar, por causa dos olhos bons que nos viram), e resolveram dar uma mão a este velho; com tanta sorte, entre eles estava um médico que, depois de checar meus joelhos, me disse para não me preocupar porque não era nada sério.
Agradeci a ajuda e eles voltaram —já fizeram o suficiente, porque quem passa hoje para ajudar um velho e sujo sem-teto?— e olhei para o meu salvador, aquele cachorro que todos chamam de feio e eu disse:
—Para eles você será um animal muito feio, mas a partir de hoje é meu único e fiel companheiro.
Naquela noite, sob o calor da minha humilde caixa e dos meus cobertores fofos, meu cachorro feio e eu dormimos, esperando sobreviver a um novo dia.
Pelo menos eu não estava mais sozinho.

O cachorro FeioOnde histórias criam vida. Descubra agora