exício

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Jimin tem certeza de que está morto.

Pisca os olhos e sente o cheiro da própria carne apodrecida, mas o que há de errado consigo? Se pergunta por que ainda está preso neste corpo, se já não respira a tanto tempo.

Há um buraco de bala em sua testa, como um atestado claro de que "vivo" não deve ser um adjetivo atribuído a si, não mais. 

Entretanto, ainda está consciente, anda e também ouve, mas está claro a qualquer um: não vive. 

Qual seu problema? Se perguntado em existência, diria: todos. Neste momento, todavia, quer apenas voltar a ser pó. 

"Você.. está acordado?"

Seus ouvidos cinzentos captam a voz hesitante perguntar e, num gesto automático, vira o rosto em direção ao som, como um boneco enferrujado faria. Lentamente, repleto de ruídos irritantes e visualmente medonhos.

"Estou, mas não deveria estar. O que fez comigo?"

Responde, sentindo farpas na garganta, até mesmo falar é doloroso, pensar que provavelmente faz parte do castigo. 

"Queria pedir desculpas. Por isso o trouxe."

A silhueta é a única coisa que se pode ver no breu daquele cômodo, mas Jimin nunca confundiria aquele formato, tampouco a melodiosa voz. 

"Por ter me matado?"

Seokjin suspirou. Pedindo à sua deusa que lhe enviasse calma, pois a cólera o tomara tantas vezes que sabia: não haveria perdão para si. Nem da terra, nem da deusa, de ninguém. 

"Não, você mereceu. Ainda penso todos os dias que foi a melhor coisa que fiz em minha infeliz existência."

"Então pelo que, Jin? Esse é mais um de seus jogos profanos?"

Silêncio. SeokJin levantou-se, pegou um galão branco do canto de uma das paredes manchadas e jogou todo o conteúdo líquido na banheira suja que havia ali. A luz de uma vela se acendeu como mágica, soltando no ar o cheiro cítrico de mandarina que contrastava de forma um tanto infame com o cheiro de morte. O ar estranhamente rarefeito parecia ainda pior e mal cheiroso a cada momento que se passava.

"Entre, vai sumir um pouco com esse seu cheiro podre"

Jimin levantou-se do chão. Apoiando-se na parede revestida em cerâmica. Sentiu que fazia isso sendo controlado por fios invisíveis, como uma marionete em tamanho real. Entrou na água, não gostou da sensação. Odiou mais do que estar ali. 

"Em toda minha vida, você foi meu maior arrependimento, sabia?"

A voz calma retornou, ignorando a pergunta anterior. Seokjin andava pelo banheiro velho, acendendo mais e mais velas, com cheiros diferentes que tornavam-se cada vez mais insuportáveis ao se misturar. 

"Sim, a bala dentro da minha cabeça deixou isso bem claro"

"Mas.. Você também foi responsável pelos meus momentos mais felizes. Eu só queria ter sido o suficiente para te impedir de virar um babaca."

"Sinto informar mas já estou morto, é tarde demais. Tarde para tudo, Jin."

"Sei disso."

Ao terminar, sentou-se num banquinho que parecia prestes a quebrar, mantendo uma distância segura de onde estava Jimin, mas sem nunca tirar seus olhos dele. Encarava-o com desconfiança, mágoa e também com a pior de todas elas: raiva. Esta totalmente camuflada pelo tom de calmaria. Fingia serenidade como um ator renomado faria. 

"Então apenas deixe-me morto, como estava antes. Fará bem para a sua paz e para a minha."

"Não." 

.defunção | jinmin Onde histórias criam vida. Descubra agora