Eda - Kiraz

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Eda contou de novo até dez em sua cabeça e apertou a mão de sua tia com a maior força que conseguiu. As contrações estavam cada vez mais frequentes e doloridas e ela já não sabia muito o que fazer para aliviar o desconforto. Já estava em trabalho de parto há boas horas e sentia que o tempo passava a passos de tartaruga, como se os últimos 9 meses fossem pouco perto da demora que enfrentava naquele momento. 

Ayfer sorriu fraco para a sobrinha e devagar desvencilhou seus dedos dos dela, levantando-se em seguida para buscar água para a sobrinha. Eda colocou as mãos na barriga e chamou Melo baixinho, pedindo para que se aproximasse o máximo possível. 

- Você está com seu telefone aí? - Perguntou rápido, tentando aproveitar o momento entre uma contração e outra para raciocinar. 

- Meu telefone, Dada? - A amiga respondeu confusa. 

- Sim, sim, seu telefone. Ele está aí? 

- Ele está na minha bolsa, posso pegá-lo se for importante, mas para o que você...

- Serkan, Melo. Ligue para o Serkan agora. - Ela falou já sentindo uma pequena dor começar a tomar conta de seu corpo mais uma vez. 

- Dada? Você está passando bem? - Melo indagou colocando a mão na testa da amiga para sentir a temperatura. - Eu não posso ligar para o eniste, não, não. Ele não sabe da bebê! 

- Melo, eu preciso dele. Ele vai descobrir assim então. Hadi, hadi, ligue para ele agora, por favor. - Eda disse sem nem se importar com a aproximação da tia, que vinha com uma expressão de dúvidas no rosto. Ela tinha problemas maiores para resolver que a possível insatisfação de Ayfer.   

- Tudo bem, querida? - Ela perguntou entregando a água para Eda, que bebeu tudo em um gole só. - Melo?

- Está tudo bem, hala, é só que... 

- Eu quero o Serkan. - Eda falou simplesmente, como se o homem estivesse no quarto ao lado e pudesse apenas ser chamado para entrar ali. - Eu quero ouvir a voz dele agora, hala, eu preciso dele aqui. 

-Eda nós decidimos juntas tirar esse homem da sua vida! Você não pode mudar de ideia agora, não quando está prestes a ter uma filha que ele nem ao menos queria. - Ayfer falou desgostosa, recebendo um olhar duro de Eda como resposta. 

- Eu não me importo com mais nada disso. Errei, mudei de ideia e quero que ele veja tudo.  - Eda abriu os olhos já deixando as lágrimas caírem. Ela levaria a culpa de bom grado se isso significasse trazer Serkan de volta, pediria quantas desculpas fossem necessárias se ele simplesmente concordasse em entrar num avião e fosse ao seu encontro. - Melo, Hala, por favor... 

Melo olhou com pena para a menina chorosa. Ela sabia que a amiga estava sofrendo por ter que dar à luz sem que Serkan estivesse ali. Eda havia chorado em seu ombro inúmeras vezes imaginando o momento, e, na noite anterior, tinha confessado num sussurro que a dor de não tê-lo junto para aproveitar os momentos da gravidez a dilacerava por dentro. Direcionava toda a força que tinha os pensamentos sobre sua bebê, mas não sabia quanto tempo aguentaria mais...

- Dada, sei que é difícil e que você está frágil agora... - Melo começou baixinho, beijando a mão da amiga enquanto ela a apertava com força durante uma contração. - Mas não vamos estragar tudo o que fizemos até agora, tá bem?

- Eu não vou conseguir, Melo. - Eda disse chateada e Ayfer sentiu seu coração apertar também. Tinha se forçado a odiar Serkan por tudo que Eda havia passado com ele, mas não podia negar que a menina o amava além do que ela mesmo podia compreender. 

- Querida, você é forte, decidida, a mulher mais corajosa que conheço. - A tia disse acariciando devagar a barriga de Eda pelo o que ela achou ser a última vez. - Você consegue fazer o que quiser e não precisa de ninguém além do seu anjinho para fazer tudo funcionar. Vamos lá, devagar, traga a sua bebê até nós e, então, se você ainda quiser, nós ligaremos para Serkan.

- Não. Liguem para ele agora. Não precisa durar muito, eu só quero ouvir um pouco. - Ela choramingou e Melo mordeu o lábio assentindo devagar. Não iriam mais negar, Eda estava decidida. - Ligue do meu celular mesmo, ele não tem o número, mas você vai achar o dele por lá... é o contato de emergência, apenas pressione 1.   

Ayfer suspirou e retirou o telefone de Eda da bolsa que ela havia trazido mais cedo. Sorriu triste para a foto de plano de fundo. Ela e Serkan, sorrindo, no que pareciam séculos atrás. Engoliu em seco e entregou o aparelho para Melo, que segundos depois o estendeu para Eda. A menina colocou-o no ouvido e, muito embora continuasse com as dores do parto, pareceu relaxar instantaneamente. 

Eda sentia seu coração bater tão forte que tinha medo de causar algum problema para sua filha, então se forçou a respirar fundo enquanto ouvia os toques espaçados da ligação. Será que ele atenderia? Será que estava esperando que ela ligasse?

Mas o telefone tocou, tocou, tocou... e desligou. 

Ele não estava. Não estaria lá por elas. Ela estava sozinha. 

Fechou seus olhos o mais forte que pôde e deixou com que o celular caísse ao seu lado na cama, concentrando-se na dor física o máximo que conseguiu, fazendo ela tomar todos os seus pensamentos de forma a tirar todo o machucado emocional que ainda insistia em latejar. Ela sobreviveria, tinha feito isso até o momento, precisava continuar. 

- Dada? - Melo perguntou preocupada. Eda apenas balançou a cabeça negativamente, não queria falar naquele momento. Sentiu suas mãos serem apertadas com força, cada uma delas por uma das mulheres que a acompanhava e retribuiu o aperto de mão. 

O tempo então pareceu correr a partir dali. Se antes os segundos pareciam horas, agora Eda sentia que as contrações aconteciam em apenas alguns milésimos, como se fossem pequenos arranhões periódicos em seu ventre. Quando percebeu, já estava deitada na maca com os médicos a seu redor e Melo ao seu lado. Sorriu fraco. Queria ver outro rosto ali no lugar de sua melhor amiga, mas não iria reclamar. Era como deveria ser, ela havia entendido a mensagem. 

- Você pode ao menos tirar alguma foto? - Perguntou para Melo devagar. - Queria guardar o momento. 

Melo acenou afirmativamente e deixou um beijo casto na testa de Eda, que mudou sua atenção para as instruções que recebia no momento. Sabia que a amiga pedia o registro com segundas intenções e não iria jamais negar ajudá-la e nem iria nunca impedir que ela tivesse esperanças de que tudo pudesse mudar de novo. 

Ela tinha tentado hoje mais cedo e parecia ter feito as pazes com a ideia de que sua realidade não incluiria Serkan. Por agora. Sabia que quando as coisas voltassem a ficar mais difíceis ela iria querer recorrer a ele de novo. E de novo. E de novo. Como havia feito já inúmeras vezes. Até que um dia ela tivesse alguma resposta, Melo ao menos esperava. 

- Ele vai ver, Dada. Faça o seu melhor porque um dia Serkan também vai segurar sua mão enquanto assiste a filha de vocês vir ao mundo. - Ela sussurrou no ouvido de Eda e viu uma lágrima solitária escorrer do rosto da futura mamãe. - Vamos lá, estamos juntas agora. 

E Eda foi. 

E tão mágico quanto era ter sua bebê dentro de si era tê-la em seus braços. Seu rostinho delicado, seus lábios comprimidos em uma expressão de choro e seus olhos amendoados. Seu cheiro de cereja. Ela era uma misturinha perfeita entre ela e Serkan e Eda conseguia ver claramente os traços dele em sua filha. 

Beijou com cuidado a cabeça da criança e sentiu seu peito explodir em felicidade. Olhou devagar para Melo e chamou-a para perto. 

- Mostre bem ela, Melo. Ela vai mudar rápido, mas quero deixar todos os detalhes registrados. - Sentiu seu dedo ser agarrado pela mão pequena da menininha em seu colo e sorriu mais ainda. - Oi meu amor, é a mamãe que está aqui. Bem vinda ao meu mundo. 

Melo filmava tudo com a maior calma possível e com a certeza de que, naquele momento, a amiga estava em paz. 

Mas ela não sabia que a apenas alguns milhares de quilômetros dali Serkan havia despertado num ímpeto quando escutou, ao longe, um choro de bebê. Ainda estava sentado na cama atordoado quando viu uma ligação perdida de um número privado em seu celular. Devia ter confundido o som com o choro. Era isso. 

Mas, por alguma razão, seu peito doía absurdamente e sua cabeça não deixava de atrelar a dor ao som que tinha escutado. Iria procurar um médico na manhã seguinte. Só podia estar doente de novo, era a única explicação. 

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⏰ Última atualização: Jul 20, 2021 ⏰

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