Prólogo

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           Estava deitada em minha cama olhando para o teto rosa bebê, entediada ao som da incrível bateria do Foo Fighters. Completamente ciente que logo ouviria os passos pesados de Jude Heartfilia em direção ao seu quarto para vir reclamar do volume alto, não que eu me importasse.
            Já fazia um tempo que não me sentia tão apática. Um tempo que a solidão havia se instalado em minha mente e ali permanecera. O simples ato de levantar da cama de manhã e apenas viver os dias era uma luta. Não. Não havia dinheiro que comprasse motivação.
            Sinto minha consciência gradativamente rendendo-se ao sono. E então os passos. Abro um dos olhos e vejo Jude entrando sem bater, a expressão tristonha indicando-me que havia algo errado. Abro totalmente os olhos e me sento na cama, inclinando-me para desligar o som.
            - Pensei que fosse educado bater antes de entrar. – digo com um meio sorriso, numa tentativa falha de aliviar a ruga entre as sobrancelhas de meu pai.
            Jude se senta ao meu lado e sorri, um sorriso que não chegava aos olhos.
            - Deve ter bons ouvidos para ser capaz de ouvir meu toque na porta com a música naquele volume, Lucy. – retrucou ele, e sorri em resposta. Jude Heartfilia tinha razão. Quase sempre.
            - Algum problema? – pergunto, genuinamente curiosa para saber o motivo daquela expressão do grande Rei da Metalurgia.
            Jude não responde a princípio, apenas coloca minhas mãos entre as suas de forma delicada, fazendo círculos com os polegares carinhosamente. Franzo as sobrancelhas com aquele inesperado contato.
            - Lucy, acredite ou não, eu realmente não gostaria de precisar vir aqui e... dizer o que devo dizer. Mas infelizmente é necessário. – começa ele, encarando nossas mãos unidas, minhas mãos pequenas demais dentro das dele; o tom de voz indicando-me que era realmente difícil para ele estar ali.
            - E qual o motivo dessa cena toda? – questiono-o, franzindo ainda mais as sobrancelhas.
            Veja bem, Jude nunca fora o tipo de homem que faria contato verbal além do absoluto necessário. Ele acreditava que tempo era dinheiro, logo era insensato gastar tempo com floreios. Se for olhar a quantidade de zeros em sua conta bancaria, eu não duvido que seja mesmo verdade.
            - Preciso que vá para Magnólia passar um tempo com seu tio, Julian. – diz ele por fim, como se estivesse anunciando minha pena de morte.
            Fico alguns segundos olhando para ele, sem esboçar nenhuma reação. Não é como se não amasse meu tio, ele era a parte divertida da família, e justamente por isso que meu pai jamais aprovara qualquer ação que Julian tivesse tomado em toda a sua vida.
            E é por isso que algo muito muito ruim deve ter acontecido para Jude considerar me enviar para Julian como a solução mais sensata.
          - Por quê? – pergunto, sentindo os pensamentos pularem dentro de minha cabeça desenfreadamente, como bolinhas de ping pong.
            Não seria um sacrifício. Já fazia um tempo que me sentia solitária. Jude não era exatamente um pai presente, já que passava a maior parte do tempo dedicando-se a multiplicar sua fortuna. Meus amigos também não eram nada memoráveis, a maioria apenas surgiu em minha vida usando-me como ponte para chegar ao meu pai. Os meus preciosos únicos amigos gêmeos haviam se mudado à tempos, não deixando sequer uma carta de despedida ou informando para onde iriam.
            - As coisas estão...difíceis. – responde Jude, arrancando-me de meus devaneios. – A Associação de Metalúrgicos está cheia de problemas internos. Quer dizer, problemas que sempre existiram, mas agora tudo veio á tona.
            Abaixo a cabeça e também encaro nossas mãos unidas, repentinamente meus pensamentos descontrolados congelaram-se. Jude Heartfilia estava preocupado?
            - E oque eu tenho a ver com isso? – olho no fundo de seus olhos, olhos que costumavam despir até a última camada de minha alma e expor todas as minhas imperfeições.
            E desta vez, aqueles inescrutáveis olhos me mostravam um aspecto bastante derrotado.
            - Preciso de você. – diz ele, parecendo constrangido.
            Ah, é claro.
            Como pude pensar que logo Jude Heartfilia teria empatia o suficiente para se preocupar com meu bem-estar. Naturalmente que me via como uma ferramenta, um investimento que precisava extrair retorno.
            - Inesperado. – digo de forma irônica, e tive a satisfação de ver sua expressão se contorcer como se houvesse levado um chute no meio das pernas. – Do que precisa, afinal?
            - Preciso que faça amizade com alguém que mora em Magnólia. Preciso que consiga se aproximar o máximo possível da família dele. E preciso que os convença a se associarem conosco. – responde ele rápido demais, as palavras atropelando-se.
            Pondero um pouco sobre isso. Meu pai podia ser realmente um pai bastante frio e ausente, mas se havia algo que eu ainda respeitava no homem que me criou foi sua genialidade para os negócios. Jude jamais apostava se não tivesse certeza de que fosse vencer.
            Bom, pelo menos posso me consolar com o fato de que ele estava apostando todas as suas cartas em mim.
            - Diga-me quem são e estará feito. – falo por fim, perfeitamente confiante de que obteria sucesso custe o que custar.
            Ele me lança um sorriso caloroso que me pega de surpresa, sequer sabia que era capaz de esboçar aquele tipo de expressão.
            Pelo menos não após a morte de minha mãe.
            - Perfeito! Quando chegar em Magnólia vou te mandar uma ficha de tudo o que consegui descobrir sobre eles. – diz ele, eufórico.
            Assinto, deixando meus últimos resquícios de narcisismo regozijarem-se por Jude Heartfilia depender de mim para algo em sua vida.
            - Quando partirei? – pergunto, e recebo um olhar sem graça.
            - Amanhã de manhã...? – ele parecia tão desesperado que sua resposta saiu em tom de pergunta.
            Suspirei profundamente.
            Jude era de fato um homem de negócios. Em sua realidade, as coisas precisavam ser resolvidas de imediato para não ficarem mais complexas depois, ele abominava o efeito bola de neve.
            E eu não tirava sua razão, afinal.
            - Muito bem. – falo, sentindo o cansaço do dia nos músculos dos ombros rígidos.
            - Virgo já empacotou todo seu closet. – diz ele, satisfeito com sua eficiência.
            - Já? E o que faria se eu tivesse me negado a fazer o que quer? – pergunto curiosamente, os olhos faiscando.
            Jude dá de ombros.
            - Você não nega um desafio. Você é minha filha. – diz ele de forma simplista, e sinto um leve orgulho daquilo.
            Assinto em compreensão e ele se levanto, despedindo-se com um aceno e fechando a porta atrás de si, deixando-me com meu cansaço.

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